Depois de anos de mudanças na administração, no cardápio e no marketing, o Burger King finalmente descobriu o que quer ser: uma rede de fast-food.
As tentativas de usar saladas, sanduíches do tipo “wrap”, bebidas saudáveis e batatas fritas com baixas calorias para atrair clientes preocupados com a saúde começaram depois que a rede foi comprada pela 3G Capital Partners LP – firma brasileira de private equity fundada pelos empresários Jorge Paulo Lemann, Marcel Herrmann Telles e Carlos Alberto Sicupira -, no fim de 2010. A equipe de gestão que assumiu não tinha experiência anterior com restaurantes e testou muitas coisas diferentes antes de descobrir o que funcionava.
Com os fracassos das tentativas, o Burger King, que é controlado pela Restaurant Brands International Inc., resolveu voltar às suas origens de especialista em hambúrgueres, fritas e, agora, cachorros-quentes acessíveis.
As iniciativas para enxugar um cardápio que havia se tornado complicado já ajudaram a melhorar o negócio principal da marca nos Estados Unidos a ponto de seus executivos agora se sentirem confiantes para expandir a rede no país. O número de restaurantes nos EUA tem se mantido em torno de 7.100 há anos. O brasileiro Alex Macedo, diretor-superintendente da empresa na América do Norte, disse em entrevista ao The Wall Street Journal que vê potencial para milhares de novos Burger Kings nos EUA nos próximos cinco anos. No Brasil, a rede tem mais de 700 pontos de venda, entre restaurantes e quiosques.
Atualizar a identidade de uma marca já estabelecida parece simples. Mas a tarefa tem confundido redes tradicionais de fast-food que estão tentando descobrir como continuar relevantes em meio a uma onda de concorrentes que oferecem refeições rápidas e casuais – ou “fast-casual”, em inglês – e promovem suas instalações modernas, ingredientes frescos e valores sociais mais sintonizados com clientes jovens. O McDonald’s Corp., por exemplo, que se encontra nos primeiros estágios de uma aparente virada depois de anos de vendas fracas, ainda está tentando se definir, testando hambúrgueres customizados e saladas de couve. Já o Wendy’s Co. está incluindo mais vegetais frescos no cardápio.
“Em um momento em que várias marcas de serviço rápido tentam se tornar mais fast-casual, estamos adotando a visão oposta”, disse Macedo quando o Burger King anunciou seu cachorro-quente, em fevereiro. A rede ainda não tem planos de lançar o cachorro-quente no Brasil, segundo a assessoria de imprensa.
As mudanças estão dando resultado. O lucro ajustado do Burger King antes de juros, impostos, depreciação e amortização cresceu 68% entre 2010 e 2015. A receita caiu mais da metade no período porque a 3G vendeu todos os restaurantes próprios da empresa aos franqueados para reduzir risco e se concentrar na construção da marca. As vendas das unidades existentes há mais de um ano nos EUA e Canadá avançaram 5,7% no ano passado ante 2014, resultado melhor que o da maioria dos rivais. Em 2015, o Burger King comprou a rede de cafeterias canadense Tim Hortons, formando a Restaurant Brands.
Antes de a 3G comprar o Burger King, a rede passou por uma série de diretores-presidentes que priorizaram uma clientela de homens jovens – estratégia que afetou a empresa quando a recessão atingiu duramente essa parcela da população. Com os novos proprietários, o Burger King começou a imitar aquilo que havia funcionado no McDonald’s: oferecer algo para todo mundo.
Mas eles foram longe demais, adicionando muitos produtos rapidamente e sem os testes necessários, dizem os executivos. “Houve momentos em que estávamos lançando tantas coisas que não tínhamos tempo de falar sobre elas na TV”, disse Macedo.
O cardápio abarrotado complicou as operações na cozinha e não conseguiu atrair os novos clientes esperados. Em 2010, o Burger King lançou mais de 30 ofertas por tempo limitado e 20 itens permanentes no menu. No ano passado, a rede lançou 20 ofertas por período limitado e nenhum novo item permanente.
O novo Burger King não tem vergonha de admitir seus erros. Em 2013, a rede lançou as batatas fritas de baixa caloria “Satisfries”, mas as tirou do cardápio em menos de um ano devido às vendas fracas. No ano passado, eliminou as saladas de maçã e amora porque “não era o que nossos clientes estavam procurando”, diz José Cil, diretor-superintendente da marca Burger King.
“Eles erram rápido e consertam rápido”, diz Dan Fitzpatrick, um franqueado do Burger King, sobre a atual administração.
Através de grupos de discussão e pesquisas, os executivos da rede acabaram concluindo que os clientes queriam que o Burger King conservasse sua identidade original, personificada por sua prática de grelhar seus hambúrgueres no fogo. “Há dois anos não se via qualquer menção às grelhas de fogo nos restaurantes. Foi o que nos tornou especiais, mas nós não demos atenção”, diz Axel Schwan, diretor de marketing global da rede.
Agora, os restaurantes contam com a frase “grelhados desde 1954”, as mesas de madeira têm o logotipo do Burger King e a empresa está promovendo os cachorros-quentes grelhados como se fossem um churrasco caseiro. Os clientes ainda querem sua comida rapidamente – no que o Burger King vem tendo dificuldade em atendê-los. A rede quer reduzir o tempo médio entre o pedido e a retirada no drive-through para dois minutos e 45 segundos. Os executivos não dizem quanto tempo leva agora, mas só as batatas fritas demoram mais de três minutos. Depois de meses de ajustes, a empresa chegou à temperatura para o óleo que reduz o tempo de fritura em 20 segundos, sem afetar o sabor.
A empresa decidiu lançar só itens que tenham um forte impacto. O primeiro produto importante lançado com essa estratégia foi, na verdade, um prato antigo: as “chicken fries”, tiras no formato de batatas fritas feitas com frango frito. Macedo cancelou as “chicken fries” em 2012, quando o cardápio foi simplificado, mas um empregado notou que mais pessoas estavam tuitando que queriam as “chicken fries” de volta do que qualquer outra coisa relacionada ao Burger King. Então, em agosto de 2014, o produto foi relançado, esgotando o estoque em duas semanas. Agora, as “chicken fries” são parte permanente do cardápio.
David Harper, um franqueado que opera 72 unidades do Burger King, diz que a rede aprendeu a não repetir seu maior erro: copiar os rivais. “Agora nós sabemos quem somos.”