A multidão que tomou conta da primeira loja da varejista americana Costco na China, na semana passada, forçando o fechamento da unidade em seu dia de estreia, é um contraste com a fuga de redes estrangeiras de supermercados do país.
Em junho, o grupo francês Carrefour acertou a venda de uma participação majoritária em suas lojas na China para a companhia local Suning por US$ 700 milhões, seguindo os passos da Tesco, do Reino Unido, e do Dia, da Espanha. O grupo atacadista alemão Metro também está vendendo suas operações na China.
Uma das últimas redes de supermercados de controle totalmente estrangeiro na China é a americana Walmart, que depois de mais de duas décadas possui mais de 430 lojas no país, mas detém uma fatia de apenas 1,7% no mercado chinês de supermercados, que movimenta US$ 692 bilhões por ano, segundo dados da Euromonitor.
Muitos problemas vêm frustrando os operadores estrangeiros na China e eles vão da dificuldade de localização e adaptação ao comércio eletrônico, aos elevados custos com aluguel e disputas com parceiros locais. Mas um ponto fraco em comum tem sido a falta de produtos exclusivos. Agora, Walmart, Costco e a Aldi. da Alemanha – que abriu suas primeiras lojas chinesas em junho -, pretendem mudar isso, concentrando-se nos produtos de marca própria, sempre importados de seus mercados domésticos, e firmando parcerias com empresas de tecnologia na área de comércio eletrônico.
Para o Walmart, o crescimento tem sido difícil, com aumento de apenas 0,3% no ano passado em relação a 2017, para 81 bilhões de yuans (US$ 11,3 bilhões), segundo a Fung Business Intelligence. Mas o grupo americano continua comprometido com o mercado: abriu 33 unidades na China neste ano e em julho prometeu investir US$ 1,2 bilhão na próxima década em melhorias nas lojas, logística e novas aberturas.”Cada companhia tem motivos diferentes para sair e continuamos vendo outros grupos varejistas estrangeiros chegando”, disse Daniel Shih, diretor de assuntos corporativos do Walmart na China.
Os hábitos de consumo no país diferem dos verificados nos Estados Unidos e Europa, o que significa que os supermercados precisam se adaptar. Os consumidores chineses têm uma probabilidade maior de se dirigirem às lojas para comprar alimentos frescos várias vezes por semana, em vez de realizar uma única compra semanal.
As redes de supermercados locais especializadas em alimentos frescos vêm ganhando participação de mercado, mais notadamente as administradas pela Yonghui Superstores, um grupo chinês cujas receitas cresceram de 30 bilhões de yuans para 70 bilhões de yuans nos cinco anos até 2018.
Os supermercados estrangeiros vêm formando estoques dos produtos locais preferidos, de durião (uma fruta) a pescoço de pato, mas às vezes têm dificuldades para igualar a atmosfera animada dos concorrentes chineses, que oferecem vegetais avulsos e peixes vivos em tanques. “Os varejistas estrangeiros fizeram as coisas um pouco higiênicas e clínicas demais. Isso foi uma má articulação”, diz Jack Chuang da consultoria OC&C.
A Tesco incitou controvérsia no Reino Unido ao vender tartarugas vivas, mas nos bastidores a rede vinha lutando para se adaptar às práticas locais. As administrações britânica e chinesa frequentemente entravam em choque por questões pequenas, como promoções em lojas e mostruários, segundo afirma um ex-executivo da companhia. “Houve um problema de governança na Tesco. E no geral, os britânicos não confiavam nos chineses”, acrescenta. A Tesco vendeu 80% de seus negócios chineses para a varejista estatal China Resources em 2013.
O Carrefour abriu dezenas de pequenas lojas. Mas como não conseguiu comprar terrenos para muitos de seus pontos de venda, ficou sujeito aos alugueis cada vez mais altos da última década, segundo afirmam fontes a par do assunto. A Metro é lucrativa no mercado chinês, mas está vendendo suas operações no país em razão de problemas financeiros na Alemanha, segundo fontes a par da situação da companhia.
Os varejistas estrangeiros de roupas, da Uniqlo à Nike, ganharam uma maior participação de mercado que os concorrentes chineses por causa de suas marcas exclusivas. Mas os supermercados estrangeiros com frequência vendem as mesmas marcas de massas e molhos que seus rivais locais. Novos participantes do mercado estão tentando mudar isso. Nas lojas da Aldi em Xangai, os itens mais populares incluem vinho e cerveja importados da Europa, ambos de marca própria. Os produtos do rótulo Kirkland, da Costco, foram disputados pelos compradores chineses na inauguração da loja, na semana passada.
O Walmart está adotando uma estratégia parecida em suas unidades Sam’s Club, que agora são o foco de sua expansão na China – o plano é ter 40 lojas em operação até o ano que vem, antes as 26 atuais. “O Sam’s Club desenvolve itens de marca própria que são difíceis de encontrar e que são trazidos dos mercados internacionais”, diz Shih. Ele acrescenta que uma loja Sam’s Club estoca em média apenas cerca de 4 mil itens, em comparação a 25 mil em seus hipermercados.
A Aldi tem um foco parecido em um número menor de linhas de produtos, enquanto a Costco vende menos de 5 mil itens diferentes, o que permite custos menores e margens maiores. O crescimento acelerado do comércio eletrônico, liderado por empresas como Alibaba e JD.com, reduziu a atratividade as lojas físicas. “Há muitos obstáculos agora por causa do comércio eletrônico, que está empurrando os produtos de supermercado para a internet”, diz Wai-chan Chan da consultoria Oliver Wyman. Então, as empresas estrangeiras estão recorrendo a parcerias com os grupos locais de comércio eletrônico para alcançar os consumidores.
A Auchan da França, segunda maior rede estrangeira na China, vendeu uma participação de 36% em uma joint venture com a Sun Art de Taiwan, que opera mais de 400 lojas, para a Alibaba em 2017 por US$ 2,9 bilhões. O Walmart abandonou sua própria plataforma on-line na China para unir-se à JD, a segunda maior empresa de ecommerce do país, na qual o grupo americano adquiriu uma participação de 12%. Em algumas cidades a ideia é realizar entregas em 20 minutos. “Somos grandes como um elefante, mas decidimos fazer uma mudança”, diz Shih.
Fonte: Valor Econômico