Por Marcos Bonfim | No norte de Santa Catarina, ao trafegar pela rodovia que cruza o litoral, chama a atenção a presença de grandes galpões que se apresentam em meio à paisagem de algumas cidades. Os espaços são de uma rede supermercadista que movimentou R$ 5,5 bilhões em 2022 e registrou lucro líquido acima de R$ 200 milhões. Presente em 26 das 295 cidades do estado, o Grupo Koch, dono das marcas SuperKoch (de supermercados) e Komprão (de atacarejos), apresentou crescimento de 57% em relação aos 3,5 bilhões de reais faturados um ano antes.
Desde 2021, o negócio liderado por José Evaldo Koch é a principal rede supermercadista do estado sulista e uma das maiores do país na 13ª posição, segundo Associação Brasileira de Supermercados (ABRAS). A conquista é parte uma maratona que os irmãos Antonio, José, Albano, Geraldo e Sebastião Koch iniciaram no começo dos anos 80, à época com idades que variavam entre 8 e 22 anos.
No pequeno município de Antônio Carlos, na região metropolitana de Florianópolis, a família plantava hortaliças e verduras como salsinha, cebolinha, chamados localmente de “verdinhos”, e ainda aipim, cenoura e batata doce.
A cidade tem na agricultura a principal atividade econômica e é a maior produtora de hortaliças no estado. De acordo com dados da prefeitura, anualmente são 150 mil toneladas, na média. E 80% das famílias dependem da comercialização dos produtos cultivados na terra. Era o caso da família Koch e os seus nove filhos.
Mas o escoamento da pequena produção era um problema. Para chegar aos consumidores, dependiam de terceiros e as vendas não iam nada bem. A mudança veio quando o filho mais velho do casal, Sebastião, convenceu os pais a venderem um punhado de gado para comprar uma Kombi.
Na cabeça, comercializar as verduras e hortaliças diretamente em feira livre em Florianópolis. Lá se foram 14 anos de trabalhos vendendo tanto a produção própria quanto outros itens adquiridos no Ceasa local.
“Essa experiência nos ajudou a lidar com perecível, trabalhávamos com estoque por um dia, mas era uma vida muito árdua, desconfortável”, afirma José Koch, que começou com 15 anos e lidera o grupo supermercadista desde o início da jornada.
“Tínhamos que acordar muito cedo, ir para o Ceasa, comprar os produtos, montar barraca, vender fruta e, no final, desmontar novamente”.
A rotina diária combinada ao frio constante e as madrugadas chuvosas pesaram para os irmãos e fizeram com quem repensassem o negócio. Por que não vender hortifruti em um lugar fechado?
Da Verona para o atacarejo
De novo, entrou um automóvel na história. Juntaram as economias e venderam uma Ford Verona para comprar um terreno em Tijucas, local onde abriram a primeira loja em 1994.
O espaço de 600 metros quadrados ficou grande demais para oferecer apenas hortaliças e frutas e os Koch foram introduzindo mais produtos, dando origem ao primeiro supermercado Super Koch.
Cinco anos depois, a segunda unidade, também em Tijucas. Com a consolidação, a primeira unidade fora da cidade foi em Camboriú e aos poucos novas unidades pipocaram em outras cidades no litoral norte do estado. Em 2015, o grupo tinha 11 supermercados, o centro de distribuição, lançado em 2014, e um faturamento de R$ 570 milhões.
Um ponto de virada para o estágio atual foi a entrada do grupo em 2016 no universo dos atacarejos, uma tendência em estados do sudeste à época e no qual a empresa entrou e surfou no sul do país.
Em 2016, o país estava mergulhado em crises econômica e política, que culminaram no impeachment da presidente Dilma Rousseff. O PIB (Produto Interno Bruto) encolheu 3,6% no ano, após recuo de 3,8% um ano antes.
E o modelo do atacarejo, com ofertas mais em conta para caber no combalido bolso dos consumidores, ganhou tração. No Grupo Koch, o formato chegou sob o nome de Komprão Koch Atacadista e a primeira unidade em Camboriú foi sucesso imediato.
O resultado rápido em faturamento fez com que o grupo Koch imprimisse um novo ritmo. “As primeiras lojas do atacarejo que nós abrimos começaram a vender muito bem e dar um resultado muito bom. Quando você entra em uma nova bandeira e começa a ter uma adesão muito boa do cliente, você tem a certeza que precisa fortalecer”, afirma.
75% do faturamento
Desde 2016, o grupo inaugurou outras 34 lojas Komprão, 10 delas no último ano. Na média, as unidades são construídas em espaços de 8 mil metros quadrados e têm 4 mil metros destinados à exposição de cerca de 8 mil itens à venda. O tíquete médio é de R$ 153, 82% superior ao registrado nas lojas do Super Koch.
Em faturamento, o atacarejo já representa 75% do negócio – ou 3,85 bilhões do valor contabilizado em 2022. O Supermercado Koch responde pelos 25% restantes e conta com 20 lojas.
Para financiar a expansão, os irmãos usam tanto capital próprio quanto fazem negociações em que o investidor constrói o espaço e a companhia assume a locação. Das 55 lojas atuais, pouco mais de 30 foram erguidas por terceiros. “O acordo é um percentual definido com base no valor investido”, conta o executivo. No passado, a companhia também recorreu a empréstimos, operação que evitou no ano passado e não está no radar para 2023.
O comportamento faz parte da cartilha que os irmãos seguem. “Quando está crescendo, você precisa cuidar, no mínimo, de três coisas: fluxo de caixa, rentabilidade e faturamento”, diz. A companhia trabalha com uma margem em torno de 20%, após dedução de impostos e o custo da mercadoria. A depender da situação financeira, decidem a via mais adequada para tracionar a abertura de novas unidades.
Para este ano, preveem a inauguração de, no mínimo, mais 8 lojas, quatro em cada semestre com investimentos acima dos R$ 100 milhões. O movimento vai marcar um novo momento na trajetória do grupo, rumo ao sul do estado com lojas em Garopaba e Imbituba.
“Nós estamos aumentando a nossa região de atuação para o sul do estado, uma região com o poder aquisitivo muito bom, que está crescendo e que vemos com bastante potencial”, diz. Segundo Koch, esses atributos são alguns dos que a empresa costuma observar no momento de decidir onde instalar as novas lojas. E ainda:
- Tamanho da população
- Quantidade de supermercados
- Quantidade de atacarejo
- PIB per capita
- Velocidade com que conseguem abrir o supermercado
Além da abertura de lojas, o Grupo Koch está investindo este ano em uma nova frente. Criou uma marca própria de alimentos, a exemplo do que varejistas nacionais como Grupo Pão de Açúcar e Carrefour já oferecem.
Com a BonTraz promete produtos com preços de 5% a 10% mais baratos em linhas como alimentos, higiene, baby e infantil, casa e lazer e PET. A unidade de negócios começou dois produtos derivados do açaí e deve chegar a dezembro com mais de 100 itens, todos com produção terceirizada.
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Qual a receita do grupo Koch para o crescimento
Nos últimos 10 anos, a menor taxa de crescimento registrada pelo grupo Koch foi em 2016, com 16%. E, desde 2018, a receita se mantém no patamar de alta acima dos 30%.
“Depois que entramos no Atacarejo, a gente conseguiu se organizar melhor e viu que tinha um potencial muito bom de vendas no modelo atacarejo como é até hoje”, afirma José Koch.
A receita, de acordo com ele, está baseada em cinco pilares que a companhia posicionou como estratégicos.
- Gestão de pessoas, uma equipe de 8 mil funcionários atualmente
- Crescimento com expansão
- Tecnologia para não ficar desatualizado em relação ao mercado
- Excelência operacional, com as lojas abastecidas, limpas e convidativas
- Competitividade comercial
Algumas dessas áreas, inclusive, estão sob responsabilidade de outros cofundadores de negócios. Albano e Antonio são diretores de expansão e de Recursos Humanos, respectivamente. Os outros dois, Geraldo e Sebastião, lideram a gestão do hortifruti e operacional do hortifruti nas lojas, respectivamente. Além disso, todos têm assento no conselho de administração.
Para Jean Rebetez, diretor-executivo da Gouvêa Consulting, o que se tira do sucesso dos irmãos Koch é como se mantêm unidos e, dentro de um modelo clássico de negócio, entregam resultado.
“O que tem, de fato, é uma boa gestão das pessoas, dos números e também uma parceria com os fornecedores, de conseguir boas negociações seja com a indústria local seja com os fornecedores de hortifrutigranjeiros, e o respeito pelo entorno”, afirma. “Isso tudo de forma muito eficiente, simples, com hierarquia mínima, umbigo no balcão e com os fundadores tocando a operação”.
Qual é o futuro do negócio
O grupo Koch não tem planos de sair do estado, e sim consolidar posições e avançar por outras áreas e regiões. Até 2025, pretende fincar bandeira em 40 cidades do estado, 14 a mais do que o número atual.
Os investimentos em curso são para pavimentar esta meta e, por isso, manter o crescimento em ritmo acelerado faz a diferença.Para este ano, a empresa projeta um crescimento de 31%, percentual que fará o negócio alcançar 7,2 bilhões em faturamento. O primeiro trimestre já trouxe um bom indicativo, com expansão 47% sobre o mesmo período do ano passado.
Embora não seja uma companhia de capital aberto, possibilidade que não está no cenário, deixa claro José Koch, a empresa adotou um caminho há 7 anos de ter auditoria, hoje feita pela PwC Brasil, aos moldes das companhias listadas em Bolsa.
Além de crescer no modelo tradicional com os supermercados e os atacarejos, a empresa tem oportunidade de explorar outros negócios. Um dos caminhos é o e-commerce, canal que gira em torno de 1% a 2%, bem abaixo de outras redes supermercadistas. No GPA, por exemplo, a fatia do comércio eletrônico ficou em 10% no balanço do quarto trimestre de 2022.
“A forma tradicional não é garantia de sucesso nos próximos 5 anos. Tem que estar atento a essas evoluções como um todo de comportamento de consumo, novos entrantes, novos players, principalmente no que tange o varejo digital”, afirma Rebetez.
Para o especialista, há ainda outras possibilidades no mercado sobre as quais grupos regionais como o Koch podem avançar. Entre elas:
- Lojas de proximidade
- Autonômas, no modelo honest market
- Dark store, formato que tem avançado em vários setores
Como uma estrutura familiar, esses novos desafios conversam bastante com a segunda geração do negócio, os dez filhos dos cinco irmãos. Oito deles já estão inseridos na operação.
Além de terem o potencial de oxigenar o negócio, os novatos representam também um desafio para a estrutura.
“Eu sempre falo nas reuniões familiares: a diferença salarial é muito pequena em relação ao valor que se cria ao longo do tempo: quanto valia a nossa barraca de hortifruti e quanto vale a nossa empresa hoje?”, afirma Koch. A analogia é uma maneira de mostrar o valor da união e evitar que confusões no meio do caminho dinamitem o futuro do negócio.
Quando a segunda geração começou a entrar na empresa, os sócios recorreram a consultorias externas para estruturar os próximos passos e construir trilhas de desenvolvimento. “A gente tem que trabalhar para que a gente se torne uma empresa longeva”, diz Koch. Com empresas de porte nacional flertando com os consumidores catarinenses, ter uma estrutura azeitada pode ser o diferencial para manter a história de sucesso da família.
Fonte: Exame