Gigantes do varejo como o Walmart, o Carrefour e a Target estão inaugurando cada vez mais dark stores (lojas escuras, em tradução livre) em diferentes regiões do mundo, incluindo na América Latina.
São locais exclusivos para armazenamento, separação e envio de produtos online, mas diferentemente dos centros de distribuição tradicionais, que são gigantescos e longe da cidade, as dark stores são menores, localizadas em centros urbanos e parecidas lojas comuns, mas fechadas para o público.
Inclusive muitas das dark stores são criadas no espaço físico de antigas lojas que tinham pouco movimento ou pouco lucro – as empresas fecham a loja normal e abrem uma dark store, explica Xavier Budet, professor de estudos econômicos da Universidade Aberta da Catalunha.
Em algumas delas, os consumidores podem ir buscar os produtos que compraram online, mas pegam a compra já embalada, ou seja, não entram na loja.
Ou seja, elas são pontos de armazenamento ou coleta, o último estágio da cadeia logística.
“A ideia das ‘dark stores’ é trazer mercadoria para mais perto do consumidor”, diz Antonio Iglesias López, professor da Escola de Marketing e Business (ESIC), de Madrid, e coordenador do mestrado em gerenciamento de logística e cadeia de suprimentos. “As pessoas compram online e querem ter os produtos em algumas horas.”
“É uma tendência que começou a se expandir pelo mundo que cresceu nos países com maior desenvolvimento do comércio eletrônico”, diz ele. Ou seja, está crescendo especialmente nos EUA, na Europa e nos mercados asiáticos mais desenvolvidos.
Embora nem todo mundo tenha confiança de fazer compras de supermercado na internet, os mais jovens tendem a preferir o comércio eletrônico.
Duas dificuldades de abrir esses depósitos em grandes centros urbanos são o custo e a disponibilidade do solo – porque um aluguel exorbitante pode matar os lucros.
“Vamos ver cada vez mais a abertura de dark stores no mundo, mas elas estarão situadas fora das áreas densamente povoadas”, diz Simon Mayhew, chefe do varejo online da IGD, uma organização britânica que estuda a indústria de produtos alimentícios.
Por isso, no Brasil a abertura (ou transformação de lojas) de dark stores é uma escolha feita mais pelas grandes marcas de varejo, especialmente de alimentos, pelo grande fluxo de produtos, segundo Aurélien Jacomy, CEO da consultoria de logística Diagma. Lojistas menores preferem o ship from store, ou seja, distribuir os produtos vendidos online a partir dos estoques das lojas normais.
“Entre 50 e 100 pedidos por dia, é possível manter a distribuição a partir do estoque. Mais que isso, o fluxo de separação cruza com o fluxo dos clientes, o que pode prejudicar a experiência do cliente. Então ter dark stores vale a pena para quem recebe acima de 100 pedidos por dia”, diz Jacomy.
O desejo por rapidez na entrega é outro fator-chave para um varejista escolher abrir uma dark store. “É uma expectativa cada vez maior do cliente que a entrega seja mais rápida”, afirma.
Críticas
O surgimento das dark stores gera algumas preocupações, por exemplo, a de que lojas fechadas para o público no meio urbano contribuam para diminuir a vitalidade das cidades – um processo que se iniciou com os shopping centers há algumas décadas.
Márcio Thomé, do departamento de Engenharia Industrial e coordenador do mestrado em Logística da PUC-Rio, admite que é uma possibilidade, mas pondera que as “dark stores” não devem substituir as lojas físicas, especialmente no caso dos supermercados.
“A gente está evoluindo mais para uma riqueza maior de modos de compras, onde as várias possibilidades convivem, do que para uma substituição de modelo”, explica.
Mayhew estima que haverá mais lojas híbridas, ou seja, lojas físicas com um espaço nos fundos para entrega de compras online. No Brasil, o Carrefour “está transformando algumas de suas lojas para incorporar dark stores nelas”, afirma.
Em algumas grandes cidades, o aumento do comércio eletrônico trouxe efeitos negativos para o fluxo de veículos nas ruas, a exemplo de Nova York. Com tantas entregas de produtos, não sobra espaço nas ruas para os entregadores.
“Muitas vezes não temos escolha. Se não há onde estacionar, é preciso parar em fila dupla”, diz Thomas Chu, coordenador da empresa de transporte UPS em Nova York.
No caso de cidades com muitos problemas de trânsito, é provável que se proliferem centros de armazenamento menores e com um estoque de produtos mais limitado.
Outra preocupação gerada pelo surgimento dessas lojas é o impacto nos empregos, já que elas não exigem vendedores e outros trabalhadores que as lojas tradicionais necessitam.
Mas, segundo o professor Thomé, da PUC-Rio, outros cargos são abertos, especialmente na distribuição. “O que acontece na verdade é a necessidade de adaptação e preparação da mão de obra para lidar com as novas tecnologias”, afirma.
Ele dá como exemplo o cargo de “picker”, ou seja, pessoa que seleciona os produtos para a distribuição, que precisa saber trabalhar acompanhados por robôs que ajudam nesse processo.
Expansão global
As vendas no comércio eletrônico vão se expandir freneticamente nos próximos anos.
Elas movimentaram US$ 2,8 trilhões em 2018 e espera-se que aumentem para US$ 4,9 trilhões em 2021, segundo a empresa Statista.
A América Latina ainda é considerada um mercado “imaturo” no setor de comércio eletrônico, o que significa que há uma grande possibilidade de expansão – principalmente em países como México, Brasil, Chile, Colômbia e Panamá.
E, segundo especialistas, no comércio digital ganha quem oferecer preços convenientes e entregas mais rápidas.
Fonte: BBC