Uma marca de cosméticos fundada na Rússia ainda no período soviético e à venda em mais de 13 países viu o Brasil se transformar em seu principal mercado consumidor nos últimos dois anos graças à vaidade da classe C.
Em 2016, a base Ruby Rose foi descoberta por blogueiros e youtubers “especializados” em produtos acessíveis. Os vídeos viralizaram na internet, levando muitas consumidoras à rua 25 de Março em busca da tal base de R$ 6 e que “cobria tudo”.
“Há dois anos, vinha um contêiner por mês. Hoje são dez ou mais”, diz Cleide Lopes, gerente de marketing.
A reportagem apurou que, dependendo do tamanho do contêiner, é possível trazer de 160 mil a 320 mil peças. Ou seja, mensalmente, chegam ao Brasil vindos da China mais de 3 milhões de produtos Ruby Rose, que são espalhados pelas perfumarias do país.
Parte está na 25 de Março, onde a Ruby Rose chegou em 2012 com kits de sombra e batom. Hoje são 500 produtos e lançamentos semanais.
“No começo, a marca se vendia sozinha, pelo preço”, afirma Cleide, contratada há um ano e meio para criar a área de marketing da empresa, que está presente em 13 países.
Hoje, a principal ação de marketing da Ruby Rose é com a influencer Mari Maria, contratada pela marca —o valor não é revelado. A maquiadora diz que conheceu a marca em uma feira e começou a usar. “Gosto de mostrar que makes mais acessíveis podem proporcionar os mesmos resultados que makes mais caras”, diz.
Cleide conta que após os primeiros vídeos da Mari Maria, os estoques da base esgotaram. “Só depois a gente foi atrás dela, para fechar uma parceria”, diz.
O crescimento vivido pela Ruby Rose reflete a revolução que o Instagram e o YouTube causaram no setor de cosméticos —e na 25 de Março.
Enquanto modelos e atrizes desfilam com maquiagens leves, as celebridades das redes sociais transformaram os looks carregados das suas selfies e vídeos em tendência. E essa moda vende: para alcançar esse visual, as milhares de seguidores compram sem parar pincéis, bases e iluminadores. Em 2017, segundo dados da Euromonitor, o segmento de maquiagem vendeu R$ 8,3 bilhões no Brasil.
A redução da burocracia da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para o cadastro de produtos também facilitou a importação.
Em 2006, o órgão instituiu o cadastro via internet para cosméticos isentos de registro (no qual as maquiagens se enquadram). Segundo a Anvisa, “a isenção de registro para várias categorias de produtos cosméticos vem sendo ampliada gradativamente conforme o baixo risco sanitário dos produtos”. O órgão ressalta que as marcas ainda devem seguir as normas sanitárias.
No último ano, cinco lojas grandes de cosméticos abriram na 25 de Março. Já os antigos estabelecimentos de bijuteria, bolsas, lingerie e até de acessórios para celular arrumaram espaço para blushes e batons.
Segundo a Univinco (União dos Lojistas da Rua 25 de Março e Adjacências), hoje as maquiagens representam cerca de 40% do que é vendido na região.
“Esse movimento chamou a minha atenção quando vi um balanço de novos displays da Kiss NY e cinco desses estabelecimentos estavam registrados como lojas de acessórios para celulares”, afirma Celso Hideki Nakahara, gerente de vendas da Kiss NY no Brasil.
No Brasil, a americana Kiss NY é líder em cílios postiços e em 2017 registrou crescimento de 136% nas vendas. “O aumento na venda dos cílios postiços é representativo. Significa que a mulher está fazendo todos os passos da maquiagem.”
Tendo em vista o crescimento do segmento, há dois anos a marca trouxe sua linha de maquiagem. Hoje são 600 itens disponíveis no Brasil. Na região da 25 de Março, a Kiss NY está entre as maquiagens mais caras, competindo em preço com a brasileira Vult.
O sucesso das makes fez empresários da região investirem em marcas próprias.
No fundo de uma galeria em frente ao metrô, a loja Mauro Bijuterias ostenta sua marca de maquiagem (importada da China), a Belle Angel.
O proprietário, Mauro Souza, há 15 anos na 25 de Março, começou importando menos de dez itens há cinco anos. Hoje são mais de 40 —um contêiner a cada 40 dias.
“Comecei com maquiagem, quando vi que bijuteria já não rendia tanto”, afirma.
A Belle Angel tem um dos preços mais competitivos da região: o lápis de olho custa R$ 1,70. Souza afirma que os produtos passaram pela Anvisa e que conta com o aval de um engenheiro químico.
“E eu também peço para a minha filha e para as meninas da loja testarem [os produtos antes de aprovar na fábrica]”, afirma. O método para conseguir vender tão barato, ele diz ser o seu segredo. Na loja, só se paga com dinheiro, nada de cartão de crédito ou débito.
Além da Belle Angel, a Mauro Bijuterias vende outras marcas, como Luisance, Playboy, Fenzza e Jasmyne, todas “made in China”. Ao lado delas, estão velhas conhecidas das perfumarias brasileiras, como MaxLove, Dailus e Vult.
A Vult foi comprada em 2017 pelo Grupo Boticário, que vê na marca uma maneira de ampliar a presença na classe C.
A Dailus é uma das poucas com produção nacional e que conseguem manter os preços acessíveis. “A tecnologia vem de fora, mas os produtos são feitos no Brasil”, diz Carlos Antoneli, diretor de operações.
Segundo o executivo, o segredo é ter uma operação bastante enxuta e eficiente para conseguir manter os preços atraentes e boa qualidade. “A consumidora de baixa renda também pode ter acesso a substâncias premiuns.”
A Ruby Rose vai pelo mesmo caminho. Recentemente lançou uma linha de cuidados para a pele. Foi a primeira experiência da marca com as fábricas brasileiras –que não se mostrou simples.
“Além do custo, foi muito difícil encontrar fábricas que entregassem quantidade e preço. Isso a gente consegue mais fácil na China”, afirma Cleide.
A Ruby Rose quer transferir toda a produção para o Brasil, para agilizar a logística. Hoje, cada produto demora até três meses para chegar aos portos brasileiros vindos da China.
Mauro Souza, da Belle Angel, diz já ter sete produtos sendo feitos em fábricas nacionais. A ideia é aumentar o giro de venda entre as importações. “Com a fábrica aqui, em 22 dias o produto está na loja.
‘Oi, meninas’
Venda de maquiagem no Brasil é impulsionada por tutoriais da internet, diz Euromonitor
R$ 8,3 bilhões
foi o valor da venda de maquiagem no Brasil em 2017
R$ 8.000
é o custo de um post no Instagram da influencer Niina Secrets (3,2 milhões de seguidores)
R$ 6.000
é o custo de um post no Instagram da maquiadora e blogueira Alice Salazar (1,5 milhão de seguidores)
R$ 300
é o custo de um post no Instagram da microinfluenciadora Gabi Leal (150 mil de seguidores)
Fonte: Panorama Farmacêutico