O mundo de grife pode ser bastante complicado. Primeiro, a designer de bolsas e sapatos conhecida como Kate Spade se chamava, na verdade, Katherine Noel Brosnahan. Mais tarde, Brosnahan lançou sua grife, batizando-a de Kate Spade. Aí, ela vendeu o negócio para a empresa de bens de luxo Liz Claiborne Inc.,que a rebatizou de Kate Spade & Co. (Falecida em 2007, Liz Claiborne também era uma designer de carne e osso).
Então, quando Kate, de 53 anos, decidiu voltar para o abarrotado mundo da moda, uma de suas primeiras ações foi encontrar um novo nome. Agora, ela se chama Katherine Noel Frances Valentine Brosnahan. Nas lojas, ela é Frances Valentine.
“Ninguém sabe quem é Valentine”, diz Andy Spade, marido de Kate e sócio nos negócios, referindo-se à nova marca. “Mas com o tempo, as pessoas saberão.”
Jil Sander, Helmut Lang, Catherine Malandrino e Joseph Abboud existem como pessoas, assim como as marcas Jil Sander, Helmut Lang, Catherine Malandrino e Joseph Abboud. Porém, em todos esses casos, os designers já não são donos das marcas que levam seu nome. É uma confusão que parece ser exclusiva da indústria da moda.
Marcas europeias de luxo como a Dior e a Saint Laurent têm alta rotatividade de diretores de criação. Mas seus criadores, tanto Dior como Saint Laurent, estão mortos. Para um designer vivo, ver seu nome no trabalho de outra pessoa é “um tanto absurdo”, diz Susan Scafidi, fundadora do Instituto de Leis da Moda da Universidade Fordham.
Hoje em dia, designers como Kate basicamente competem com eles próprios. Com o tempo, suas novas marcas podem criar confusão no mercado, quando os consumidores descobrem quem está por trás do quê.
Muitas pessoas já notaram como a linha da Frances Valentine, que chegou às lojas no início do ano, tem a mesma vibração peculiar do trabalho anterior da designer para a marca Kate Spade. Entre as peças estão botas listradas de pele de bezerro, vendidas nos Estados Unidos por US$ 755, e sandálias de US$ 495 com um salto que, segundo Kate, foi inspirado por um domo geodésico popularizado pelo arquiteto Richard Buckminster Fuller.
“Eu nem sabia que a Frances Valentine era a Kate Spade”, diz Sandi Krakowski, redatora publicitária de Kansas City que comprou três pares de botas dessa linha. Foi apenas depois de fazer a compra que ela pesquisou a marca e descobriu a ligação.
Os varejistas não se acanham em ligar os pontos para os clientes. Quando a rede de produtos de luxo Nordstrom Inc. convidou os consumidores para um coquetel de recepção para Kate em sua loja de Boca Raton, na Flórida, os convites a descreviam como a “antiga designer e fundadora da marca Kate Spade”.
Os vendedores da Nordstrom são rápidos em dizer a compradores quem está por trás da coleção. “É uma história engraçada e todo mundo conhece Kate Spade”, diz Anne Egan, uma das gerentes do setor de sapatos de luxo.
Antes mesmo de Kate e seu marido terem encontrado o nome da nova marca, eles visitaram os atuais proprietários de sua antiga marca para informá-los sobres os planos. O diretor-presidente, Craig Leavitt, acolheu bem o novo empreendimento. Sua única preocupação, disse ele mais tarde em uma entrevista ao The Wall Street Journal, era que a nova grife não “confundisse nossos clientes ou infringisse nossas marcas registradas”.
A linha divisória nem sempre é pacífica. Já houve batalhas jurídicas entre designers e seus alteregos corporativos. Quando isso acontece, a tensão frequentemente gira em torno da distinção sutil entre marcas registradas, que identificam a origem de bens ou serviços, e o direito do designer de usar seu próprio nome e imagem como indivíduo.
“Se você escreve um livro, você assina seu trabalho”, diz o designer de roupas masculinas Joseph Abboud. “O consumidor tem o direito de conhecer o criador da obra, seja ela um livro, pintura ou uma peça de vestuário.”
Abboud vendeu sua marca registrada para a JA Apparel em 2000 por US$ 65,5 milhões. Quando criou uma nova linha, a Jaz, ele tentou usar seu nome em peças de marketing e acabou sendo processado pela JA Apparel.
Uma decisão judicial de 2010 permitiu que ele usasse seu nome, mas com uma longa lista de ressalvas. Por exemplo, ele pode apenas usá-lo “no contexto de uma sentença completa ou em uma frase descritiva, e o nome não deve ser maior ou mais importante que as palavras em torno na sentença ou frase”. A decisão judicial também proibiu o uso de “Joseph Abboud” em etiquetas, embalagens e rótulos.
Conhecida por seu estilo ornamentado, Catherine Malandrino deixou a grife que criou em 2013, depois de uma crise com seus sócios que culminou em uma briga judicial contra eles. Ela acabou perdendo a capacidade de usar seu nome como marca.
A CM Brand Holdings LLC, dona da marca registrada de Catherine, afirma em documentos judiciais que ela também controla todos os direitos relacionados à sua “imagem, ser e personalidade”.
“Isso a transformaria em uma escrava”, diz Richard Hott, advogado de Catherine. Bruce Ewing, advogado da CM, diz: “Nosso cliente está empenhado em defender a integridade da marca, que Catherine Malandrino vendeu anos atrás para terceiros”.
Em julho, ela lançou uma coleção de roupas de preços acessíveis para a Home Shopping Network, canal de compras de TV a cabo nos EUA. A HSN inicialmente enviou e-mails para clientes potenciais identificando a marca como French Rendez Vous por Catherine Malandrino. Recentemente, a rede parou de usar o nome da designer em seu marketing. Um porta-voz da HSN não quis comentar.
No caso de Kate, a troca de nomes confunde até sua própria família. Ao passar recentemente com a filha em frente a uma vitrine com produtos da Kate Spade, diz a designer, a menina exclamou: “Mamãe, esta é você!”