O Grupo Big (ex-Walmart Brasil), começa a avançar na sua abertura de capital no país vendendo a tese aos investidores de que conseguiu transformar a operação num negócio rentável em dois anos, mas que, para avançar num plano de crescimento, precisa evoluir mais rápido no atacarejo e com o seu modelo digital – algo ainda em fase inicial e mais avançado nos rivais GPA e Carrefour.
É a segunda varejista alimentar a entrar com pedido de IPO, depois do Grupo Mateus. O Assaí, do GPA, deve ser listado em bolsa até o começo de 2021.
Sobre os números, a empresa menciona “sinais de virada” em 2019, fala em “histórico bem-sucedido de reformulação e conversão de lojas”, o que levou a empresa a ser uma geradora de caixa. De janeiro a setembro o grupo apresentou lucro líquido de pouco mais de R$ 3 bilhões, ante um prejuízo de R$ 80 milhões um ano antes. O ganho de 2020 teve impacto direto do reconhecimento de ativo fiscal diferido.
Em vendas líquidas, trata-se de um negócio de R$ 15,7 bilhões e que, até setembro, cresceu cerca de 5%, em termos nominais. Até agosto o setor supermercadista como um todo teve crescimento real de vendas de 3,9%, diz a Abras, associação do setor. Carrefour e GPA (sem incluir Colômbia) cresceram pouco mais de 13% até junho (ainda não publicaram o terceiro trimestre). São 389 lojas no país, pouco menos da metade de GPA.
Em termos de caixa líquido, eram de R$ 537 milhões em setembro (estável sobre um ano atrás) – porém o número desconsidera o impacto do IFRS 16. O Big não tem dívida informada na linha de empréstimos e financiamentos.
Em termos de projetos, chama a atenção o mencionado potencial para abertura de 340 unidades do Sam’s Club e Maxxi Atacado até 2030, sendo 125 do clube de compras e 215 do atacarejo. Ainda há um plano de implementar, em 23 imóveis (dos 184 próprios da rede) operações imobiliárias.
A empresa é dona das marcas Big, Big Bompreço, Super Bompreço, Nacional, Mercadorama, TodoDia, Maxxi Atacado, Sam’s Club, Posto Big e Posto Big Bompreço.
Pelos menos três gestores ouvidos ontem ainda estavam avaliando o material, mas de forma preliminar, dois deles dizem que uma questão central passa a ser abraçar o projeto num momento em que o mercado está em outro patamar de competição “A operação ficou mais sólida após a saída dos americanos, e eles têm uma equipe lá de primeira. Mas estão mais atrasados que os outros no digital e precisam avançar com reforma dos supermercados. A questão é como isso será visto, como oportunidade ou não”.
Outro ponto que chama a atenção são as operações com partes relacionadas.
Como parte do processo de compra da rede, em 2018, o Big tem obrigação de pagar ao Walmart nos EUA o montante de R$ 251 milhões, sujeito a encargos mensais à taxa de 110% do CDI. Em 2019 foi feito um ajuste e o saldo (atualizado) em 30 de setembro de 2020 é de R$ 220 milhões.
A empresa diz que o Walmart decidiu converter em capital o valor principal dessa dívida (R$ 196 milhões). Foi aprovada então, em 14 de outubro, a emissão de bônus de subscrição nesse montante em favor de uma empresa do Walmart. O exercício do bônus está condicionado à publicação do anúncio de início da distribuição das ações até abril de 2021.
Além disso, desde fevereiro de 2019, o Big passou a registrar despesas com royalties pelo uso da marca Sam’s Club e Walmart. Sobre os royalties, há saldo de R$ 28 milhões relativos à marca Sam’s Club, sendo que o cálculo é um percentual das vendas. E outros R$ 10 milhões relacionados com a marca Walmart, que o grupo Big já deixou de usar. Ainda há menção a pagamentos pelo uso de sistemas do Walmart, que estão deixando de ser utilizados desde 2019 (para instalação de um próprio), no montante de R$ 114 milhões.
O plano do Big, após IPO, é acelerar a expansão orgânica, com novas lojas de Sam’s Club e Maxxi Atacado, e reformular a estratégia de supermercados. Após a compra da operação pela Advent em 2018, o novo comando reduziu o número de hipermercados, transformando parte no Maxxi e Sam’s.
Adicionalmente, a empresa está testando quatro lojas de supermercados recentemente reformadas para definir o modelo a ser replicado. Esse projeto está em fase de testes, e em 30 de setembro, havia inaugurado quatro lojas piloto e validado o layout e os resultados das renovações.
No braço on-line, ainda mais crucial na estratégia do setor e dos concorrentes após a pandemia, a ideia é usar as lojas como polos de armazenamento de produtos e de entrega de produtos comprados no on-line, como GPA e Carrefour já trabalham, e implantar o sistema de “clique e retire”.
“Planejamos aumentar esse crescimento com o lançamento de plataforma digital própria, que integrará todas as nossas lojas com cobertura de delivery e de “clique e retire” até meados de 2021”, promete no prospecto.
No mês passado, as vendas do canal digital atingiram R$ 25 milhões, frente a uma receita mensal (média ao mês em 2020, considerando as vendas acumuladas até setembro), de R$ 1,75 bilhão. A empresa diz que esses R$ 25 milhões equivalem “a 2,3% das vendas no mês de setembro de 2020 das lojas onde estão presentes”.
Fonte: Valor Econômico