Lutando para reverter cinco anos consecutivos de queda nas vendas, a Hering está injetando sangue novo — e uma perspectiva idem — em seu conselho. A companhia acaba de eleger Claudia Sciama, uma executiva veterana do Google no Brasil, e, em março, já havia escolhido Andréa Mota, a ex-diretora executiva do Boticário que já teve uma passagem anterior pelo board da Hering em 2015/2016.
Claudia tem 11 anos de Google, onde ocupa o cargo de diretora de negócios para o varejo, o que lhe dá interface com todos os grandes varejistas e comércio eletrônico no Brasil. É mãe de quatro filhos.
Andrea, descrita num perfil como ‘uma baiana falante de sorriso largo’, foi instrumental para levar o Boticário à liderança do mercado brasileiro de perfumaria. O sucesso cobrou um preço alto: sofreu um ‘burnout’ em 2014 e deixou a empresa no início do ano seguinte. Andrea tem dois filhos.
Os dois nomes conferem ao conselho da Hering um perfil menos financeiro e mais especializado em varejo e digital, num momento em que a Hering precisa dar mais assertividade às coleções para atrair o consumidor de volta às lojas, e instalam duas mulheres no board de uma empresa que depende predominantemente do público feminino.
As novas conselheiras substituem Marcelo Medeiros, da Cambuhy, e Marcos Pinto, da Gávea Investimentos, que estão de saída depois que as duas gestoras se desfizeram de suas posições na companhia.
Elas vão se juntar a Ivo Hering e Fabio Hering, membros da família fundadora; Patrick Morin, ex-CEO do Chase no Brasil; Fabio Barbosa, ex-presidente do Santander Brasil e da Febraban; e Márcio Guedes, o veterano banqueiro hoje sócio da Pangea Associados, uma consultoria financeira.
Uma das varejistas mais castigadas na Bolsa nos últimos anos, a Hering ganhou um raro respiro no pregão de ontem com o anúncio de que a Dynamo atingiu 5,76% do capital da companhia, que tem cerca de 85% das ações na mão do mercado. Os papéis subiram 12,7% para R$ 18,55; hoje, em meio à correção geral, devolvem parte dos ganhos, com queda de 5% por volta de meio-dia.
Segundo brokers, a Atmos Capital, outra gestora carioca que já atingira 5% do capital da Hering em novembro, vem aumentando sua participação e já estaria próxima de 10% da empresa. Este ‘stake’ faria da Atmos a maior acionista depois da família Hering, que tem 14,7% da companhia.
A Dynamo já adiantou em comunicado que ‘avalia a oportunidade e a conveniência de adquirir participação adicional’. A dupla do Leblon vem ocupar a lacuna deixada por Cambuhy e Gávea, que juntas chegaram a ter mais de 20% da companhia, mas venderam suas posições ao longo do ano passado depois de uma alta no papel.
Em meados do ano passado, a Hering já tentou oxigenar a gestão mudando postos-chave na direção executiva. Trouxe Rafael Bossolani, com passagens por Walmart e Natura, para a diretoria financeira no lugar de Frederico Oldani, que tinha oito anos e meio de companhia.
Além disso, reestruturou a área comercial. O diretor Ronaldo Loos passou a ser responsável apenas pelo canal multimarcas e o mercado internacional e, para cuidar das franquias, lojas próprias e ecommerce, a companhia contratou Felipe Pivatelli, que fez carreira da C&A e na Malwee.
Com as vendas orgânicas em queda desde 2012, a Hering vem lutando para recuperar seu apelo num período em que a concorrência em produtos básicos (seu ponto forte) ficou mais acirrada e os consumidores querem roupas mais de acordo com as tendências de moda (seu ponto fraco).
Apesar de ter sofrido com a queda nas vendas, a Hering gera bastante caixa por conta de seu modelo ‘asset light’, baseado em franquias. “A margem está muito abaixo do que já esteve historicamente”, diz um gestor comprado no papel. “O desafio é trazer o cliente de volta, o que faria essa margem crescer rápido”.
No primeiro trimestre, as vendas no conceito mesmas lojas — as unidades abertas há pelo menos 12 meses — tiveram um leve aumento de 1,6% em relação ao mesmo período de 2017, mas a margem bruta sofreu com reajustes abaixo da inflação e a atividade promocional.
A coleção foi mais assertiva, o que se traduziu em um aumento de no número de itens por compra na rede da Hering Store. Mas o tráfego nas lojas não reagiu, mostrando que a empresa precisa investir mais (ou melhor) em marketing. O ecommerce também não engrenou — apesar de crescer ano a ano, ainda representa menos de 5% das vendas.
A companhia vem sinalizando ao mercado que o segundo trimestre foi mais difícil que o primeiro, por conta da temperatura. “Abril foi um mês especialmente complicado, e o Dia das Mães não foi muito bom”, diz uma fonte próxima à companhia.