Pedidos de ofertas de ações revelam aos gestores e analistas negócios fortes, parte deles lucrativos, em setores como alimentos e farmácia
Em 1986, o ex-garimpeiro Ilson Mateus Rodrigues fundou em Balsas (MA), a 800 quilômetros de São Luís, uma mercearia, e a abastecia com produtos comprados a 400 quilômetros dali, com a ajuda de um caminhão velho. Meses depois, a mercearia virou supermercado, com aberturas de outras lojas no interior – um negócio que hoje forma o Grupo Mateus, a maior varejista de supermercados com capital 100% nacional, com 137 lojas e R$ 8 bilhões em receita líquida, obtida no Maranhão, Pará e Piauí.
Na cidade de Maringá (PR), duas famílias de vendedores, Nogarolli (do empresário Jefferson Nogarolli), e os Cardoso, montavam seus primeiros supermercados nos anos 80 como rivais, e décadas depois, em 2010, se uniram para criar a CSD, grupo com 56 lojas, R$ 2,5 bilhões em vendas e foco no Sul.
Os pedidos de ofertas de ações no varejo revelaram aos gestores e analistas perfis de negócios regionais fortes, parte deles lucrativos, em setores como alimentos e farmácia. Alguns se formaram em locais de menor concorrência, de olho na demanda das classes de menor renda, “vitaminada” agora com os R$ 51,5 bilhões mensais pagos pelo auxílio emergencial. “Há rincões pelo país que muitas empresas do eixo Rio-São Paulo não chegaram, e eles atuam praticamente sozinhos, em regiões que se urbanizaram rapidamente na última década e meia, e com sistemas de logística impressionantes”, diz Manoel Antônio de Araújo, da consultoria Martinez de Araújo.
Analistas e consultores já previam algumas dessas operações, como a Le Biscuit, com 141 lojas, sendo quase 70% no Nordeste, e a Quero-Quero, com boa parte dos pontos no Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Mas a maioria não estava tão clara, entre elas a CSD, Mateus e as redes de farmácias Nissei e a D1000. Alberto Serrentino, da Varese Retail, lembra que há negócios bem estruturados, mas outros nem tanto. “Já vemos algumas reduções de preços, em parte pela euforia, o que leva a ajustes”, disse ele.
Prospectos mostram que há operações bem estruturadas mas há outras com perdas e em fase de construção do braço digital. No caso do Grupo Mateus, o lucro quase dobrou desde 2017, a dívida líquida só cai e a produtividade por metro quadrado supera os líderes GPA e Carrefour, calculou o Valor. Na Quero-Quero, com vendas e lucratividade em alta em 2019 e 2020, as ações vêm subindo após a oferta (alta de 14,7% desde agosto). Na D1000, varejista dona de cadeias como Rosário e Tamoio, – com vendas ano a ano crescendo pouco e prejuízo em 2019 e no segundo trimestre – a ação cai 30% desde início da negociação na B3, no mês passado.
No digital, entre negócios puramente on-line, a empresa de “cashback” Méliuz e a operação de “marketplace” (shopping virtual) Enjoei tiveram seus pedidos de oferta protocolados nos últimos dias, com publicação de números que mostram alto volume de transações com a pandemia. Mas ainda buscam resultados mais consistentes, algo comum em negócios com esse perfil.
Fonte: Valor Econômico