Com a crise, o plano comercial ficou fora do radar do varejo e da indústria. Devido à necessidade de buscar resultados pontuais, as promoções ganharam atenção nas negociações. Mas esse cenário começou a mudar no ano passado. Estudo da consultoria Advantage, com 100 supermercados e 107 fornecedores, divulgada no final de 2017, constatou que o plano comercial voltou ao roll de prioridades de ambos. Para o varejo, foi o 7º- colocado no ranking de prioridades. Já entre as indústrias, ficou em 6º. No estudo anterior, era o 10º colocado.
Segundo Rodrigo Catani, consultor especialista em eficiência operacional da consultoria AGR, apesar dos benefícios, a ferramenta é deixada de lado, sobretudo em momentos de dificuldade, porque muitos varejistas consideram sua implementação trabalhosa e seu retorno, lento. Por essa razão, ela acaba sendo postergada. Já Romualdo Teixeira, CEO da RTC Brasil, acrescenta que os gestores não costumam trabalhar com planejamento de longo prazo. Eles têm o hábito de, no dia a dia, agir primeiro e pensar depois. A minoria analisa o futuro, o que também dificulta a adesão ao plano anual. Por fim, outra dificuldade é que, em muitas empresas, o relacionamento com o fornecedor ainda é transacional, o que também emperra o planejamento comercial conjunto.
Agora, com o consumo em recuperação, o varejista começa a entender a necessidade de voltar a rentabilizar o negócio, que foi bastante prejudicado pelo excesso de ofertas nos últimos anos. Como o plano de negócios ajuda a elevar o lucro e o capital de giro, voltou a ser considerado algo prioritário. Além disso, dizem os consultores, os varejistas começam a sentir o impacto nos negócios da chegada dos gigantes nos bairros. Soma-se a isso os custos altos da operação. “Tudo isso tem preocupado os empresários e levado a uma mudança de cultura. Eles começam a perceber que não há mais espaço para amadorismo ou o famoso ‘jeitinho’ do passado”, destaca Teixeira. É preciso usar inteligência para traçar novas estratégias e desenvolver uma relação de ganha-ganha, parceria e transparência com a indústria.
Alexandre Ribeiro, diretor da R-Dias Consultoria de Varejo, cita o exemplo de um varejista que conseguiu aumentar a lucratividade e elevar o fluxo de capital do negócio ao implementar o plano comercial anual. Antes, a área de compras acreditava que adquirir grandes volumes compensava as perdas com produtos parados no depósito, sem giro. De acordo com Ribeiro, quando a consultoria iniciou seu trabalho, o estoque era tão alto e fora da realidade que, com o dinheiro parado, era possível abrir duas novas lojas. “Paralelamente, a rede sacrificava capital de giro para manter as filiais abastecidas e ainda queimava margem para não ter quebras. Também sofria com ruptura em várias categorias”, conta o especialista. Com a implementação do plano anual, esse cenário foi revertido, com as margens voltando a crescer. “O cliente também deixou de trabalhar com fornecedores que não estavam interessados numa relação colaborativa e que apresentavam prejuízo”, diz Ribeiro. Para usufruir dos benefícios da ferramenta, é preciso desenvolver novas habilidades nas equipes e novos processos. Varejo e indústria devem ainda se desarmar, ouvir um ao outro, ser flexíveis e buscar soluções conjuntas.
Veja a seguir um passo a passo para montar um plano comercial assertivo e os erros que devem ser evitados
1- Rever cultura interna
Um plano comercial envolve compartilhamento de informações com a indústria. “Se a loja não estiver disposta, essa iniciativa não surtirá efeito”, explica Alexandre Ribeiro, da R-Dias. Além disso, muitas vezes o comercial acaba não conseguindo implementar a ferramenta por falta de tempo dos compradores. “Daí a importância de, primeiramente, rever as atividades da equipe a fim de otimizar processos de rotina, saber o que pode ser direcionado a outras áreas, analisar novas contratações e, assim, desafogar o pessoal”, diz Rodrigo Catani, da consultoria AGR. Também é importante considerar a necessidade de capacitar o time comercial para se tornar mais analítico.
2- Levantar resultados de vendas das categorias, a performance delas no mercado, analisar indicadores e cenário econômico, o comportamento do consumidor e considerar a proposta da rede. “É a partir dessas informações que o varejista identifica as categorias mais estratégicas, ou seja, aquelas ainda pouco trabalhadas, mas que têm potencial para crescer com base na proposta da loja”, observa Ribeiro, da R-Dias Assessoria de Varejo.
3- Estabelecer objetivos.
Segundo Catani, da AGR, com uma equipe multidisciplinar (comercial, gerência de loja e de seção, além de logística, financeiro e marketing), deve-se discutir o que pode ser feito para melhorar os resultados de cada categoria listada.
4- Focar o plano em verbas e volume de vendas é persistir no erro.
Um bom plano costuma envolver ajuste de mix, implantação de GC, planograma e ações de marketing. “Também passa por avaliar novos formatos de entrega, presença de mais promotores, controle de quebra e ruptura, além de analisar como evitar dinheiro parado em estoque e excesso de uso de capital de giro para comprar mercadorias”, afirma Ribeiro. O plano, além de melhorar a margem, também contribui para uma maior integração com a indústria.
5- Avaliar as marcas das categorias escolhidas e seus fornecedores.
Considerar a performance dos produtos e da indústria na loja e comparar com o mercado é outro ponto importante. Deve-se ainda pesquisar como os concorrentes trabalham em cada categoria. Após essa análise, o varejista consegue definir os principais parceiros para o plano comercial. “Os estratégicos são os que estão dispostos a colaborar e cujos produtos podem ser melhor desenvolvidos”, afirma Romualdo Teixeira, CEO da RTC Brasil.
6- Fazer aos poucos.
“Um equívoco do varejo é acreditar que um bom plano comercial deve ser feito de uma vez só com todas as categorias selecionadas e com todos os fornecedores da loja. O ideal é estabelecer as categorias prioritárias, fazer um piloto e, aos poucos, estender para as demais filiais com as correções e adaptações necessárias”, diz o consultor Alexandre Ribeiro, da R-Dias.
7- Propor o plano.
Munidos de informações da loja, do mercado, da concorrência, além dos objetivos traçados, é hora de propor o plano para o fornecedor. É comum que a ferramenta não seja aceita inicialmente. “É nesse momento que começa a negociação. Ela precisa ser transparente e flexível e priorizar resultados saudáveis e de longo prazo”, observa Teixeira, da RTC. Segundo ele, não pode haver imposições de nenhum dos lados. Tudo precisa ser definido de comum acordo. É preciso deixar de lado a negociação de curto prazo, focada em verba e volume de compras.
8- Fazer um plano de comunicação.
De acordo com Catani, da consultoria AGR, com o plano já definido pelas duas partes e o contratato assinado, é hora de comunicar todas as áreas envolvidas sobre o que foi acordado e qual será a tarefa de cada uma.
9- definir como implementar a ferramenta.
Depois de ter definido o calendário com os fornecedores, cada colaborador deverá saber exatamente o que fazer, em que momento, quais são as metas e como alcançá-las. “Vale lembrar que os objetivos definidos devem ser bons para os dois lados, ambiciosos e factíveis”, diz Catani, da AGR.
10- Acompanhar o plano.
O acompanhamento deve ser mensal, com análises mais profundas realizadas trimestralmente. É importante saber se as ações estão apresentando os resultados definidos com o fornecedor. “Caso contrário, correções poderão ser realizadas. Por isso, também é importante que o plano não seja engessado”, alerta Teixeira, da consultoria RTC.
11- Revisão anual.
Ao final do período, é preciso analisar os resultados e começar a definir o que será feito no ano seguinte. Deve-se avaliar se o trabalho conjunto será mantido e se o desenvolvimento das categorias será aprofundado. Também é o momento de buscar novos parceiros e definr outras categorias para serem trabalhadas, entre outras iniciativas.
Principais benefícios do plano comercial
- Antecipa tendências, permite prever dificuldades e resolvê-las antes de gerarem prejuízos
- Contribui para identificar fornecedores que não estão dispostos a trabalhar em conjunto
- Permite desenvolver novos parceiros
- Ajuda a otimizar tempo dos compradores
- Permite usar de forma mais analítica os dados internos
- Traz mais e melhores argumentos para negociar de forma mais estratégica com fornecedores
- Ajuda a definir um mix mais assertivo
- Permite otimizar uso do capital de giro
- Torna as campanhas de marketing mais assertivas
- Diminui a ruptura e as quebras
- Aumenta a margem de lucro
- Eleva volume de vendas
- Melhora execução no PDV
- Faz o lucro líquido crescer
- Reduz volume de dinheiro parado com excesso de estoque
- Diminui importância das verbas para o negócio
- Conquista resultados duradouros
Fonte: Supermercado Moderno