Aumento da vacinação também faz consumidor ampliar ida às lojas físicas
Por Lucianne Carneiro
O frio mais intenso dos últimos dias aumentou a procura nas lojas de roupas, ajudando a animar o setor de vestuário, um dos segmentos do varejo que mais sofreram na pandemia e dá sinais de reação nos últimos meses, após a flexibilização das restrições trazidas pela segunda onda. O avanço da vacinação melhorou a confiança e permitiu a retomada parcial do convívio social, movimentos que favorecem as vendas do setor, dizem varejistas.
Os dados mais recentes divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) são os de maio e mostraram forte alta das vendas de tecidos e vestuário e calçados, de 16,8% frente ao mês anterior, a segunda expansão seguida (foi de 6,2% em abril). O ramo foi inclusive uma das principais influências para o crescimento do comércio como um todo naquele mês. O patamar de vendas do segmento, no entanto, ainda está 3,1% inferior ao período pré-pandemia, em fevereiro de 2020.
Os indicadores de inflação mostram que o setor também tem começado a tentar recompor margens, após políticas agressivas de promoções para conquistar o consumidor. Em maio e junho, a alta de preços de vestuário ficou perto de 1% (0,92% em maio e 1,21% em junho). No resultado acumulado em 12 meses até junho, no entanto, a alta é de apenas 4,09%, menos da metade dos 8,35% da inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).
Rony Meisler, fundador da marca Reserva e principal executivo (CEO) da AR&CO, divisão de vestuário e estilo de vida do grupo Arezzo, é um dos que já sentem o impacto positivo dessas temperaturas mais baixas nas lojas nos últimos dias. “Com certeza, a temperatura impacta na demanda do varejo. Para cima e para baixo”, diz ele, que relata aumento de vendas nas lojas físicas e pela internet após a segunda onda da pandemia.
No conglomerado Inbrands, que reúne marcas como Richards, Ellus, VR, Salinas, Bobstore e Tommy, o frio também tem sido um impulsionador das vendas. Na avaliação da executiva-chefe de marketing da Inbrands e diretora da marca Ellus, Adriana Bozon, a o aumento das vendas no varejo de moda ocorreu em junho e julho, com estoques mais equilibrados e revisão de sortimento.
“Estamos com vendas acima do ano passado e também com crescimento frente a 2019. Os itens mais vendidos são jaquetas, tricôs e moletons”, afirma ela, que aposta em crescimento nos próximos meses, como vem ocorrendo no exterior após o avanço da vacinação, com a retomada das atividades e da frequência de pessoas em bares, restaurantes e eventos.
As temperaturas mais baixas também vêm ajudando varejistas menores, como a loja de roupas Mundo Lulu, localizada no bairro do Bom Retiro, em São Paulo. A fundadora, Andrea Lee, viu a procura por itens como tricôs e conjuntos de moletom saltarem na última semana. Com isso, chegou a buscar fornecedores para repor estoque de peças de frio porque já estava se preparando para a entrada da coleção de primavera.
“Esse frio repentino ajudou. O paulistano não esperava tanto frio e foi às compras de peças mais quentinhas. A gente estava já numa entressafra, mudando a coleção. Tive que correr para fazer reposições e colocar lançamentos novos para suprir essa demanda. Praticamente esses dias só vendeu tricô”, conta ela, que já percebia melhora, embora tímida, nos meses mais recentes.
Entre as grandes redes de varejo, também é unânime a avaliação de melhora dos resultados nos últimos meses, após as flexibilizações nas restrições de funcionamento de atividades a partir de abril. Sem comentar os últimos dias por causa do período de silêncio, as Lojas Renner apontam que as temperaturas mais baixas em maio e junho ajudaram na venda de itens de inverno, reduzindo as necessidades de remarcações. Com isso, afirmam, foi possível melhorar as vendas e as margens.
Já a C&A percebeu “reação significativa” das vendas a partir de maio, após ter começado o segundo trimestre ainda sofrendo as consequências das restrições em função da pandemia, com impacto mais acentuado em algumas regiões, como São Paulo. “Percebemos a partir de maio reação significativa, puxada pelo Dia das Mães, além de outros fatores, como maiores flexibilizações da pandemia. Esta tendência tem sido mantida, mostrando aumento na participação das vendas das lojas físicas, assim como a continuidade do crescimento no e-commerce”, segundo a rede.
Outra rede que comemora o momento do mercado é a Riachuelo. O CEO da empresa, Oswaldo Nunes, diz estar “otimista com o processo de vacinação em curso, que traz mais confiança à população, e com a ampliação de horários de funcionamento”.
“Nossa percepção é que a vacinação permitiu um clima mais positivo, uma certa retomada de rotina que favorece o consumo. As pessoas se cansaram de não comprar”, afirma a diretora-presidente da Lupo, Liliana Aufiero. A marca foi uma das favorecidas pela mudança de hábitos na pandemia, com o avanço da linha esportiva para uso no dia a dia e de pijamas.
Presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit), Fernando Pimentel diz que datas importantes para o varejo – como o Dia das Mães e dos Namorados – tiveram vendas melhores e a expectativa é de continuidade, embora não descarte pontos de atenção, como risco de nova onda da covid-19 e a pressão de custos, como energia elétrica e algodão.
“Nossa visão é de uma recuperação mês a mês, estamos vendo o copo mais cheio que vazio. Na medida em que a vida vai sendo retomada, a demanda vai aumentando”, afirma ele.
A expectativa de melhora das vendas de vestuário é compartilhada pelo economista sênior da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), Fabio Bentes, que acredita que os próximos dados do IBGE, referentes aos meses de junho e julho, já permitam restabelecer o patamar de vendas do pré-pandemia. “Nossa estimativa é de crescimento das vendas de vestuário em 13,2% em 2021. Isso mostra a reação, mas ainda não será suficiente para compensar a perda de 22,5% do setor em 2020”, diz.
Fonte: Valor Econômico