À frente da Magalu, rede varejista mais inovadora do País, Frederico Trajano venceu uma acirrada disputa pelo controle da Netshoes, elevou o faturamento anual para mais de R$ 25 bilhões e viu as ações da companhia atingirem um recorde de valorização. Seu desafio agora é “digitalizar milhares de companhias em dezenas de setores”
MANDATO DIGITAL – Ao assumir o comando do Magazine Luiza, Frederico Trajano teve a missão de digitalizar a companhia sem perder o calor humano que está em seu DNA. Hoje, 48% das vendas é pelo e-commerce (Crédito: Claudio Gatti)
O ano de 2019 chega ao fim com uma lista de conquistas simbólicas para o Magazine Luiza – ou Magalu, como a direção da rede varejista mais inovadora do País agora prefere que ela seja chamada. Entre as realizações está a inauguração da milésima loja física (número que hoje chega a 1034), a entrada em novos estados e uma valorização recorde da companhia da bolsa de valores. O cenário atual é bem diferente – e muito mais promissor – daquele que se apresentava diante de Frederico Trajano em janeiro de 2016, quando ele assumiu a presidência da companhia fundada por sua família em Franca, no interior de São Paulo, quase 60 anos antes, em 1957.
“O ano de 2014 havia sido o melhor da companhia até então, mas o ciclo de 2015 representou uma queda abrupta. Houve uma inversão de ciclo econômico muito aguda durante aquele período do governo Dilma, como o Joaquim Levy dobrando a taxa Selic de 7% para 14%. O resultado foi uma queda enorme da receita, em virtude da desaceleração, enquanto nosso custo financeiro dobrou por conta da alta dos juros”, relembra Frederico. Em um ano, a empresa saiu do lucro para o prejuízo. “Nunca estivemos para quebrar, como as pessoas diziam naquela época, mas era uma situação absolutamente desconfortável, sobretudo para uma empresa que sempre foi muito voltada para o crescimento”. Àquela altura, o mercado avaliava o Magazine Luiza em R$ 200 milhões. Hoje, a rede vale R$ 72 bilhões.
Prestes a completar seu quarto ano como presidente da empresa, Frederico Trajano, agora com 44 anos, brinca que a melhor oferta de Black Friday de 2015 era a ação do Magazine Luiza. A cotação, que chegou a apenas R$ 1,00 por ação, estava, na opinião dele, artificialmente depreciada. Na quinta-feira passada, dia 28 de novembro, o papel MGLU3 abriu o pregão da B3 cotado a R$ 45,33. Nesse período, nada se compara a tamanha valorização. Encerrado uma semana antes, o follow on (termo do mercado para a oferta subsequente de ações) havia gerado R$ 4,3 bilhões. Com mais de 30 mil colaboradores, a empresa faturou cerca de R$ 25 bilhões nos últimos 12 meses.
Vários fatores contribuíram para sair daquela situação “desconfortável” para a atual liderança do setor. “No meu primeiro ano a prioridade era ‘arrumar a casa’. A empresa era boa, o time era bom, mas o resultado não estava bom. Fizemos renegociações que injetaram capital, iniciamos o orçamento base zero e enxugamos custos de forma estruturada. A gente não era bom para controlar despesas”, admite Frederico. Paralelamente aos cortes foram implementadas outras decisões que permitiram sanear as finanças. “Melhoramos a geração de caixa, o capital de giro, conseguimos desalavancar o balanço, captamos dinheiro no mercado de ações e aumentamos as vendas”.
Entre os fatores decisivos para essa jornada de crescimento até o resultado atual, contudo, o grande destaque foi a aposta de Frederico Trajano no e-commerce, que ele havia iniciado ainda no ano 2000. “Até então, era um tesouro escondido. Com o meu mandato, veio a responsabilidade de digitalizar na companhia. Além de focar na venda, a gente radicalizou no investimento em inovação”. O resultado dessa estratégia pode ser medido em um número: há 11 trimestres o e-commerce da empresa cresce 50% na comparação com o mesmo período do ano anterior. Hoje, 48% do faturamento vem do ambiente digital. “Esse processo de digitalização chamou muito a atenção do mercado”, diz Frederico. “Quando há excesso de liquidez no mercado, mesmo as empresas de e-commerce puro que não têm bons modelos de negócio e não são rentáveis, conseguem sobreviver com novas emissões de capital. Quando seca a liquidez, só as empresas realmente boas sobrevivem. A gente conseguiu mostrar que o nosso modelo de negócio multicanal era muito melhor do que as empresas que era só digitais ou só tinham lojas físicas”. Tudo isso mantendo a motivação dos vendedores. O Magazine Luiza sempre esteve entre as dez melhores empresas para se trabalhar no Brasil – e este ano voltou a ser a melhor do varejo segundo o ranking Great Places to Work.
Em outro ranking, das marcas mais valiosas do País, elaborado pela consultoria Kantar e divulgado pela DINHEIRO, o Magazine Luiza foi a empresa que mais avançou nos últimos dois anos. Em 2017, ocupava a 41ª posição. Este ano, saltou para a sétima, um crescimento de 776% em valor de marca. Nesse aspecto pesa o nível de satisfação do cliente, outro item que sempre esteve no DNA da empresa e que se mantém na gestão de Frederico. “A gente encerrou o ciclo de digitalização muito rápido. A previsão de chegar a 50% do faturamento no digital se cumpriu antes do previsto. E agora? Qual seria a ambição da companhia? Então no ano passado eu fui à China visitar empresas como Alibaba, que nasceram digitais”.
Uma das lições aprendidas foi a necessidade de ampliar as categorias de produtos. Enquanto a penetração do e-commerce no Brasil é baixa, 7%. Na China, está chegando a 30%. E a grande diferença está nas categorias: aqui, 70% do e-commerce é de eltroeletrônicos. “Se não tivermos impacto em outras categorias, não vamos ajudar o Brasil a se digitalizar. O que eu pretendo é digitalizar não apenas um CNPJ, mas milhares de companhias em dezenas de setores”, afirma o Empreendedor do Ano 2019 da DINHEIRO.
“Minha busca de potencializar o ser humano através da tecnologia é incessante”
Uma das inovações mais perceptíveis da digitalização da empresa foi a Lu, a assistente virtual do Magazine Luiza. Como ela nasceu?
Um dos principais equívocos de uma agenda de inovação é jogar o legado fora. A Lu foi criada para potencializar um legado da companhia, que é o calor humano. Quando montei a internet da empresa eu queria trazer para o ambiente virtual a proximidade do vendedor com o cliente na loja. Eu gosto de ser “hi tech” e “hi touch”: ter um lado tecnológico forte sem perder o humano, que o brasileiro gosta tanto. As redes sociais são o que há de mais forte na internet no Brasil. Elas potencializam as relações humanas, as conexões emocionais. A Lu é uma vendedora virtual que responde em primeira pessoa aos clientes. Ela representa os valores da companhia.
Vocês também foram pioneiros no “social commerce”, com venda direta pelas redes sociais. Qual o resultado dessa iniciativa?
Foi o primeiro projeto do LuizaLabs. Uma plataforma em que qualquer pessoa pudesse montar sua loja on-line e integrá-la com as redes sociais e vender para os amigos. Nenhum algoritmo entende melhor o gosto de um consumidor do que quem o conhece de verdade. Hoje nós temos mais de 300 mil pessoas que vendem produtos pelo Magazine Você e ganham comissão por isso. Assim como a Lu, ele nasceu da minha busca incessante de potencializar o ser humano através da tecnologia.
Por que a aquisição da Netshoes era tão estratégica para o Magazine Luiza?
Depois de digitalizar uma empresa de varejo tradicional de eletroeletrônicos, o próximo passo, para mim, era entrar no segmento de vestuário, moda, artigos esportivos. Lançar essa categoria no Magazine Luiza levaria muito tempo. Por isso optamos por adquirir o maior e-commerce de vestuário da América Latina que é a Netshoes, uma marca forte, com 18 anos de mercado, consolidada e que tem a marca Zatini. Era a melhor oportunidade de mercado. O único problema dela era fácil de resolver: o custo operacional, que com a nossa escala e retaguarda podemos reduzir. Com a multicanalidade, o custo de entrega também diminui automaticamente.
O que vem pela frente?
A gente quer ser “one stop shop”, vender de tudo no mesmo lugar: livros, produtos para bebês, para pets, bens de consumo. Vários desses itens já estamos vendendo. E outros virão. A nossa hashtag agora é “temnomagalu”.
Fonte: IstoÉ Dinheiro