Participando de um evento promovido pela Avon, em Nova York, na última semana (a marca de beleza anunciou a descoberta de uma molécula – protinol – que promete revolucionar o futuro da categoria de skincare), a carismática e provocativa pesquisadora de tendências Faith Popcorn compartilhou suas visões para o mundo em diversos aspectos para 2035.
A primeira grande mensagem da fundadora da consultoria BrainReserve, no entanto, é a de que todos devem lembrar que “o futuro começa agora” e tratou do que ele será daqui a quinze anos, considerando cinco forças determinantes da sociedade: epidemia de ansiedade, mistura de gêneros, N of 1, Super Humanos e LiteLife. O objetivo, ressalta Faith, é sempre fazer as pessoas se questionarem, ao saber como será o futuro, sobre o que podem fazer de diferente hoje e, consequentemente, onde investir seu tempo, dinheiro e esforços.
Usando o que chama de “futurismo aplicado”, um método de pintar as variadas e paradoxais paisagens do futuro para marcas e negócios, afirma conseguir 95% de assertividade. “Temos 17 lentes por meio das quais vocês podem olhar e ver o que vai acontecer”, disse.
Usou o exemplo de uma delas “cooconing” (casulo), detectada ainda em 1981 e apontando que as pessoas passariam mais tempo em casa. A IBM foi até ela para saber no que aquilo poderia ser interessante à empresa e a resposta era que as pessoas trabalhariam mais no ambiente doméstico. Como consequência, segundo Faith, a empresa foi a primeira a desenvolver um computador de uso pessoal. Outro resultado da tendência “cooconing” foi a questão dos serviços de delivery, com as pessoas reduzindo suas idas a supermercados e outros tipos de varejo. Por outro lado, o delivery e a customização entrariam em alta. Segundo ela, o recado foi dado ainda na década de 1980 a alguns dos maiores anunciantes do mundo, a quem ela recomendou esquecer o Walmart e as lojas de departamento, pois as pessoas passariam a comprar tudo a partir de suas próprias casas. “E sabe o que a P&G e a Unilever disseram? Hahaha, isso não vai acontecer. E nós dissemos: Hohoho, sim, vai”, comentou Faith.
A pesquisadora aponta que é difícil realmente para grandes empresas enxergarem o futuro, porque é algo que muitas vezes empurra para escanteio seus modelos atuais de negócio. Algo semelhante ocorreu quando foram dizer ao Home Depot que as novas gerações não iriam se importar tanto em comprar uma casa, mas sim alugar.
Para exemplificar as cinco forças que citou inicialmente na palestra, Faith apresentou uma personagem, Jessica, como uma mulher de 2035. Segundo a descrição, ela não possui uma casa e nem pensa em ter uma carreira em uma única companhia, flutuando livremente por economias compartilhadas. Num ambiente em que IA, apps e robôs se anteciparão às necessidades dos humanos, ela defende a fluidez e ausência de fricção, ou seja, “seamless is the new black”.
A questão de gênero perderá sua definição binária e uma nova fluidez, também no que diz respeito a esse assunto irá surgir. Num mundo mais caótico, valores voltam a ganhar terreno, como a proteção do planeta, atrelada à cobrança de que as marcas também abracem essa responsabilidade. Por outro lado, muitas mudanças representam muito stress, logo, outra característica será a busca das pessoas por alívio.
Com tudo isso, uma mulher moderna, como Jessica, 37 anos, seria alguém que: é solteira, comanda a TravelX (uma agência de viagem em realidade virtual) e criou a Oceania, uma incubadora de projetos para limpar os oceanos. Jessica não tem tempo para a maternidade (mas congelou seus óvulos, por via das dúvidas) e adora meditação, assim como o consumo de micro doses de substâncias químicas – doses testadas no limite de efeitos positivos e livres de alguns julgamentos morais contemporâneos.
Retomando as cinco forças, Faith Popcorn, citou dados de que hoje já vivemos uma situação de stress global, com 18% mais casos de depressão (as mulheres têm 50% mais chances de desenvolver a condição) e 15% de ansiedade na última década, atingindo 600 milhões de pessoas. Também mencionou previsão da Universidade de Oxford, segundo a qual 47% dos trabalhos serão substituídos por robôs, até 2036. Mas não é só o trabalho, mas também a situação do planeta ameaçado que aumentam essa ansiedade.
Para a questão de gênero, Faith trouxe dados de que 35% das pessoas da geração Z já conhecem alguém que se define como uma pessoa “não binária” e que 20% dos millenials se definem como de gênero fluido. Lembrou também que o Facebook, no Reino Unido, tem 71 opções para as pessoas descreverem seu gênero. Também citou exemplos de marcas como a australiana Mr. Smith, que a despeito do nome tem produtos de gênero neutro para cabelos, e a britânica Jecca, de maquiagem unissex.
Já no que diz respeito à hiper personalização (N of 1), ela destacou o fato de que o sistema de identificação digital biométrica da Índia irá cobrir 90% da população daquele país (que é, atualmente, de 1,37 bilhão de pessoas) em cinco anos. Além disso, um plano nutricional e de estilo de vida personalizado com base em características genéticas deverá atingir um bilhão de consumidores até 2025, no Reino Unido.
A tecnologia dos dados associada à tendência de antecipar tudo por meio de IA e machine learning criarão uma experiência descrita como “seamless”. A base para esse futuro já está em construção: metade dos lares norte-americanos já são membros da Amazon Prime; em 2025, a chinesa Cloud Minds irá lançar uma empregada doméstica robótica “full service” (ou seja, algo que promete ir além daquele aspirador de pó redondo engraçadinho); e a Moby-Mart, também na China, já oferece a experiência de um supermercado móvel (autônomo, claro), carregado com energia solar e no qual o cliente faz autoatendimento. Nesse caminho, a interação entre o ser humano e as máquinas/substâncias químicas será mais normal. A ascensão dos cyborgs – ou super humanos – deve começar com coisas como um exoesqueleto para aumentar a força humana em determinadas atividades ou o uso de micro-doses de coisas como LSD para elevar criatividade e foco. Finalmente, num mundo em que grande parte das atividades humanas poderá ser substituída por robôs, abre-se espaço para o que Faith Popcorn descreve como a “lite life”, ou a vida mais leve, uma espécie de abdicação de qualquer tipo de responsabilidade para uma vida sem ônus. Alguns acampamentos de verão para adultos começam a se tornar populares (esse é o tipo de programa comum, hoje, para crianças e adolescentes na cultura americana). Outros indicadores apontados: 25% de homens e 15% das mulheres solteiros aos 50 anos de idade (sem contar que muita gente já tem optado conscientemente por não ter filhos). O desapego também já vem sendo uma característica marcante das novas gerações: 78% dos millenials contra 59% dos baby boomers são mais inclinados a pagar por uma experiência do que pela posse de bens materiais.
Fonte: Meio e Mensagem