A política mais conservadora para composição dos estoques, adotada ao longo da crise pelos varejistas, ampliou o impacto da greve dos caminhoneiros no setor. Com a falta de produtos indo além dos hortifruti, as chances de faltar produtos não perecíveis nas gôndolas será ainda mais rápida nos pequenos mercados e operações de vizinhança.
“Quando há greve de caminhões, o impacto direto no varejo alimentar se dá nos produtos perecíveis, que precisam de reposição diária. O que notamos agora é que começam a faltar também produtos não perecíveis, e isso mostra a fragilidade dos estoques do comércio”, comentou o especialista em logística e ex-diretor de uma das principais redes supermercadistas do País, Carlos Souto.
O problema da falta de produtos fica ainda mais evidente nos pequenos mercados de bairro. O empresário Vladimir Hama, dono de duas unidades do Hama Mais, no Mato Grosso do Sul, precisou racionar a venda de produtos por cliente, principalmente os de necessidade básica, como papel higiênico. “No final da manhã [de ontem] começamos a limitar as vendas. Há um certo desespero do consumidor.”
Questionado sobre o nível dos estoques antes da greve, Hama admite estar abaixo do ideal. “Não havia demanda que justificasse compor um alto estoque”, crava.
O empresário garantiu não ter elevado os preços mediante à demanda maior que a oferta, mas conta que concorrentes fizeram. “Meu estoque de hortifruti acabou muito cedo, mas vi lojas em que foi feito um racionamento na quarta-feira, e na quinta-feira os preços já estavam dobrados”, conta.
“No Rio de Janeiro a batata passou de R$ 1,3 para R$ 5,6 de uma semana para a outra”, corrobora Carlos Souto, ressaltando que há muita má fé. “Há muita fake news nas redes sociais e isso causa pânico no consumidor, e o varejista de má fé aproveita para tirar vantagem”, conta.
Efeito cascataA política de racionamento das vendas também foi adotada por grandes varejistas. O Carrefour, por exemplo, limitou para até cinco unidades por cliente a venda dos produtos. Há registros ainda de outros grandes grupos seguindo o mesmo caminho.
No Rio Grande do Norte, um dos estados mais afetados pela greve, a política de racionamento tem sido generalizada.
De acordo com o presidente do Sindicato do Comércio Varejista de Alimentos no estado, Geraldo Paiva Júnior, o motivo do desabastecimento é que os mercados são supridos por produtos comprados em outros estados.
“Os supermercados de outros estados costumam comprar da Central de Abastecimento local, que também já apresenta problemas. Acredito que, a partir dessa sexta-feira, comece a faltar em mais supermercados. O nosso estoque de cereais e mercearia pode ter baixas significativas a partir da segunda-feira que vem, caso a situação não mude”, alertou.
Segundo a Associação Brasileira de Supermercados (Abras) os estados do Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Pará, Paraíba, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Ceará, Espírito Santo, Pernambuco, Tocantins, Santa Catarina, Paraná e São Paulo já registram casos de faltas de produtos perecíveis.
As empresas associadas à Associação Brasileira das Indústrias da Alimentação (Abia) apontam que são mais de 325 caminhões com alimentos perecíveis parados em estradas de Minas Gerais, Goiás, Distrito Federal, Tocantins, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro.
No Sul do País, o vice presidente da Associação Catarinense de Supermercados (Acats), Nazareno Dorneles Alves, também relata problemas. “Além de não conseguir abastecer os centros de distribuição, os mercados não conseguem transportar os produtos do depósito para unidades.”
Ontem (24), a FecomercioSP estimou que a greve pode acarretar perdas na ordem de R$ 570 milhões por dia só na cidade de São Paulo. No cenário estadual, o prejuízo pode diário pode atingir R$ 1,8 bilhão e no nacional, R$ 5,4 bilhões. A entidade ressalta que, prorrogada a paralisação, mais setores serão prejudicados.
Fonte: DCI