Nos últimos anos, avaliamos que o tema “ruptura” tem sido bem explorado por eventos e mídia especializada em autosserviço de diferentes canais e categorias (lojas de conveniência, canal farma, lojas de vizinhança, etc.), principalmente aonde o espaço de estoque de produtos é muito restrito. É necessário gestão cirúrgica e revisão de processos, além de sistema acompanhamento de vendas (giro de estoques) e reposição inteligente de distribuidores, fabricantes e/ou centros de distribuição para esses formatos de loja, com frequência maior de entregas, considerando que o estoque de cobertura/segurança dura pouco (dias de vendas) para diversas categorias de produtos.
De qualquer forma, a ruptura também está bem presente em atacados de autosserviços, aonde o espaço para armazenagem de produtos não é problema recorrente, além disso o número de itens comercializados pelas lojas desse canal não ultrapassa 10.000 itens.
Vivenciamos também nos últimos anos, grandes indústrias investindo em VMI (Estoque gerenciado pelo Fornecedor), Sistemas de Auditoria de Estoques Virtuais e Visibilidade de Produtos em Gondola (OSA), entre outras soluções para atender grandes redes nacionais na busca pela redução de rupturas em gondolas (reposição mais inteligente), em estoques de lojas (distribuição mais integrada), etc. Mas ainda não estamos vivenciando a mudança de cultura do varejista para tratamento mais técnico e apurado da ruptura, seja em redes regionais de supermercados, como em atacados de autosserviço, médios e pequenos supermercadistas.
A mudança de cultura para gestão mais eficiente de estoques não passa somente pela implantação de sistemas de gestão como o VMI e OSA, passa pela compra de uma nova gestão da diretoria que as perdas geradas por rupturas são milionárias e a inteligência comercial são essenciais para o sucesso do processo. As rupturas geradas por ofertas (encartes) já é um grande exemplo para ser discutido: pessoalmente, não temos uma experiência positiva de avaliação de disponibilidade de produtos ofertados em tabloides de qualquer rede supermercadista, sempre constatamos de 10 a 15% de falta de produtos em gondolas.
REVISÃO DE PROCESSOS E NOVO MODELO DE GESTÃO
A revisão de processos não se limita a identificar divergências do estoque físico com aquele que consta no sistema do supermercado. A revisão de processos envolve atividades de previsão de vendas, logística de abastecimento, gestão de estoques, sistema de sincronização de dados, análise de sortimento, etc.
É muito importante que se estabeleça uma revisão completa de processos internos e de toda a cadeia de suprimentos, principalmente, naquelas categorias de maior giro e margem liquida média que garantam a relação 70/30 do faturamento mensal de qualquer rede. Não adianta grandes companhias apresentarem grandes cases de sucesso com redução pontuais de rupturas em projetos de VMI ou OSA, se o essencial na relação com o varejista não é gerenciado. A indústria ainda não requalifica o varejo para estabelecimento de colaboração logística cujos benefícios são recíprocos.
Vamos aos dois casos clássicos:
SISTEMA DE GESTÃO: é muito importante que o sistema integrado sincronize dados de todos os setores do supermercado: frente de loja, estoque das filiais e dos centros de distribuições, compras, recebimento, etc., porém o processo não se resume na integração das áreas.
ATRASOS DE ENTREGA: Em São Paulo, ainda verificamos que 20% das entregas de produtos não perecíveis são realizadas com atraso, gerando 60% de insatisfação dos supermercadistas, considerando que a média de atrasos pode alcançar 2 a 3 dias, dependendo da semana do pedido (início ou final do mês). Qual é o supermercadista que controla o ciclo de compras e KPIs de entrega de produtos com eficiência, incluindo esse indicador como medida de avaliação dos fornecedores? Esses indicadores não podem somente ser controlados em produtos ofertados em tabloides. Ao definir o volume de compras, a equipe comercial deixa de considerar estoque de cobertura para categorias em que há maior demora na entrega dos fornecedores
REPOSIÇÃO DEFICIENTE: Em diversas lojas de grandes e médias redes, ainda vemos uma reposição muito ineficiente, gerado por falta de produtos em estoque (atraso gerado pelo CD) ou acúmulo de sortimento para reposição gerando lista de prioridades de ação dos repositores. Ainda vivenciamos o posicionamento de empresas fabricantes de bens de consumo que encaram a ruptura no PDV como um problema exclusivo do varejo: é outra miopia da indústria. Equipes de promotores e repositores bem treinadas podem monitorar giro de estoques e presença de produtos em gondolas com taxa aceitáveis de 2 a 3% de rupturas em diversas categorias.
PROJEÇÃO SIMPLES DE PERDAS
Ainda vivenciamos grandes companhias com ruptura média de 13% e estoque virtual de 6%, não conseguindo dimensionar quais são suas perdas de faturamento e baixo giro de estoques de seus clientes em virtude da má gestão das lojas ou dos CDs. É importante destacar que somente possuir ferramenta para medir o nível da disponibilidade do produto em gôndola e/ou visibilidade do canal direto através do VMI não é sinônimo de excelência em gestão de estoques para redução constante de rupturas. Uma série de ações são necessárias para reduzir as perdas, aumentar a positivação e o sell out, considerando que é fundamental tomar decisões rápidas e precisas com informações confiáveis e atualizadas.
Se considerarmos uma companhia com mix hipotético de 50 SKUs, margem média líquida de R$3,00 por produto, 20% desses produtos estão em constante ruptura, com duração média de 4 dias mensais e histórico de venda (média diária) de 50 itens por loja/dia, vamos gerar uma perda relevante de R$ 600 mil mensais, se estabelecermos carteira de 100 lojas de um território de vendas.
Vale ressaltar que este nível médio de 13% de ruptura não tem a mesma criticidade para todas as categorias de produtos. Em algumas, 10% de ruptura pode ser considerado um valor baixo, enquanto que em outras pode ser considerado um valor elevado. Esta diferença se deve, principalmente, a fatores como a previsibilidade de vendas e a dificuldade de movimentação dos produtos.
O debate deste tema requer aprofundamento das causas da geração de rupturas por seção e categorias de produtos para avaliar os maiores gargalos de perdas da operação. A árvore de diagnóstico necessita ser pontual para identificar e avaliar quais são os processos que não são gerenciados, que estão “jogando o resultado para baixo. ”
É necessário enfatizar que a ruptura é um custo invisível e perda constante para muitos varejistas, pois não há percepção objetiva de perda de receita já que não se aplicam métodos de medição e avaliação da gestão em toda cadeia de suprimentos e da operação das lojas. Ainda é muito comum operadores de caixa perguntar no momento de fechamento se foram encontrados todos os produtos que estavam na sua lista de compras. Qual é o objetivo desse questionamento? Avaliar o grau de insatisfação e irritação do shopper e tomar ações reativas de abastecimento ou reposição? Esses questionamentos só expõem ainda mais as fragilidades da má gestão da loja para o cliente, considerando que a experiência de compra já foi consumada.
PROGRAMA RUPTURA ZERO
Vamos abordar outros temas importantes relacionados à ruptura em futuras publicações aqui no LINKEDIN. Para rodar um PDCA sobre todos os processos de forma integrada em todas as áreas, elaboramos um programa de auditoria de processos, capítulo integrante do PEXSUPER, que mede a sinergia entre as áreas e a qualidade da gestão de estoques, gestão comercial, previsão de vendas, logística de abastecimento, gerenciamento por categoria, operação de loja e do CD, sistemas de gestão, entre outros, que por diversas deficiências geradas pela operação, formam a árvore das principais causas de ruptura.
Outro grande problema identificado em diversas redes supermercadistas é a falta de comunicação e integração entre as áreas, considerando a interdependência e o impacto negativo da má gestão de uma das áreas com apresentação de indicadores negativos, gerando “efeito cascata e silencioso”. O Programa Ruptura Zero tem a missão de ampliar a visão dos gestores sobre a importância da integração das áreas para reduzir a geração das rupturas e suas respectivas perdas de receita e insatisfação do shopper.
O Programa Ruptura Zero tem o objetivo de avaliar a operação a partir da aplicação de 160 KPIs qualitativos e 70 KPIs quantitativos, além de estabelecer procedimentos em todas as áreas relacionadas para contribuir com as equipes a identificar as causas, avaliar e priorizar as ações necessárias para reduzir a incidência, frequência, recência e valor de rupturas.
O Programa Ruptura Zero rodará um PDCA com identificação de oportunidades de melhoria, definição das prioridades de ação, elaboração dos planos de ação, definição de metas, responsáveis e indicadores, de forma integrada, para combater, de forma continuada, as rupturas de categorias de produtos que contribuem com a perda de faturamento da indústria e varejo no PDV.
Vamos mergulhar definitivamente num assunto muito crítico para sustentabilidade do negócio, considerando o aumento da complexidade de gestão do mercado: a) proliferação de SKU; b) proliferação de promoções; c) nível de sortimento da loja; d) nível de planograma das categorias; e) baixa utilização do VMI por parte da indústria; f) baixo nível colaborativo entre indústria e varejo (foco intensivo em sell-in); g) ausência de sistema de gestão para mapeamento e prevenção das rupturas; h) ausência de sincronização entre giro de vendas (loja) e abastecimento (indústria); i) maior acuracidade da previsão de vendas em promoções de categorias de alto giro.
O caminho é longo, o tema é velho e as soluções ainda não chegaram na ponta de gôndola.
Fonte: LinkedIn