Na expansão, a rede busca cidades que, além de atender ao alvo de número de habitantes, tenham concentração de renda e poder de compra
Por Talita Ferrari
Exatamente por perceber essa tendência de descentralização, a C&A já tinha, antes da pandemia, um plano de expansão orientado a cidades menores. Em 2021, na execução desse plano, a empresa abriu 25 novas lojas focadas em cidades de 100 mil a 500 mil habitantes.
Para Ciro Neto, diretor de operações da C&A Brasil, um fator importante de mudança para regiões menos centrais é a possibilidade de estar mais próximo do cliente para fazer uma operação de e-commerce integrada com a experiência física. Assim, além de ter a loja como centro de distribuição para pedidos online locais, o cliente tem contato direto com a marca e amplia seus canais de compra, o que tem se mostrado mais valioso para as redes de varejo no longo prazo.
A lógica é que quanto maior a variedade de canais pela qual o cliente compra e se relaciona com a rede, mais ele gasta nela durante a sua vida. Nas lojas da C&A, aliás, há espaços para criação de conteúdo de influenciadores digitais locais, o que gera marketing espontâneo para públicos bem definidos nas redes sociais – algo caro se feito de maneira inorgânica.
Neste ano, a C&A vai manter o ritmo e abrir mais 25 pontos com a mesma orientação de priorizar centros de compras de cidades menores. A rede hoje tem alta concentração na região Sudeste, com 174 lojas. No Nordeste, são 77 pontos, 34 no Sul, 29 no Centro-Oeste e 24 no Norte. Na expansão, a rede busca cidades que, além de atender ao alvo de número de habitantes, tenham concentração de renda e poder de compra. “Já tínhamos percebido que essa descentralização aconteceria antes da pandemia. Orientamos nossa expansão majoritariamente fora de grandes centros”, diz Neto.
Para Eduardo Terra, presidente da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC), essa é uma oportunidade gerada com as mudanças em curso. Ele avalia que cidades como as que a C&A tem buscado são um exemplo de localidades que tendem a crescer em fluxo e consumo. Além disso, ele cita os bairros antes chamados de “dormitório”, onde uma grande parte das populações das capitais só voltava no fim do dia para dormir, enquanto o consumo ficava nas regiões centrais. Agora essas economias locais tendem a ser mais movimentadas.
Alimentos
No comércio de alimentos os formatos de proximidade e bairro têm demonstrado crescimento, enquanto os hipermercados – a exemplo da agora extinta bandeira Extra Hiper – são um modelo em decadência.
Se precisar se deslocar para fazer uma grande compra, o cliente prefere o preço do atacarejo. Já nas compras do dia a dia, a proximidade tem sido priorizada. Segundo dados do balanço do terceiro trimestre de 2021 do Grupo Pão de Açúcar, no Brasil, as maiores contribuições de vendas vieram do canal online, que cresceu 46%; e dos formatos de proximidade, Mercado Extra e Compre Bem, com destaque para o Minuto Pão de Açúcar.
Para Eduardo Yamashita, diretor de operações da consultoria Gouvêa, a nova concentração geográfica do consumo tem sido uma questão para todas as varejistas atendidas pela empresa. No entanto, as incertezas impedem passos mais assertivos em direção a uma mudança. “Ainda não se sabe como tudo isso vai ficar”, diz.
Na prática, é claro que o mundo mudou, mas ainda não se sabe a quanto o fluxo desses grandes centros estará reduzido ao fim da pandemia. Se o modelo híbrido prevalecer, o efeito será diferente de um cenário em que o trabalho completamente remoto prevaleça, por exemplo.
Na avaliação de Yamashita, uma mudança completa no parque de lojas é inviável para as empresas, já que fechar uma unidade pode ser mais caro que deixá-la operando em algum nível de prejuízo. “Em um fechamento, você tem ruptura de contrato de aluguel, demissão de funcionários, alocação de estoque, entre outros”, diz. Assim, qualquer mudança é profundamente estudada antes de ser colocada em prática.
Para Terra, da SBVC, as alterações de rota devem acontecer em ritmo de “evolução e não de revolução”. Ou seja, nos próximos anos, as novas lojas devem nascer orientadas por essa nova visão. Já as lojas antigas, que por ventura ficarem em regiões de tráfego muito reduzido, ainda devem sangrar por algum tempo, antes de um fim definitivo.
Fonte: BroadCast