Por Rachel Gamarski | A maioria das pessoas olharia para o paradisíaco litoral da Bahia e pensaria em férias na praia e no lugar onde o piloto de Fórmula 1 Lewis Hamilton escolheu para comemorar o réveillon.
Mas um empresário empreendedor viu na região a oportunidade de produzir um chocolate inovador.
A Dengo, cuja base é aquele trecho belíssimo do sul da Bahia, próximo a Trancoso, se esforça para ser a melhor e mais ecológica produtora de chocolate do mundo.
A empresa fabrica produtos como barras de chocolate com banana e castanha de caju em embalagens coloridas e atraentes que evocam as florestas tropicais do Brasil. Neste processo, a Dengo trabalha para reduzir desperdício, duplicar a renda dos produtores de cacau e incentivar o cacau orgânico e a agricultura regenerativa.
Para produzir o seu chocolate, a Dengo compra cacau com um prêmio que varia entre 70% e 200% do preço de mercado — quanto mais sustentável for o produto, maior será o prêmio pago a mais de 160 produtores locais e pequenos produtores em uma das zonas mais pobres do país.
A empresa começou em 2017 em São Paulo; agora possui 38 lojas nas maiores cidades da América Latina e duas em Paris. E mais estão por vir: a Dengo, cujo maior investidor é Guilherme Leal, fundador da Natura (NTCO3), está investindo cerca de R$ 100 milhões (US$ 20 milhões) em uma nova fábrica.
A instalação de 11.000 metros quadrados está prevista para ser inaugurada no primeiro trimestre de 2025 e expandirá a produção da Dengo em 500% (a empresa não confirma a quantidade de chocolate que produz).
Com suas credenciais de impacto social e ambiental, incluindo a certificação B Corp, a empresa vê oportunidades de expansão no mercado europeu, que tem regras ESG rigorosas em vigor, e também na América do Norte nos próximos anos. A meta é pelo menos mais duas lojas em Paris e uma presença nos EUA até 2026, disse Tulio Landin, co-CEO da Dengo, em entrevista à Bloomberg News.
Ele acredita que a qualidade do chocolate deve ser tão boa quanto as suas credenciais ESG. “Se você me perguntar quem é meu concorrente, no segmento de chocolate premium e pelo preço, eu diria que é a suíça Lindt”, disse Landin.
O chocolate Dengo tem um sabor pronunciado e puro de cacau; é suave e frutado sem ser muito doce. As barras são repletas de ingredientes locais, incluindo frutas da floresta amazônica, como o cupuaçu, que tem sabor doce de mamão e antioxidantes como vitamina C, além de fibras e ferro.
Outro sabor não convencional da Dengo é manga, limão e tapioca. Esses ingredientes incomuns ajudam a destacar o produto, acrescenta Landin, que trabalhou no JPMorgan (JPM). Mesmo assim, os produtos mais vendidos da Dengo em todo o mundo são as barras de banana e castanha de caju.
As barras custam cerca de US$ 12 por 200 gramas no Brasil e 16 euros pelo mesmo produto na França. Uma quantidade igual de chocolate Lindt custaria cerca de US$ 10.
Expansão
Com o seu novo investimento, a Dengo planeja aumentar exponencialmente o número de produtores registados para cerca de 3.000, ou cerca de 1.775%, disse Landin.
A expansão da empresa ocorre em um momento em que o apetite do Brasil por chocolate cresce. No terceiro trimestre de 2023, o país consumiu 597.000 toneladas de chocolate, um aumento de 10,5% em relação ao mesmo período do ano anterior.
Nos três primeiros trimestres de 2023, o país produziu 615.000 toneladas de chocolate, segundo a Associação Brasileira da Indústria de Chocolates, Amendoim e Balas, um aumento de 10,6% em relação ao ano anterior.
A empresa utiliza ferramentas para rastrear a origem do cacau, o que segue uma diretriz da União Europeia para proteger as florestas tropicais através do comércio. Segundo Luiza Aguiar, analista da XP, as novas regras da União Europeia afetarão diretamente o mercado brasileiro de chocolate e cacau. “As empresas terão que provar que não têm nada relacionado ao desmatamento.”
A Dengo ainda não gera lucro, mas Landin disse acreditar que a nova fábrica aumentará a receita da empresa em 600%. “Estamos muito perto do breakeven e nossas receitas aumentaram mais de 30% em 2023″, disse ele.
O Brasil é o sexto maior produtor mundial de cacau. A maior parte da produção do país vem do Nordeste. A iniciativa da Dengo inclui apenas uma fração dos produtores do país – são 90.000 no total e 69.000 estão na Bahia, segundo a Associação Nacional das Indústrias Processadoras de Cacau (AIPC).
Mas a remuneração mais elevada da Dengo e as exigências de cacau de origem ética está impactando a cadeia de abastecimento global. “O empreendimento da Dengo ajuda a incentivar a cadeia de desenvolvimento do cacau fino como um todo no Brasil”, disse Leonardo Rossetti, analista de cacau da StoneX.
A cadeia do cacau no Brasil já está vinculada às diretrizes internacionais de ESG, disse a CEO da AIPC, Anna Paula Losi, em entrevista. O governo tem a meta de aumentar a produção de cacau para 400.000 toneladas por ano em 2030, contra 220.000 toneladas em 2023.
A Dengo, que tem mais de 500 funcionários, também planeja reduzir o uso de plásticos de 7% para zero, em parte mudando suas embalagens, embora não tenha um cronograma definido para isso.
Entre outras iniciativas ESG da empresa, a Dengo firmou parceria com o Bradesco (BBDC4). Em novembro passado, uma equipe do Bradesco viajou à Bahia para dar aos produtores de cacau uma cartilha sobre finanças, incluindo abertura de contas bancárias e investimento em equipamentos de produção.
Há também uma lista de sete critérios de código de conduta com os quais os produtores devem concordar, para serem aprovados pela Dengo. Entre elas: nenhum plantio pode resultar em desmatamento; e todas as crianças que vivem nas fazendas de cacau têm de frequentar a escola.
Fonte: Bloomberg Linea