A rede de supermercados Futurama, da família Habka, enfrenta uma difícil situação financeira, que leva ao desabastecimento de suas lojas e redução do espaço de vendas em pontos como o do bairro da Lapa. A empresa é acusada na Justiça de não pagar impostos, com pedidos de bloqueios de faturamento e penhora de recursos em conta bancária. A rede tem sete unidades em locais considerados estratégicos na cidade de São Paulo.
A varejista não revela o faturamento. Há oito anos, em 2010, informou receita de R$ 249 milhões. Chegou a ter mil funcionários, segundo seu site. Hoje tem 700 empregados.
O advogado da companhia Othon Beserra disse ao Valor que a rede está em reestruturação, buscando profissionalização, redução de custos e novos “investimentos por meio de fundos e outros investidores, visando retomar a saúde financeira”. Perguntada, a empresa não informou quais fundos seriam esses.
Na Justiça, a companhia busca reverter na Justiça decisões desfavoráveis alegando, por exemplo, que cobranças ao grupo não podem se estender às lojas, uma vez que elas não têm “identidade” com os sócios da Futurama. A Fazenda estadual argumenta que, anos atrás, os pontos passaram a ser registrados com outro nome fantasia para “ludibriar” o Fisco. Na semana passada, a família Habka obteve decisão favorável nesse sentido, mas há outras ações em andamento. O fundador do grupo, Elias Habka, morto em 2014, tem como herdeiros os irmãos Fadel, Farize e Faissal.
Em apenas seis ações levantadas pelo Valor, iniciadas entre 2011 e 2017 pela União ou pelo Estado de São Paulo, os valores cobrados atingem R$ 460 milhões. Os processos consultados pela reportagem referem-se a pagamentos de ICMS e multas, além de débitos previdenciários. A ação de maior valor, entre as consultadas, entrou na vara de execuções fiscais em outubro e refere-se a uma cobrança de ICMS, de R$ 150,1 milhões.
O aspecto central defendido pela Fazenda se repete em processos nacionais e estaduais: a cobrança das dívidas deve envolver as lojas. A base do argumento é a “responsabilidade solidária” – ou seja, uma empresa que adquire um fundo de comércio ou estabelecimento e continua a explorá-lo sob a mesma ou outra razão social, também herda os passivos.
Numa ação de cobrança de ICMS de 2012, o governo argumenta que a rede fechou e abriu empresas nos mesmos pontos da Futurama, usando nomes fantasia para “ludibriar o Fisco” e como uma “manobra possivelmente” sobre os credores. Em São Paulo, no bairro de Higienópolis, por exemplo, a Fazenda diz que o Futurama mudou de sócios e de registros e passou a se chamar, anos atrás, de Supermercado Angélica.
A varejista tem rebatido a acusação nos autos, afirmando que não há prova de transferência irregular ou de que as lojas são sucessoras nas dívidas. Beserra afirma que as alegações “não condizem com a verdade” e que a questão já vem sendo “tratada judicialmente, com decisões favoráveis à empresa”.
Em março, o Futurama conseguiu indeferir pedido do Estado para que a loja de Higienópolis arcasse com os passivos de ICMS numa ação de 2011, na soma de R$ 83,1 mil. A empresa diz que a loja fica no mesmo endereço do Futurama (nome que está na fachada), mas que a “coincidência entre o local e o ramo de atividade […] não é suficiente para caracterizar sucessão”.
Beserra diz que “a empresa detém créditos perante o Estado de São Paulo, especificamente, precatórios estaduais vencidos e não pagos, e questionados em ações judiciais para compensar os tributos exigidos. Com esses créditos, diz, é possível reduzir o passivo e desbloquear valores penhorados.
Há casos em que o bloqueio pedido pela Justiça, via sistema on-line do Banco Central, não é feito porque não são encontrados “valores suficientes”.
Nas últimas semanas, surgiram informações de que algumas lojas poderiam ser vendidas a concorrentes como Sonda e Mambo. Segundo duas fontes, não há negociações em andamento. O Sonda informou que “não tem conhecimento sobre esse assunto”. Beserra disse que são “inúmeras as consultas de outras redes sobre a possibilidade de compra de alguma loja, porém não existe e não é cogitado neste momento qualquer tipo de venda”.
O aumento da concorrência, com a expansão de minimercados durante a recessão, impactou o faturamento, diz Beserra. Segundo ele, os bloqueios de faturamento solicitados, com recursos interpostos na Justiça, ultrapassam o teto, de 30% do faturamento, e também afetam os negócios.