Dois terços do público acima de 55 anos na América Latina e 40% no Brasil compram on-line, mostra pesquisa
Por Lucianne Carneiro
Dois terços das pessoas com 55 anos ou mais na América Latina – considerando México, Argentina, Uruguai, Chile, Peru e Colômbia – fizeram alguma compra pela internet nos últimos 12 meses, enquanto no Brasil foram quatro a cada dez. Mais de 90% têm smartphones, sendo 95% na média dos seis países latino-americanos e 93% no caso brasileiro. O acesso diário à internet é realidade para 65% dos brasileiros e para 84% dos latino-americanos, considerando a média desses seis países citados.
Os números mostram a extensão do uso da tecnologia por pessoas maduras ou da chamada “ geração prateada” (que remete aos cabelos grisalhos) e são parte do Tsunami8 Latam, um amplo estudo com o Brasil e seis países da América Latina que entrevistou mais de 17 mil pessoas sobre hábitos ligados a tecnologia, consumo, saúde e comportamento.
Há dados tanto para a geração prateada – identificada como aquela de 55 anos ou mais, embora haja diferentes correntes para o marco do início dessa geração (50, 55, 60 ou 65 anos) – quanto para o que chamam de “geração invisível” – aquela a partir dos 45 anos, que já começa a se preocupar com o aumento da longevidade.
Conduzida pelo Data8, núcleo da Hype50+, em parceria com No Pausa, Opinion Box e Pontes, a pesquisa traz um retrato da força do e-commerce após o início da pandemia, quando o isolamento social obrigou as pessoas a se voltarem cada vez mais para o comércio digital, inclusive as mais velhas.
“A pandemia trouxe maior inserção digital, especialmente entre as faixas etárias maiores do público maduro, e também aumentou a intensidade e a variedade do e-commerce, trouxe mais complexidade”, afirma Layla Vallias, cofundadora da Hype50+, consultoria especializada no consumidor maduro, um dos destaques brasileiros da lista da “Forbes” abaixo de 30 anos para 2020 e referência em economia prateada no Brasil.
Essa maior complexidade significou mudanças no uso de ferramentas digitais e também ampliação da variedade dos produtos consumidos e da frequência, muito além apenas de eletrônicos ou livros. No caso brasileiro, a Tsunami Latam mostra cinco categorias de produtos com menção de compras nos últimos 12 meses superior a 30%: eletrônicos (38,4%), remédios (34,2%), alimentos e bebidas (33,7%), roupas e acessórios (33,2%) e eletrodomésticos e utensílios para casa (32,1%).
Um dos exemplos citados por Layla para apontar essa mudança da geração madura no e-commerce é o uso de aplicativos de supermercado. Se antes da pandemia eles eram uma forma de conferir preços e disponibilidade de produtos, tornaram-se um instrumento de compra efetiva.
“Com as restrições da pandemia, as pessoas maduras passaram a ser mais ousadas em suas compras pela internet. Havia um medo maior de usar o cartão de crédito, um hábito de pesquisar pela internet, mas fechar a compra no ponto de venda… As pessoas tiveram que se adaptar”, defende ela.
A despeito dos indicadores dos outros países da América Latina serem mais elevados que os do Brasil na Tsunami8 Latam no que se refere ao e-commerce, a avaliação dos pesquisadores é de uma presença consistente do público maduro em ambos os mercados. A diferença reflete a metodologia usada, segundo eles. A pesquisa com a América Latina foi feita on-line, o que tende a pressionar positivamente os resultados ligados ao e-commerce, enquanto no Brasil foi um levantamento presencial.
“No campo da América Latina, a pesquisa trata com um público já digitalizado. Então os números que desse universo on-line tendem a ter percentuais mais altos que os do Brasil, onde a pesquisa foi nas ruas. Mas o que se vê no país é uma presença intensa do público maduro no e-commerce”, explica Livia Hollerbach, uma das pesquisadoras, ressaltando que o uso de pesquisa 100% on-line foi possível por causa do efeito da pandemia na maior digitalização da população em geral.
No caso do público de 45 anos ou mais, classificado como geração invisível, esse consumo pela internet é ainda mais expressivo. Se na média para a América Latina (seis países do estudo) daqueles com 55 anos ou mais dois terços (66%) dizem ter feito compras on-line nos últimos 12 meses, as taxas sobem para o público entre 45 e 54 anos: 95% na Argentina, 88% no Chile, 87% no Uruguai, 74% no Peru, 67% na Colômbia e 60% no México. Na faixa etária de 55 anos ou mais, essas taxas individuais dos países foram, respectivamente, de 81%, 67%, 77%, 55%, 66% e 55%.
“Esse público de 45 anos ou mais é uma amostra de tendência. A pesquisa mostra o que o público maduro já consome hoje e também como vai ser a presença do e-commerce em poucos anos”, diz Livia, que vê o resultado da pesquisa como um alerta para as empresas que não reconhecem este público. “É preciso acordar para essas oportunidades e adaptar o universo digital para este público, para a forma como realiza suas compras, quais são os desafios. Há questões ligadas à navegabilidade, ao sistema de cores, ao tamanho das fontes. Tudo deve ser levado em consideração.”
Algumas empresas já estão com o alerta ligado e vêm se dedicando a estudar o público maduro e estimular sua participação nos negócios. No Mercado Livre, um estudo interno recente sobre as tendências para o consumo em 2022 aponta a existência de um público de 21 milhões de pessoas na Amércia Latina acima de 65 anos em sua plataforma. Diretora sênior de mercado ADS (área responsável pelos anúncios), Fabiana Manfredi revela que produtos de jardinagem e eletroportáteis para cozinha são o maior destaque dessa faixa etária. “Nossa missão de democratizar o comércio eletrônico também passa por incluir digitalmente essa parcela do público. Acreditamos que isso se materializa por meio do sortimento em uma experiência de compra simples e prática, garantida por nosso ecossistema de varejo e pagamentos, e o envio rápido para qualquer lugar do país”, afirma.
No e-commerce do GPA, o público de 60 anos ou mais representa mais de 10% das compras nos sites do Extra e do Pão de Açúcar. A adoção da entrega prioritária a esse grupo de consumidores no início da pandemia, segundo o diretor de digital do GPA, Rodrigo Pimentel, ajudou a impulsionar esses números. Com a melhora da situação sanitária, há uma manutenção das vendas pela internet, embora esse seja um público classificado por ele como “multicanal”, ou seja, que gosta da praticidade do on-line, mas também não abre mão dos momentos de compra nas lojas físicas.
“A pandemia provocou a adaptação de hábitos de consumo para uma nova realidade e um dos principais reflexos no varejo alimentar foi a rápida expansão da demanda e a acentuada penetração de novos públicos, especialmente clientes acima dos 60 anos”, diz, ressaltando a maior fidelidade do público nesta faixa etária. “Os clientes são mais fiéis, com uma recorrência mensal de compras na plataforma, e têm um ticket médio de compras maior outros públicos.”
Diretora de negócios da Época Cosméticos, empresa do Magazine Luiza, Christiane Bistaco defende maior atenção das marcas para o público maduro. “É uma das gerações que têm o maior poder aquisitivo. Para sua fidelização, ela precisa ser bem atendida e entendida. Esses clientes estão cada vez mais conectados e sem medo de se aventurar em compras on-line, são um mercado com enorme potencial, principalmente, no setor de cosméticos e beleza”, defende.
Fonte: Valor Econômico