Por Monica Scaramuzzo e Fernanda Guimarães | O grupo espanhol de varejo Dia vai vender suas operações no Brasil, consideradas deficitárias e com baixos resultados no país, apurou o Valor. A assessoria financeira Lazard foi contratada para buscar um novo investidor para o negócio. As conversas estão em fase inicial.
Fontes afirmam que a operação deverá atrair o interesse de fundos de private equity (que compram participação em empresas) e grupos estrangeiros. Uma pessoa a par do assunto não vê o interesse de grandes varejistas que atuam no Brasil, como GPA, dono do Pão de Açúcar, e Carrefour, entre os interessados. O potencial valor do negócio ainda não está fechado. “É uma transação que vai demandar colocar muito dinheiro para investimento.”
Segundo uma pessoa familiarizada com o tema, o fundo russo LetterOne, que em 2019 assumiu o controle do Grupo Dia, com uma fatia de 74%, está com problemas de caixa na Europa e não quer colocar dinheiro no Brasil, em um momento em que as lojas precisam de reformas e a rede precisa crescer de forma organizada.
Com cerca de 600 lojas no Brasil, há três anos o Dia contratou a assessoria de Enéas Pestana, ex-presidente do GPA, para remodelar o negócio. Mas o trabalho não foi adiante. A companhia teria que reformular o conceito de suas lojas, carentes de instalações mais modernas. E a força da marca também precisaria ser trabalhada.
O Valor apurou que os controladores deram preferência por concentrar esforços na Espanha, onde a rede está bem consolidada e o retorno do investimento é mais rápido. A diferença de apresentação das lojas é gritante. Na Espanha, as unidades são limpas, iluminadas e bem abastecidas. No Brasil os mercadinhos, mesmo em bairros mais nobres, estão mal cuidados.
Um plano de recuperação foi montado em 2020, quando a rede fechou lojas no Brasil e a diretoria começou a ser trocada. No início de 2022, quando chegou o momento de fazer aportes para reestruturar as lojas, a diretoria global do Dia informou que o foco era o mercado espanhol.
Há quase 20 anos no país, o grupo Dia começou a fazer uma expansão rápida de seus negócios, abrindo lojas em locais que não eram considerados estratégicos e que não tinham bons resultados. Embora haja sortimento de produtos, incluindo importados, e os preços não assustam, a reposição deixa a desejar. E as instalações estão comprometidas, dando aspecto de abandono.
Um dos problemas do grupo no mercado local é o formato da rede — 40% estão nas mãos de franqueados. Como a margem é baixa no varejo alimentar no Brasil, os empresários detentores das franquias acabam tendo mais de uma loja, o que prejudica muitas vezes a estrutura de gestão. Na Europa, as lojas são administradas por “famílias operadoras”, que comandam o negócio como uma espécie de mercado de bairro.
A rede Dia representa no Brasil o modelo de loja de proximidade, onde o consumidor costuma fazer pequenas compras algumas vezes por semana. Poderia ter dado certo, mas sua gestão se tornou errática e mal executada.
No terceiro trimestre, o grupo Dia registrou receitas de 1,86 bilhão de euros, queda de 8,8% na comparação anual. Retirando efeitos cambiais, houve aumento de 3% no faturamento. A companhia destaca que a desvalorização do peso argentino teve efeitos nos seus resultados entre julho e setembro, com queda de 20,3% nas vendas.
A rede está presente na Espanha, Portugal, Argentina e Brasil. No mercado brasileiro, a rede encerrou o terceiro trimestre com 182,1 milhões de euros em vendas, queda de 22,4% no ano, refletindo o cenário de deflação de alimentos e a reestruturação da empresa no país.
Em agosto deste ano, o Dia tinha informado que a rede passaria por um período de transição no Brasil para tornar o modelo de negócios mais rentável.
Procurado, o Lazard não comentou o assunto. Em nota, o Dia informou que “o grupo está atualmente focado nas operações diárias para continuar avançando na consolidação do crescimento”. Segundo a matriz, a rede “avalia continuamente diversas oportunidades estratégicas sem ter, até esta data, novidades a comunicar neste sentido”. O grupo “informará ao mercado caso se concretize alguma nova operação estratégica.”
Fonte: Valor Econômico