As maiores varejistas regionais do país, controladas por famílias e, muitas vezes, líderes nos locais onde atuam, crescem mais do que os grandes grupos, segundo ranking anual das 300 maiores empresas do setor elaborado pela Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC), a ser divulgado nesta semana.
A maior parte dessas operações está presente em regiões menos impactadas pela crise nos últimos meses (como Centro-Oeste e parte do Sul, beneficiadas pelo agronegócio) ou se expandem em segmentos mais resistentes ao cenário adverso, como o atacarejo. Pelos dados, as dez maiores varejistas regionais do país faturaram R$ 44,2 bilhões em 2017, alta de quase 10% sobre o ano anterior. No mesmo ano, o varejo restrito (que exclui material de construção e automóveis) se expandiu apenas 2,2%.
Para efeito de comparação, as dez maiores empresas de varejo do país – como Grupo Pão de Açúcar, Carrefour, Lojas Americanas e Lojas Renner – se expandiram 7,4%, para R$ 244 bilhões e 9,7% em 2016 – a metade do índice de expansão das redes regionais.
Em 2016, a taxa de expansão das dez maiores regionais foi de 18%. Nesta lista estão negócios com receita anual entre R$ 3 bilhões e R$ 6 bilhões. Para a análise, foram considerados os números de empresas que divulgaram os seus resultados em 2016 e 2017, de maneira que a comparação pudesse ser feita.
Nesta lista de redes regionais aparecem apenas grupos com capital fechado, como Muffato, Companhia Zaffari (ambas do Sul do país), Lojas Cem (com foco em São Paulo) e grupo Pereira, com sede em Campo Grande (MS).
“O ritmo de concentração das vendas nas mãos dos grandes perdeu força em 2017 em parte porque as redes médias regionais cresceram mais rapidamente. Elas conhecem bem o cliente no local onde estão, aprenderam com seus pontos fracos nos últimos anos, como em logística e em processos, e algumas não reduziram tanto os investimentos na crise”, diz Eduardo Terra, presidente da SBVC.
Segundo consultores, apesar de terem menor escala que os líderes, esses varejistas operam com um volume de vendas representativo, que permite acordos exclusivos com indústrias, e têm tido acesso a linhas de financiamento mais competitivas do que no passado.
Em 2017, as dez líderes nacionais representaram 40,5% das vendas totais das 300 maiores varejistas, praticamente mesmo índice do ano anterior. Nas regionais, a taxa teve leve elevação de 7% para 7,3%. Para se ter uma ideia mais clara, esse percentual de 0,3% equivale a adicionar, em um ano, vendas referentes a quase uma cadeia do tamanho do McDonald’s.
Em termos de faturamento por loja, que mede produtividade, há diferenças consideráveis. No comércio de alimentos, que responde por quase metade das 300 maiores varejistas, enquanto as cinco líderes regionais venderam R$ 95 milhões por loja em 2017, em média, as líderes nacionais somaram R$ 55,4 milhões, calculou o Valor com base na pesquisa.
Na avaliação de consultor Manoel Antônio de Araujo, sócio diretor da consultoria Martinez de Araujo, este não é um movimento iniciado recentemente, mas que se fortaleceu. “Elas tomaram conta das áreas onde atuam sem apostar em segmentos com problemas recentes, como os hipermercados, que fizeram muita rede grande perder dinheiro”, disse. Araujo ressalta que pesa de forma negativa nos números o desempenho de algumas cadeias nacionais em situação difícil como Máquina de Vendas, Cencosud e Walmart.
Ao se considerar a base de lojas, que também ajuda a explicar o desempenho – já que inaugurações elevam receita – as 10 maiores redes do país aumentaram sua base em 5%, para 12,7 mil pontos em 2017. As dez regionais têm bem menos lojas – somavam 871 em dezembro -, mas a base subiu 8%.
O relatório mostra que as 10 maiores empresas de varejo detém 15% do mercado, as 50 maiores 27% e as 100 maiores apenas 33%, diz Alberto Serretino, sócio fundador da Varese Retail, e vice-presidente da SBVC. “Cerca de 47% só possuem operação em um Estado e 62% em até cinco estados. Somente 15% das maiores empresas de varejo operam nos 27 Estados do país”, diz Serrentino.
Araujo lembra que já há um movimento de reação das grandes cadeias ao avanço das regionais, como a decisão do GPA de usar a marca Compre Bem para entrar no segmento de supermercados explorados por grupos como Savegnago e Shibata, ambos fortes no interior de São Paulo.
A rede Savegnago Supermercados, da família de mesmo nome e R$ 3 bilhões em vendas anuais, tem aberto de 3 a 4 lojas ao ano (cerca de 10% da base total de pontos do grupo), com investimentos entre R$ 15 milhões e R$ 20 milhões em cada ponto. Com sede em Sertãozinho (SP), a empresa cresceu 17% em vendas em 2017.
Outra operação, o grupo Muffato, dos irmãos Muffato, com pontos no Paraná, Minas Gerais e São Paulo, abriu três lojas no primeiro semestre – média de uma a cada dois meses. Oriunda de Cascavel (PR), a rede tem força maior no Paraná, onde o varejo cresceu 3,2% em 2017, segundo o IBGE, acima dos 2,2% do varejo no ano. Em 2017, a empresa se expandiu 18%.
“Entendemos cada cidade e até cada loja como se fosse única”, diz Beto Pereira, presidente do grupo Pereira, com sede no Mato Grosso do Sul, e dono do Comper Supermercados e das atacadistas Bate Forte e Fort. São 64 pontos em cinco Estados. A maioria das lojas são de atacarejo, negócio que mais cresce no varejo alimentar.
“Nossa expectativa, é de, no mínimo, manter neste ano o patamar de crescimento de cerca de 20% visto em 2017. Desde o ano passado, abrimos 10 unidades. Até o fim de 2018 ainda devemos abrir pelo menos mais 3 lojas”.
Nessas redes, há exposição forte de marcas de produtos da região e também são fechados acordos comerciais com fornecedores que buscam alternativas para não depender só das grandes cadeias. Ainda tem sido oferecidos serviços percebidos como de alto valor pelo cliente. Isso ocorre em setores de açougue ou padaria, por exemplo. “Em determinadas cidades, o consumidor vai a uma certa loja porque gosta do corte da carne daquele açougueiro que ele conhece. É uma competição em que as exigências são outras”, diz Araujo.
Fonte: Valor Econômico