O futuro da moda parece ser cada vez menos intuitivo e cada vez mais “data-driven”
O fast fashion caracteriza-se pela rápida mudança do mostruário nas lojas de moda e acessórios. A ideia é dar sempre motivos para que o consumidor visite as lojas. Ainda assim, dentro desse processo de novidade acelerada, há sempre alguns padrões que direcionam o design por uma temporada ou duas. Há toda uma indústria voltada para a detecção de padrões culturais e de comportamento que serão combinados com elementos artísticos para criar a próxima onda.
Mas o futuro da moda parece ser cada vez menos intuitivo e cada vez mais “data-driven”. A roupa que você usa pode ter sido produto não dá cabeça de um estilista, mas da observação e aplicação de sofisticadas de Analytics e Big Data.
Essa foi uma das conclusões mais poderosas do painel “O futuro do descolado: prevendo o que será ‘cool’ na moda”, no SXSW, que ocorre nesta semana em Austin, nos Estados Unidos.
Quando o assunto é moda, a percepção geral é a de um trabalho fortemente inspiracional, com estilos e imagens se sobrepondo para compor o retrato de uma época. Mas o debate revelou um lado muito mais científico da moda atual. Rachel Brooks, Estrategista de varejo e produtos da ThoughtWorks (mediadora), Laura Khoury, Fundadora e CEO da Shopintelligence, Kandis Yoakum, Gerente de Produto da Zappo’s, e Olivier Zimmer, Cientista de dados de moda do Google conversaram de maneira descontraída, colocando na mesa toda a influência da tecnologia, hoje um novo elemento na composição do que é e será fashion.
Assim, pensar em moda hoje significa ter um olho em possibilidades como drones para entrega ou reposição de estoques, Internet das Coisas, o último modelo da princesa Charlotte, a opção por denim duplo, entre outros fatores que mudam e identificam o cotidiano.
Olivier Zimmer comentou que a moda hoje tem um olhar mais amplo. Identifica as megatendências, abre a lente do futuro, a partir da observação minuciosa do hoje. Mudanças sutis de comportamento podem mudar a visão da moda no futuro. Nas palavras de Zimmer: “precisamos ligar os pontos para enxergar mais claramente se estamos diante de uma tendência. Se uma grife estabelecida tem 7 milhões de seguidores no Instagram e Kim Kardashian tem 63 milhões, é preciso entender o que isso significa para a moda”.
A moda é feita de dados
Mas qual é o nível das informações e dados que podem ser coletados pelas empresas hoje? Quais são aquelas interessantes para a moda? Yoakum da Zappo’s diz que é possível verificar com exatidão como é o processo de decisão. Na Zappo’s, e-commerce de calçados e moda, famoso pelo excepcional nível de serviço, é possível entender como é o processo de escolha de cada consumidor e de cada item, enxergando as ofertas clicadas, os departamentos visitados até a compra específica, toda a jornada de cada consumidor e de cada oferta. “Assim é possível refinar o ambiente para que ele se molde na medida das expectativas dos clientes”.
Segundo os painelistas, os dados são fartos e permitem identificar e apontar como otimizar estoques e materiais, a distribuição dos produtos, marketing e vendas, aumentar sensivelmente a lealdade do cliente provendo melhores experiências.
A era de varejistas apartados de seus clientes, com marcas sem significado, ficou para trás. Zimmer do Google definiu o escopo de sua atuação como cientista de dados de moda: “queremos inspirar o processo de criação dos designs. Os dados suportam o processo de escolha e decisão do design. Podemos predizer o que terá maior volume de vendas e o que terá maior valor para o cliente. Podemos saber onde estamos agora e para onde uma marca varejista poderá ir. Muitas coisas não vem dos designers, vem das ruas. O conteúdo gerado pelos consumidores é hoje uma grande inspiração para a moda”. Ou seja, os dados coletados e analisados no Big Data – comentários, fotos, imagens, músicas compartilhados, filmes – toda a imensa gama de dados digitais reunidos e catalogados pelo Google aponta caminhos para a produção de uma moda que caia em cheio no gosto dos consumidores.
A intuição morreu?
Laura Khoury da Shointelligence ainda vê um certo peso da intuição no futuro da moda: “O profissional de moda precisa entender o estilo de vida requerido pelo produto, o estilo de vida do cliente, comparar, e aí detectar as mudanças a caminho. Mas como reagir às mudanças? Não é uma escolha entre on e off. É necessário integrar a cadeia de valor, para oferecer uma experiência rica para todos os consumidores”.
Kandis Yoakum contou o caso, na preparação da coleção para o verão passado, que a sua base de dados, indicava claramente a percepção de que denim preto seria um hit na estação. Todos os especialistas de criação da Zappo’s foram contra, disseram que era absurdo vender preto no verão. Kandis insistiu, pediu peças baseadas em denim preto e na chegada do verão, a única rede já com estoque disponível era a Zappo’s. As vendas foram enormes e extremamente rápidas.
Nesse contexto, qual é o futuro do varejo? Decerto não será aquele fruto da imaginação ou da leitura intuitiva de estilistas apenas. Para Khoury, “o futuro do varejo é o futuro do ‘eu’, do consumidor que está ciente de seu poder e o exerce para se sentir melhor. O futuro da moda é o que o consumidor fará dele”. E os dados estão aí para antecipar exatamente o que consumidor fará e buscará no futuro.
Para Zimmer, a moda será algo como o visto no filme “Moneyball”, com Brad Pitt. Um momento que possa ser previsto, medido e antecipado, em função da demanda esperada e alcançada, das expectativas geradas e atendidas.
E Kandis espera que o “Data Fashion” consiga responder também simplesmente por que? “Essa é a pergunta hoje que mais nos provoca: já temos como saber o que o consumidor quer. Mas queremos saber por que quer? Por que fazem, decidem e preferem o que fazem e decidem e preferem”.