A pandemia, que obrigou a população do mundo inteiro a fazer mais compras pela internet em função das medidas de isolamento, transformou o e-commerce Mercado Livre, que já era uma das empresas mais valiosas da América Latina, em um titã regional. Do início da crise da covid-19, em março, até agora, o valor de mercado da companhia, listada desde 2007 na bolsa americana Nasdaq, saltou de US$ 27 bilhões (R$ 145 bilhões) para quase US$ 77 bilhões (R$ 415 bilhões), uma alta de 185%.
O feito levou o marketplace a ultrapassar nomes tradicionais da economia brasileira em valor de mercado, como Petrobrás e todos os grandes bancos. A empresa chegou até mesmo a ultrapassar a Vale e ficar, momentaneamente, na primeira colocação das mais valiosas da região. Considerada por analistas de mercado como a grande competidora latina das gigantes globais Amazon e Alibaba, a empresa se prepara agora para um novo salto: começar a vender alimentos frescos e ingressar no disputado nicho de delivery de restaurantes.
Os números da empresa, que tem sede na Argentina, são superlativos. De janeiro a setembro do ano passado, o total de usuários únicos ativos na plataforma dobrou para 112,5 milhões. O volume de vendas foi a US$ 14,36 bilhões, um aumento de 42% em relação ao mesmo período do ano anterior. O forte crescimento não passou despercebido pelos investidores, que passaram 2020 buscando investimentos em empresas de tecnologia com elevado ritmo de expansão: em todo o ano, a ação da companhia avançou de US$ 550 para US$ 1,7 mil.
Futuro adiantado
Produtos frescos
Para comprovar o aumento da eficiência da entrega, a empresa programa para o início deste ano o lançamento de uma nova frente: a venda de produtos perecíveis, incluindo delivery de restaurantes. Hoje, os produtos de limpeza e alimentos secos, como arroz e feijão, já estão disponíveis.
O crescimento que veio com a pandemia também alavancou outro negócio da empresa, a sua fintech Mercado Pago. Foram cerca de sete milhões de novas contas abertas na esteira do auxílio emergencial, medida do governo para mitigar os efeitos da crise nas famílias que tiveram a renda mais afetada. O crescimento ocorreu, ainda, em um momento em que a concorrência no setor bancário se acirrou. “Há muitos desbancarizados e sub-bancarizados no Brasil”, comenta o vice-presidente do Mercado Pago, Túlio Oliveira.
“Temos uma visão de longo prazo e sempre acreditamos nessa tese de que a tecnologia iria mudar a vida das pessoas. Essa mesma lógica nós estendemos para serviços financeiros”, afirma Tolda.
Em relatório recente, o banco norte-americano Goldman Sachs afirmou que o Mercado Livre continua sendo uma das principais opções no comércio eletrônico latino-americano. “Vemos a empresa não apenas alavancando com sucesso as mudanças de comportamento do consumidor impulsionadas pela pandemia, mas também executando de forma consistente uma agenda micro que abrange áreas estratégicas como logística, seleção, preços, experiência do usuário e curso de serviços financeiros”, diz o documento, assinado pelos analistas Irma Sgarz, Thiago Bortolucci e Chandru Ravikumar.
Sala de aula
A ideia da criação do Mercado Livre surgiu nas salas de aula na Universidade Stanford, no Vale do Silício, na Califórnia, mesmo berço do Google. Foi ali que nasceu o projeto, em 1999, quando o brasileiro Stelleo Tolda e o argentino Marcos Galperin, cofundadores da empresa, ouviram de seus colegas que uma empresa, inspirada na americana Ebay, que tinha sido lançada cinco anos antes e que tinha de abrir seu capital, não teria sucesso ao ser replicada na América Latina. “Todos eram céticos, mas a gente sempre teve muita confiança sobre a viabilidade do negócio”, afirma Tolda.
A empresa nasceu como qualquer startup que precisa, do zero, colocar o negócio de pé. Depois que terminou o curso, Galperin voltou a Buenos Aires, onde lançou oficialmente o “Mercado Libre”, na garagem do subsolo de um edifício – estrutura que foi replicada como comemoração do aniversário de 20 anos da companhia.
No início, começaram a ofertar artigos usados de familiares e amigos. Depois, Tolda conta que passou pessoalmente a visitar lojistas. Em uma dessas ocasiões, com uma máquina fotográfica na mão – uma Sony Malvica, que tinha um compartimento para um disquete, o que permitia na época a transferência mais rápida das fotos para o computador – foi até a rua Teodoro Sampaio, tradicional polo da capital paulista de venda de instrumentos musicais. De loja em loja, falava com os proprietários e tirava foto dos instrumentos para inserir na plataforma. Naquele momento era gratuito ao lojista, algo que foi mantido por um ano.
Rapidamente, o negócio foi ganhando escala. Como consequência, já no início da empreitada, o Mercado Livre comprou três de seus concorrentes diretos. Ibazar, Lokau e Arremate – o último terminou de ser 100% adquirido em 2007. “Essas empresas eram concorrentes diretos. Ajudou a dar escala na base de usuários e clientes”, conta Tolda. Hoje em dia, o Mercado Livre não é conhecido por grandes movimentos de fusões e aquisições, e cresce – e muito – organicamente. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Fonte: IstoÉ Dinheiro