Para Alberto Serrentino, poucas empresas serão capazes de exponencializar seus negócios e ampliar seus negócios muito além do varejo
O varejo está passando por uma profunda transformação em todo o mundo. Essas mudanças estão levando o setor para um ambiente de competição ainda maior, que não envolverá mais somente empresas, e sim plataformas e ecossistemas inteiros. Embora essa seja uma agenda para poucos que podem ambicionar alcançar milhões de pessoas com um portfólio completo de soluções, todas as empresas precisarão aprender a se situar nesse novo mercado.
Em um webinar realizado durante a Semana de Moda e Cultura 2020, Alberto Serrentino, fundador da Varese Retail e vice-presidente da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC), conversou com Fabricio Garcia, vice-presidente Comercial e Operacional do Magazine Luiza, sobre os fatores de sucesso da transformação digital do varejo e as tendências do setor. A conversa, mediada por Carlos Ferreirinha, fundador da MCF Consultoria e especialista no mercado de luxo, pode ser vista na íntegra aqui.
Para Serrentino, a transformação digital do varejo não é uma agenda de tecnologia ou de e-commerce. “Esse é um equívoco comum, e um grande equívoco, porque a transformação é uma agenda de cultura e de pessoas”, diz. Essa mudança cultural, em que a empresa entende e adota novas formas de organizar processos, estruturas e pessoas, passa a orientar o negócio a pessoas e dados, que usam a tecnologia de forma estratégica para melhorar a relação com o cliente.
E varejistas orientadas a dados, quando são capazes de orquestrar a atuação de parceiros de negócios para entregar melhores respostas aos clientes, deixam de ser simplesmente varejistas. “Elas se transformam em um outro animal que é mais do que varejista: é uma empresa de tecnologia e de serviços que entrega soluções para os clientes, seja de que tipo for”, analisa Serrentino.
Esse é o “mapa da mina” que explica Alibaba, Tencent e Amazon. Ou mesmo o Magazine Luiza no Brasil. “Não é mais uma empresa de eletroeletrônicos, como era no passado. É uma empresa digital que tem mil lojas que, mais do que vender geladeira, funcionam como pontos de dados e relacionamento com o cliente”, explica.
O valor da cultura
Para Fabricio Garcia, vice-presidente Comercial e Operacional do Magazine Luiza, a cultura é um aspecto fundamental dessa transformação da empresa. “Somos desde sempre uma empresa muito inovadora. Uma startup de 63 anos”, comenta. Essa cultura de startup está baseada em alguns valores, como cuidar dos colaboradores e dos clientes em primeiro lugar, e cria uma forte identificação com quem tem fit com o negócio. “A cultura é incentivada até mesmo no bônus financeiro, porque somente criando uma cultura sólida é que conseguimos seguir adiante”, diz o executivo.
Valores culturais sólidos também evitam armadilhas no caminho. No ano 2000, por exemplo, a empresa resistiu a fazer um spin off de seu e-commerce (o que era a moda naquele momento), pois acreditava que era preciso ser genuinamente multicanal. “Isso nos ajudou muito a, 15 anos depois, conseguir virar a empresa de uma mentalidade ainda analógica para uma digital. Foi difícil fazer o cara na loja entender que também iria vender pelo e-commerce e que aquilo seria positivo para ele, porque era o melhor para o cliente. Se a obsessão pelo cliente não estivesse na nossa cultura, seria impossível”, explica Garcia.
Para ele, somente empresas com estratégia clara, bem executada e baseada em propósito, terão sucesso. “Digitalizar a empresa é criar um novo mindset, o que é difícil, depende de muita comunicação e uma imensa capacidade de execução. Não tem ROI para isso, é um processo que começa e não termina nunca, mas transforma todo o negócio”, afirma. E esse processo começa na liderança. “Para funcionar, a agenda de transformação precisa ser estratégica, de cima para baixo. Não tem business case para isso, não tem ROI: é um ato de fé, e só acontece quando quem está lá em cima acredita e impulsiona a mudança”, acrescenta Serrentino.
O passo seguinte dessa evolução é construir ecossistemas a partir dos marketplaces. Quando os marketplaces deixam de ser a cauda longa do negócio e passam a ser vistos como uma maneira de atender o cliente onde e como ele precisar, eles transformam o varejo. “É o modelo dos grandes players chineses e é a agenda futura da Amazon e do Google”, diz o vice-presidente da SBVC. “Em vez de ser um negócio que gravita em torno do varejo, o ecossistema passa a ser um negócio diversificado, que cresce onde o cliente mostra oportunidades, mas com muita tecnologia embarcada e inteligência na aplicação de recursos”, avalia.
Existem, porém, várias barreiras para chegar a esse grau de sofisticação. “É preciso ter escala de negócios, tecnologia, capacidade de avançar em outros negócios sem se perder, e principalmente a visão de querer ser, de fato, uma empresa de serviços que se desgarra de seu caminho de origem para se tornar algo muito maior”, explica Serrentino. E isso transforma o mercado.
“Quem virar ecossistema terá uma imensa capacidade de crescer seu negócio exponencialmente. Quem não virar precisará aprender a lidar com esses players, que irão concentrar o mercado. Quem não fizer, de alguma forma, parte desse modelo terá limitação em alcançar o cliente e vai ter que se relacionar com os ecossistemas, pois eles irão concentrar o conhecimento e os dados sobre os consumidores”, finaliza Serrentino.
Fonte: SBVC