Presidente da empresa no Brasil vê consumo represado e aposta tanto na expansão física quanto nas operações digitais
Por Raquel Brandão
Depois de um ano com o pé no freio nos investimentos, a C&A diz que 2021 deve ser o ano de maior nível de aplicação de recursos em sua história. Em entrevista na Live do Valor desta quarta-feira, o presidente da varejista no Brasil, Paulo Correa, afirmou que a empresa está investindo o dobro do que aplicou em 2019, apostando tanto na expansão física quanto nas operações digitais.
Veja a íntegra da entrevista:
“Hoje em dia estamos olhando para a dimensão de investimentos e para os diversos cenários. A dimensão caixa continua tendo uma história muito importante, mas entramos com uma saúde financeira muito grande. Isso nos dá condição de fazer o tamanho do investimento que vamos fazer. Deverá ser o maior investimento em capex que já fizemos na C&A nos últimos anos”, disse, sem revelar valores.
Parte dos investimentos na estrutura física passa pela abertura de 20 lojas ao longo deste ano, além de modernização dos centros de distribuição e aumento da capacidade dos sistemas de distribuição. A companhia também vai passar a utilizar caminhões elétricos na distribuição de suas mercadorias. O primeiro deve começar a operar até o fim do mês na região da Grande São Paulo. A meta é de 20 caminhões até dezembro.
Na frente de investimentos de tecnologia, Correa diz que as iniciativas são muitas. Os canais digitais, como aplicativo, marketplace e vendas pelo Whatsapp, surgiram nos últimos 12 meses e têm participação cada vez maior nos resultados, segundo ele. O objetivo é expandir a capacidade dessas ferramentas. “E tem uma parte mais de arquitetura de sistemas para acelerar ainda mais nos produtos digitais a partir do fim deste ano.”
A companhia está focando seus esforços em soluções de CRM e no desenvolvimento de produtos para fortalecer o relacionamento com o cliente, conta Correa. “O nível de personalização no relacionamento com os clientes da C&A vai ser marcante. A C&A de cada pessoa vai ser mais interessante”, diz ele.
Sobre o marketplace (shopping virtual), Correa diz que a empresa segue no ritmo acelerado que se iniciou no ano passado. “Tínhamos 5 ‘sellers’ [vendedores terceiros] e hoje temos 400. Estamos trazendo novas categorias que não estão nas lojas físicas, como decoração, games etc. Essa plataforma on-line te permite aumentar o sortimento em grande magnitude.”
O ritmo de vendas deve acelerar no segundo semestre de 2021, acredita o presidente da C&A no Brasil. Ele afirma que a aceleração deve ser especialmente intensa no quarto trimestre. “Estamos trabalhando com o cenário da retomada acontecer até o quarto trimestre. Devemos ver um quarto trimestre com mais força econômica do que ano passado, com certeza, e maior do que 2019”, disse.
Segundo ele, há duas percepções para os próximos trimestres. A primeira é que há um consumo represado. “Moda tem muito a ver com a nossa expressão e hoje isso está muito dentro de casa. À medida que estejamos seguros para retomar o convívio social, certamente há uma renovação do armário.”
A segunda percepção é o contexto macroeconômico, que pode ser, sim, um fator de risco, mas que ele acredita ser menor do que a necessidade de consumo. “Vemos uma pressão muito grande em algumas classes sociais, o que é um fator negativo. Mas a necessidade de consumo pode trazer um balanço positivo.”
Entre as tendências, Correa diz que as roupas confortáveis seguem com forte demanda, mas precisam, agora, trazer mais informação de moda, ser um “confortável arrumado”. Isso vem de certa retomada da vida, como a ida a restaurantes e a volta gradual aos escritórios, explica o executivo. “As pessoas gostaram de ficar confortáveis, mas agora querem estar também mais elegantes.”
Outra tendência que se acelerou na pandemia e veio para ficar é a maior demanda pela linha esportiva. “A dimensão do autocuidado ganhou muito espaço”. Mas Correa também acredita que peças ligadas à vida social, como roupas de festas, salto alto e trajes sociais vão voltar a ganhar tração de vendas mais para o fim do ano, conforme a vacinação avance e o consumidor comece a se sentir mais seguro.
Sobre os canais, Correa diz que o índice de vendas on-line não deve voltar aos patamares de 4% a 5% que se observava anteriormente. “No primeiro trimestre fizemos algo em torno de 15%. Esse percentual tende a continuar, não acho que vai cair de maneira significativa. Mas eu também acredito demais na experiência na loja física. Não dá mais para criar fronteira entre on-line e físico. A jornada do consumidor é on-line e física o tempo inteiro, acredito que cada vez mais serão jornadas omnichannel [multicanais].”
Ele conta que hoje o consumidor vai à loja mais certeiro do que pretende comprar, muitas vezes com imagens das roupas, e quando não encontra uma peça na loja física tende a completar a compra no canal on-line, devido à plataforma infinita.
Mais parcerias, menos aquisições
A varejista de modatem apostado mais em acordos comerciais e na avaliação de startups que possam trazer ganhos de eficiência do que avaliado fusões e aquisições, disse Correa. “Estamos conversando [com startups], é um ‘approach’ [uma abordagem, na tradução do inglês] bem pragmático. M&A por M&A não vamos fazer”, disse, usando a sigla em inglês para fusões e aquisições.
Sobre os movimentos de fusão e aquisições observados recentemente no mercado de moda, Correa diz que o setor sempre foi pulverizado. “Maiores players têm 20% do total. Essa conversa de consolidação já acontecia desde 2014. De fato ela veio acontecendo não como compra entre players, mas como concentração natural por expansão orgânica das empresas líderes, que antes tinham 10%. O que estamos vendo mais recentemente é diferente do tradicional. O que estamos vendo de consolidação tem a ver com possibilidade de aumentar a base de clientes.”
Correa argumenta que, para a C&A, as possibilidades de transações têm mais a ver com acelerar a jornada de digitalização da companhia.
“Consolidação por consolidação não vemos nesse momento porque o nível de sinergia é baixo. Hoje patrimônio tem muito mais a ver com o relacionamento com o cliente.”
Fonte: Valor Econômico