Desde que anunciou a intenção de separar sua unidade de atacarejo Assaí e listá-la em bolsa, o GPA, dono também das redes Pão de Açúcar e Extra, viu suas ações valorizarem 21% na B3. A reação em apenas uma semana reflete um planejamento que a varejista começou há pelo menos sete meses, assessorada por três bancos e quatro escritórios de advocacia. A ideia de destravar valor no grupo, em que se baseia o plano de listagem do Assaí, não é recente – mas não tinha reunido tantas condições favoráveis até agora, no entendimento do conselho da companhia.
Por um lado, há a combinação da expansão contínua e acelerada do Assaí com a demanda aquecida no mercado de capitais por novas companhias e especificamente por teses de crescimento. Por outro, ainda que demonstre desafio de crescer nas lojas físicas, o Pão de Açúcar começa a exibir mais resultados em estratégias digitais, potencial que o atacarejo não tem e que ajuda a não deixar o GPA com um futuro esvaziado após a cisão. Adiciona-se a isso um acionista majoritário endividado e ansioso por valorizar seus ativos e ampliar suas opções de saída, caso do francês Casino.
Após o comunicado do GPA, analistas de casas como Safra, Itaú, Credit Suisse, XP e Bank of America fizeram suas contas e apontaram em relatórios valores desde R$ 16,6 bilhões a R$ 27 bilhões para o Assaí sozinho. Mas alguns mostraram certo ceticismo sobre a tese de destravar valor tão alto, já que o GPA detalha os números do atacarejo em seu balanço e em suas reuniões com analistas e investidores – assim, se há todo esse valor, ele já deveria estar no preço. A avaliação do GPA e dos assessores é que o investidor sabe de fato os números, mas hoje precisa levar o combo se quiser o papel. “Hoje o investidor tem que levar um negócio mais maduro e de menor crescimento, que é o GPA, enquanto o que tem apelo de venda em bolsa são as teses de crescimento acelerado”, diz um executivo próximo ao grupo.
Já no GPA, o interesse do investidor se voltaria para a agenda de revitalização de lojas e, principalmente, para a estratégia digital. “É uma agenda que está andando bem. O grupo quase triplicou a venda digital, que já é quase 6% do total, sendo que só a bandeira Pão já está 15%, que é muito relevante. A integração com o James também é um ativo importante”, diz Alberto Serrentino, diretor da consultoria Varese Retail. O grupo Éxito, que reúne as operações em outros países da América Latina e fica hoje sob o Assaí na estrutura societária, passará a ser subsidiária direta do GPA.
Analistas e gestores ouvidos pelo Valor ponderam que, do lado do risco, está o fato de o histórico de cisões comandadas pelo Casino e GPA no Brasil não ser exatamente bem-sucedido. Eles se referem à Via Varejo, que demandou cisão do site Extra e do Ponto Frio do GPA, e Cnova, que era a separação nessa empresa do comércio eletrônico – a primeira acabou sendo vendida e a segunda reintegrada à empresa de origem anos antes. Ambas tiveram que driblar prejuízo e lidar com perdas por falhas em controles internos e fraudes contábeis. Do lado de governança, outra transação societária também levantou críticas – quando o Casino vendeu suas ações no GPA para a Éxito, em 2015.
“No aspecto operacional, o Assaí tem vantagem. Diferentemente das cisões anteriores e também das segregações feitas por outros grupos brasileiros, não há vínculo operacional, como contratos de fornecimento ou prestação de serviços”, diz um gestor de ações. Esse vínculo contratual e operacional ocorreu, por exemplo, nas cisões feitas por Gol e Latam de seus programas de milhagem e na separação do BB Seguridade e Banco do Brasil. No Assaí, a estrutura é segregada. “Não há perda de sinergia porque a grande virtude do Assai, assim como do Atacadão (que pertence ao Carrefour), é a sua independência. O modelo e a operação foram preservados, inclusive com lideranças diferentes”, diz Serrentino.
O grupo ressalta também a eliminação de efeitos de holding. “O efeito é basicamente simplificação e melhor governança. É o que permitirá mais agilidade na tomada de decisão de cada negócio, não tendo um nível intermediário. As duas sociedades terão o seu próprio conselho de administração e passarão a ter um relacionamento direto com o mercado.”
No segundo trimestre, o GPA somou receita bruta de R$ 22,9 bilhões, alta de 61,1% nas vendas totais. A operação brasileira somou R$ 17,1 bilhões, sendo 53% do Assaí. Em 2019, o grupo somou R$ 61,5 bilhões em receita.
Fonte: Valor Econômico