As salas de cinema estão entre os poucos setores do País que passaram praticamente incólumes pela crise. Em um segmento cada vez mais competitivo, as operações de cinema estão completamente ligadas à jornada de compra dos consumidores em shopping centers e são elementos que caminham ao lado do varejo na era da experiência. Segundo dados da Abrasce (Associação Brasileira de Shopping Centers), as salas de cinema estão presentes em 90% dos 558 shoppings existentes no País. Ao todo, são 2.707 salas – 4,9% a mais em relação a 2015.
O crescimento desse mercado está ligado ao comportamento do consumidor, que tem buscado mais lazer nos grandes centros de compra. Pesquisa da Ipsos mostra que a procura por cinema dobrou entre 2007 e 2015. Com a crise, o consumidor trocou hábitos de lazer mais caros, como restaurantes, por diversão mais em conta. “Se até 2014 existia um grupo de pessoas viajando mais e frequentando mais restaurantes, o que percebemos agora é uma retração no comportamento dessas famílias. Do mesmo jeito que presenciamos, anos atrás, a entrada em nosso mercado de pessoas que frequentavam salas de cinema pela primeira vez, notamos agora a retomada do consumidor de classes A e B”, afirma Marcelo Bertini, presidente da Cinemark Brasil.
Com 620 salas em todo o Brasil, a rede sentiu nos números essa mudança: no ano passado, a companhia vendeu mais de 46 milhões de ingressos, um crescimento de 7,5%, em relação ao ano anterior. Isso em um cenário em que a concorrência está dentro da casa do consumidor, como é o caso da Netflix. “Não brigamos sob o ponto de vista do conteúdo. Mas disputamos com ela o tempo que as pessoas dedicam ao entretenimento dentro e fora de casa”, diz.
Em entrevista à NOVAREJO, Bertini fala sobre a concorrência dos serviços de streaming, o investimento constante em tecnologia, o futuro do setor e, claro, sobre a mudança de comportamento dos consumidores: se antes eles se esbaldavam em porções gigantes de pipoca, agora, dividem combos menores.
O que a Cinemark Brasil vem fazendo para melhorar a experiência do cliente?
Investimos muito em melhorias tecnológicas. Nesse sentido, temos as salas VIPs, as salas de projeção 3D e as D-BOX, que têm cadeiras com sensores de movimento para simular vibrações, quedas e trepidações. Temos, ainda, as salas XD, nas quais as telas chegam a ser até 40% maiores e o som até sete vezes mais potente do que nas salas convencionais. Para quem gosta de ver filmes de ação, elas fazem toda a diferença. O que a gente vem proporcionando para os nossos clientes são alternativas à experiência padrão do cinema.
Além dos investimentos em tecnologia, o que mais a Cinemark vem fazendo?
Também oferecemos conteúdos voltados a determinados públicos, como a exibição de uma ópera, um show, a exibição do primeiro ou do último capítulo de um seriado ou uma partida de futebol americano. Os eventos esportivos são sempre ao vivo, como é o caso das finais da Champions League, que costumamos exibir em algumas salas. Outra coisa a qual nos atentamos é oferecer, em nossa bombonière, um mix de produtos mais apropriados de acordo com o cinema e a região.
Como vocês conseguem identificar essas preferências?
Temos um CRM cada vez mais desenvolvido e que tem nos dado muitas informações sobre o perfil de compra dos nossos clientes. Usamos também tecnologias de big data e analytcs para cruzamentos de dados mais pontuais.Ma s hoje sabemos a frequência com que cada cliente vai ao cinema, os horários e de onde ele vem. Estamos evoluindo esse conhecimento para o nosso setor de alimentos e bebidas.
De que forma os dados de um cliente são usados para impactá-lo?
Estamos evoluindo para que, ao entrar na nossa rede, ele comece a ser impactado via celular. Isso não acontece ainda. Outra coisa na qual a gente investe muito tempo e dinheiro é no aprimoramento da experiência como um todo. Sabemos que em uma operação de cinema um dos gargalos é a fila. Então, temos investido muito na automatização do atendimento para ampliar o número de pontos de venda. Hoje, ele pode, inclusive, comprar alimentos e bebidas no momento de adquirir o ingresso e retirá-los em uma fila exclusiva antes de entrar na sala.
A taxa de conveniência não inibe a venda on-line?
Não, porque o cliente que compra online quer conveniência. Quer garantir seu lugar, não quer pegar fila, nem chegar com muita antecedência. Esse é um serviço a mais que oferecemos.
E por que não desenvolver o próprio sistema de venda de ingresso on-line?
Temos um acordo com a Ingresso.com e todas as vendas via internet são feitas através dele. Isso faz parte de um acordo comercial grande e que contempla a terceirização da venda de ingressos. Essa decisão éba seada na viabilidade econômica do nosso negócio.
O senhor enxerga os serviços de streaming como uma ameaça aos negócios?
Hoje, não brigamos com a Netflix sob o ponto de vista do conteúdo. Mas disputamos com ela o tempo que as pessoas dedicam ao entretenimento dentro e fora de casa. Por outro lado, consideramos que, entre as opções pagas fora de casa, oferecemos um dos menores custos. Por isso, nosso objetivo é continuar sendo a melhor experiência de entretenimento fora de casa para o nosso cliente.
Apesar da crise, a venda de ingressos segue crescendo. Por que?
Fundamentalmente, a oferta de filmes em 2016 foi muito sólida sob o ponto de vista comercial. Apesar de termos percebido um aumento da seletividade do nosso cliente na busca por filmes, a oferta de opções que “caíram no gosto do público” permitiu que alcançássemos uma venda superior em relação a 2015.
Vocês notaram uma mudança no comportamento do consumidor?
Se até 2014 existia um grupo de pessoas viajando mais e frequentando mais restaurantes, o que percebemos agora é uma retração no comportamento dessas famílias. Do mesmo jeito que presenciamos, anos atrás, a entrada em nosso mercado de pessoas que frequentavam salas de cinema pela primeira vez, notamos agora a retomada do consumidor de classes A e B. Percebemos ainda um aumento no compartilhamento de alimentos e bebidas e uma tendência por tamanhos menores. Se antigamente as pessoas compartilhavam combos grandes, hoje dividem os menores. Houve também uma redução das assinaturas de TV a cabo, o que de certa forma nos favorece.
O público de vocês varia conforme a região?
Algumas regiões têm o hábito de ir ao cinema mais enraizado do que outras. Em cidades do interior, por exemplo, a propensão é gastar menos com entretenimento. Mas contamos com a ajuda do nosso CRM e do histórico de 20 anos Operando no Brasil para programar o que vai entrar em cartaz de acordo com o perfil do público. 610 salas em todo o Brasil Distribuídas em 82 complexos, em 45 cidades brasileiras 46 milhões de ingressos foram vendidos em 2016
Mais de 332 salas com a tecnologia de projeção em 3D no País.
Como ser assertivo na escolha dos filmes?
É muito difícil antecipar o apelo comercial que um filme vai ter antes dele ser lançado. Mas existem métricas negociadas com os distribuidores e que definem a manutenção deles por mais ou menos tempo. A gente tem um time de programação grande e que trabalha nisso toda semana. Eu sempre digo que a nossa programação é bem mais sofisticada do que a de voos, que acontece sempre no mesmo horário e para o mesmo destino. A nossa muda toda semana. Mudam os filmes, as salas e os horários. É uma verdadeira ciência.
Quais são os desafios de vocês hoje?
Fazer com que esse tempo que o consumidor passa conosco seja o mais prazeroso possível. Nosso objetivo é continuar crescendo, seguir na liderança e aumentar o número de salas onde a oferta decinema é pequena ou sequer existe. No ano passado, abrimos redes em Varginha (MG), Bragança Paulista (SP), Lages (SC) e em Juazeiro (BA). Algumas dessas cidades não tinham cinema Multiplex (com mais de quatro salas). Por isso, para nós, é uma honra entregar a clientes de todo o país um cinema dentro do padrão que a gente oferece.
Como o senhor imagina as salas de cinema no futuro?
Temos assistentes virtuais sendo estudados em nossa matriz em Dallas, nos Estados Unidos. Mas não há nada concreto ainda. Acredito que o hábito das pessoas de se reunir fora de casa para ir a uma sala de cinema vai perdurar
Fonte: NOVAREJO