Companhia está entrando em seis novos Estados, apesar do cenário difícil para o consumo
Por Adriana Mattos
Quando o empresário Ilson Mateus Rodrigues inaugurar hoje, logo no início da manhã, as primeiras unidades do Grupo Mateus na Bahia e Pernambuco, em Juazeiro e Petrolina, respectivamente, marcará a entrada da empresa em seis novos Estados neste ano. No total, estão previstas de 45 a 50 aberturas em todo o país em 2022, e a maior parte dessas unidades serão abertas nas seis regiões – Bahia, Pernambuco, Sergipe, Alagoas, Paraíba e Rio Grande do Norte. O fundador da rede nunca inaugurou tantas lojas, e em áreas não exploradas, em um só ano.
O movimento, planejado há meses, acontece quando a crise no consumo avança sobre o atacarejo – principal negócio da empresa, com quase 50% das vendas – e depois de já ter feito algum estrago no varejo alimentar. Em entrevista ao Valor ontem, da loja de atacarejo Mix Mateus, em Juazeiro, que pela manhã passava pelos últimos ajustes pré-abertura, Ilson disse que ainda há uma pressão inflacionária no setor, e em algumas lojas existe perda no valor do tíquete da compra do cliente.
Mas ele entende que a companhia precisa continuar ocupando espaços e a forma de fazer isso – num ambiente de receita mais pressionada e aumento de despesas pela rápida expansão – é buscar ações internas de revisão de gastos e de incentivo à venda. Ainda diz que vem distribuindo mais lojas pela sua rota de abastecimento, para diluir mais custos logísticos. E tem encurtado o intervalo entre abertura de unidades de atacado de distribuição (que atende empresas) e de atacarejo.
Isso ajuda a gerar maiores ganhos de escala, e a diluir custos, de maneira a tentar melhorar a rentabilidade da operação. Na prática, esse é um dos nós do setor hoje: manter expansão e administrar esse efeito em caixa e nas margens. Apesar de esses investimentos aumentarem a saída de recursos em espaços de tempo mais curtos, a bilionária oferta de ações da rede em 2020 (a segunda maior do ano), com R$ 3 bilhões indo para o caixa, abre espaço para essa aceleração, dizem analistas ouvidos. A empresa tinha saldo de caixa de R$ 960 milhões em setembro.
“Estamos tentando ocupar o máximo de espaço que pudermos. A maior parte dos investimentos em 2022 vai para as áreas onde ainda o grupo não atua. Mas estamos mais atentos a esse equilíbrio entre aberturas, despesas e rentabilidade”, disse ele. “É o que a gente fez nos últimos seis, sete anos e quer continuar fazendo, não é diferente. Mas estamos fazendo esse equilíbrio com muita mais atenção”.
Pelos balanços trimestrais de 2021, as margens da empresa perderam força sobre o ano anterior e o ritmo de crescimento da receita líquida, em quase 40% no começo do ano, caiu para 26% no terceiro trimestre. Entrada em novos mercados naturalmente reduzem margens. E o fluxo de caixa da empresa vem vindo negativo desde o início de 2021, pelos investimentos. Sobre a receita, há uma desaceleração generalizada no setor, mas o Mateus ainda cresce acima de seus rivais diretos em venda total. O Valor apurou que Assaí e Atacadão tiveram queda na taxa de crescimento de vendas “mesmas lojas” (com mais de um ano) em janeiro.
Como forma de tornar a distribuição mais eficiente, o crescimento orgânico vai sendo atrelado à rota logística
Ilson diz que a velocidade de expansão da receita deve subir, sem citar prazos. “Vamos retomar crescimento mais rápido com as novas lojas, e o amadurecimento daquelas que já fomos abrindo [também tem efeito]. Estamos com bastante lojas mais maduras e estamos trabalhando com uma estimativa de geração de caixa”, afirma. Em 2019 foram abertas 24; em 2020, 39; e em 2021, 42 pontos. A projeção de 45 a 50 unidades abertas deve se estender nos próximos anos.
O grupo soma 212 unidades no Maranhão, Pará, Piauí e Ceará. Ainda não há prazo para entrada no Centro-Oeste, Sul e Sudeste. A marca Mateus possui as bandeiras Mix Atacarejo, Supermercado Mateus, Hiper Mateus, Eletro Mateus e Camiño, além do on-line.
Sobre ajustes internos, Ilson diz que há uma estrutura já montada para suportar novas regionais de expansão, como a do Nordeste, o que ajuda na diluição de custos. “Tiramos pessoal da operação, que era da sede, e transferimos pra regional [no Nordeste]. Nós temos que trabalhar com custo sobre vendas de 10%, 9,5%. As regionais têm que trabalhar em cima disso. E nós vamos ajustar a sede para ela chegar também nisso”.
Sobre ambiente de compra, Ilson diz que há algumas lojas “perdendo um pouquinho do valor do tíquete”, por conta desse efeito de queda no poder de compra da população, além do movimento de troca de marcas mais baratas. Como forma de tornar a distribuição mais eficiente (um ganho que pode ser repassado a preço em mercados mais competitivos) o grupo vai desenhando crescimento orgânico atrelado à rota logística.
“Por exemplo, nós abrimos loja da Camiño Supermercado em Colinas [Maranhão], e la faz parte da consolidação de uma rota, porque nós temos loja em Barra do Corda, Presidente Dutra e agora Colinas. Então numa ‘linha’ de 200 quilômetros, nós temos três lojas já”.
Analistas entendem que a empresa está em fase de investimento, que vai exigir mesmo aumentos de investimentos e despesas. A equipe do BTG Pactual afirma que apesar da perda de ritmo de crescimento, o Mateus ainda é um negócio resiliente e com “expertise” local. Mas eles ressaltam o risco de a rede estar mais exposta às vendas em praças com menor renda.
“Os Estados do Norte e Nordeste costumam ser mais elásticos às variações do PIB e, portanto, uma perspectiva macro mais desafiadora”, diz em relatório Danniela Eiger, analista da XP. Ela ainda afirma que as margens de curto prazo vêm mesmo sendo pressionadas, mas são compensadas por um maior crescimento de vendas. E destaca o avanço nas negociações do benefícios fiscais da empresa (ICMS no Maranhão e no Piauí).
Esses benefícios são concedidos a atacadistas em troca do cumprimento de determinados critérios de investimentos e geração de empregos. Os benefícios foram estendidos até 2032, segundo já publicado em Diário Oficial no fim de 2021, o que reduz essa dúvida sobre o benefício para a rede.
Fonte: Valor Econômico