Quem chega à unidade da rede de lanchonetes Bob’s no BarraShopping, no Rio, encontra uma plaquinha de “Faça seu pedido aqui!” em um local sem nenhum atendente. São os próprios clientes que pedem hambúrgueres, batatas e afins em um dos três tótens espalhados pelo restaurante, ou por um aplicativo desenvolvido em parceria com a Mastercard. Os funcionários estão na cozinha, ou no salão, entregando os pedidos. A exceção são dois atendentes que ficam no salão para ajudar quem ainda não se familiarizou com os tótens, função que a rede espera eliminar em breve.
A medida, afirma o Bob’s, não é para cortar custos, já que o número de funcionários é o mesmo de uma loja tradicional. A questão é agilizar o atendimento e permitir uma maior customização dos lanches. Com mais gente na cozinha, o Bob’s passou a fazer mais produtos na hora, e também permitiu uma maior customização dos pedidos. É possível, por exemplo, personalizar seu sanduíche sem tomate, com mais bacon, trocar o pão, etc. Além disso, a ideia é que, pelo aplicativo, a rede tenha acesso a um histórico dos pedidos de cada cliente, e possa fazer ofertas e promoções sob medida.
Por enquanto, todas as outras 1.099 lojas e quiosques do Bob’s continuam funcionando da maneira tradicional, recebendo pedidos no balcão. Mas o plano é que aos poucos outras lojas sejam mais tecnológicas. Um terço da rede já aceita os pedidos no aplicativo, e o plano é chegar a 50% até o fim do ano. A meta é que 20 lojas sejam 100% digitais, como a da Barra da Tijuca, até o fim do ano.
“Percebemos que o fast food tradicional, pré-pronto e sem customização, estava com os dias contados. Queríamos fazer produtos sob medida, e isso só era possível com muita tecnologia”, diz Marcello Farrel, diretor geral do Bob’s. Para isso, a rede precisou alterar também a sua cozinha, investindo em um novo maquinário. Entre os equipamentos novos estão chapas de alta potência para fritar o hambúrguer na hora em que o cliente faz o pedido. A mudança faz parte de uma reestruturação maior da marca, que inclui as reformas de lojas, com o objetivo de acelerar o crescimento do Bob’s – que em 2016 repetiu o faturamento de 2015, de 1,3 bilhão de reais.
As novidades do Bob’s seguem uma tendência global das empresas de varejo e alimentação. A ideia é facilitar a vida dos clientes, num conceito batizado de ‘no friction’, ou algo como ‘sem atrito’. Fila para pedir, ou para pagar a conta, é considerado um atrito. O mesmo vale para a dificuldade de adicionar ou retirar um ingrediente. Precisar dizer o CPF é outro exemplo. A ideia é que todos os clientes sejam reconhecidos assim que abrirem os aplicativos, entrarem nas lojas, ou até passarem pela calçada. No fim das contas, as empresas tentam levar para as lojas tradicionais a mesma experiência de compra que os consumidores já encontram online – sem filas, com ofertas sob medida e histórico reconhecido.
No Bob’s, é possível fazer pedidos recorrentes com apenas um clique no aplicativo. Na rede de pizzarias Domino’s, já é possível fazer pedidos sem nenhum clique – basta abrir o aplicativo e esperar por dez segundos que a pizza favorita é entregue em casa. Ainda dá para usar o Facebook, o Twitter, o AppleWatch (nem todas as novidades estão disponíveis no Brasil). A empresa está também estudando entregar pizzas com robôs na Alemanha e na Holanda já nos próximos meses.
Na Austrália, clientes que querem retirar o pedido nas lojas são rastreados por GPS, para que a pizza esteja saindo do forno no momento em que eles entram pela porta. No Brasil, clientes da Domino’s podem fazer o pedido com um clique no computador ou no celular. “Metade de nossos pedidos são online, e o processo tem que ser fácil para o cliente”, diz Mario Chady, fundador do Grupo Trigo, controlador da marca Domino’s no Brasil. No primeiro trimestre, a receita com pedidos online da companhia no Brasil foi 86% maior do que 12 meses antes. A meta é que a tecnologia ajude a aumentar em 22% o faturamento em 2017, para 350 milhões de reais.
Faz parte do mesmo fenômeno de facilidade total o assistente pessoal Alexa, da Amazon. Trata-se de um dispositivo eletrônico que faz parte da mobília da casa e permite, entre outros usos, pedir comida e comprar produtos online apenas com comandos de voz. A Amazon também tem uma loja física piloto, a Amazon Go, em Seattle, que identifica os clientes na entrada e permite que eles peguem os produtos e simplesmente saiam pela porta – o valor dos itens é cobrado automaticamente do cartão.
Já há exemplos de redes que nasceram exclusivamente com essa proposta “sem filas”. Um dos maiores exemplos é a americana Eatsa, fundada na Califórnia em 2015, especializada em pratos leves com quinoa. Suas lojas não têm nenhum atendente. Os pedidos podem ser feitos por um aplicativo, ou por dezenas de totens espalhados pelo salão. O pagamento só pode ser feito por cartão de crétido, e os pratos são entregues em nichos futurísticos nas paredes. A companhia tem sete unidades nos Estados Unidos e foi fundada por David Friedberg, que vendeu sua primeira startup, a The Climate Corporation, para a Monsanto por cerca de um bilhão de dólares.
Uma das companhias pioneiras nesse tipo de serviço é também um lembrete dos riscos das novidades no atendimento. Em 2012, a rede de cafeterias Starbucks lançou um aplicativo que permitia pagamentos online e dispensava as filas. Foi um sucesso. Hoje, um quarto dos pedidos nos Estados Unidos já é feito assim. O problema: a dificuldade logística mudou de lugar. Saiu da frente do caixa para a cozinha, que muitas vezes fica sobrecarregada de pedidos. A solução, tanto para a Starbucks quanto para as demais redes, está na própria tecnologia. “É preciso aproveitar o conhecimento dos clientes para fazer promoções e ofertas fora dos horários de pico”, diz Adir Ribeiro, presidente da consultoria Praxxis Business. Novas soluções, as redes vêm descobrindo, trazem novos problemas.
Fonte: Exame