A Associação Brasileira de Franchising (ABF) tenta no Supremo Tribunal Federal (STF) reduzir o impacto da decisão que declarou constitucional a incidência do Imposto sobre Serviços (ISS) nos contratos de franquia. O principal objetivo do recurso (embargos de declaração) apresentado pela entidade é modular os efeitos da decisão no tempo, para que o entendimento dos ministros comece a valer apenas a partir da data do julgamento.
Empresários do setor, que registra mais de 1,4 milhão de empregos diretos e contribui com 2,5% do PIB, afirmam ter sido surpreendidos com a decisão, proferida no meio da pandemia, após 11 anos de espera. A alíquota do ISS vai de 2% a 5% sobre o valor da nota fiscal. Em São Paulo cobra-se o percentual máximo.
No STF, o tema foi debatido por meio de recurso extraordinário (RE 603136) da Venbo Comércio de Alimentos, que opera a marca Bob’s, contra o município do Rio de Janeiro. No início de junho, por maioria dos votos, foi declarada a tese com repercussão geral. Divergiram apenas os ministros Marco Aurélio e Celso de Mello. O presidente da Corte, Dias Toffoli, não votou porque estava em licença médica.
Segundo o diretor jurídico da ABF, Fernando Tardioli Lúcio de Lima, os embargos de declaração apresentam três pedidos. Primeiro, que seja sanada “omissão” da decisão do STF sobre a natureza híbrida do contrato de franquia, que não seria de prestação de serviços.
O outro é o pedido alternativo de modulação dos efeitos da decisão. “O terceiro é a suspensão de todas as ações em tramitação discutindo a matéria até que sejam julgados os embargos. Para que as execuções [ações de cobrança] não sejam retomadas até a sua conclusão”, afirma Lima.
A modulação é importante para os empresários do setor porque alguns entraram com ação na Justiça questionando a cobrança de ISS e depositam os valores em juízo, outros ajuizaram processo, mas não fizeram depósito, e há os que não ajuizaram ação. “Se a decisão do STF valer imediatamente, pode liquidar pelo menos 30% das operações de franquia no Brasil”, diz o diretor jurídico da ABF.
Um dos requisitos para a aplicação da modulação é a ruptura de jurisprudência. “Isso ocorreu porque a Justiça de pelo menos cinco Estados já tinha pacificado que não incide ISS nos contratos de franquia, inclusive São Paulo. A decisão do STF surpreendeu a todos os empresários que acreditaram na posição do próprio Judiciário”, afirma Lima.
Para o master franqueado da Jan-Pro no Brasil, do segmento de limpeza, Renato Ticoulat, o ideal é distinguir claramente o que é royalty pelo uso da marca — e não se cobrar imposto sobre isso —, dos serviços a serem tributados, como treinamento. “Na minha estrutura está distinto o que são royalties (70%) e o que é serviço (30%). Eu tinha uma liminar me isentando do pagamento de ISS sobre royalties, mas entendemos que pode ser cassada por causa da decisão do STF e essa cobrança vai equivaler a 50% da minha margem líquida”, diz.
Representando os municípios, que contam com a arrecadação do ISS, a Associação Brasileira das Secretarias de Finanças das Capitais (Abrasf) já apresentou contrarrazões nos embargos de declaração da ABF. Segundo Ricardo Almeida Ribeiro da Silva, assessor jurídico da entidade, não cabe modulação dos efeitos da decisão do Supremo porque não houve mudança de jurisprudência. “O voto do próprio ministro relator Gilmar Mendes deixa isso claro”, afirma.
Almeida destaca o seguinte trecho do voto do ministro: “Entendo que é constitucional a incidência de ISS sobre os contratos de franquia empresarial. Ao concluir nesse sentido, não estou, no entanto, inovando em relação à linha de precedentes do Supremo Tribunal Federal na matéria”.
Para o assessor jurídico da Abrasf, o julgamento da Corte sobre franquias foi um desdobramento lógico do que determinou constitucional a incidência de ISS sobre atividades realizadas pelas operadoras de plano de saúde (RE 651703). “Por isso, creio que as chances de o Supremo modular [no recurso da ABF] são muito baixas”, diz.
Fonte: Valor Econômico