Em dez anos, a Black Friday se tornou o principal evento varejista do Brasil. No ano passado, o faturamento bateu 3 bilhões de reais em apenas dois dias, em uma edição que já foi 25% maior que a anterior. Mas e agora, com uma crise que deve causar uma retração de 6,5% do PIB e o desemprego que pode chegar aos 14% até o fim do ano, o que esperar da Black Friday 2020?
Para responder essa e outras perguntas, convidamos Eduardo Terra, presidente da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo, para ser o primeiro entrevistado da segunda temporada AdyenTalks, série de lives que dessa vez terá como tema a Black Friday.
Eduardo admite que há muitas incertezas sobre qual será a situação do varejo até setembro (não sabemos, por exemplo, se tudo já estará 100% aberto), mas há algumas coisas que comerciantes já podem fazer para estar preparado para os diferentes cenários.
Segundo ele, esta será a maior edição da Black Friday no país, mas as empresas precisam estar prontas para suprir a demanda, tanto em termos tecnológicos quanto comerciais, e para fidelizar clientes.
E ele adverte: a hora de se planejar é agora.
Veja abaixo os destaques desse papo.
A nova Black Friday
Quando a Black Friday chegou ao país, o evento tinha outra identidade. Ele era muito menor, e engajava mais empresas de bens duráveis que queriam popularizar suas vendas online, como Via Varejo, B2W e Magazineluiza.
Com o tempo, contudo, o evento ganhou a simpatia do consumidor, e ninguém mais quis ficar de fora. É só ver como na última edição todo tipo de empresa estava participando, de grandes multinacionais, a farmácias à sorveteria da esquina.
Segundo Eduardo, a generalização do evento é uma tendência que deve se manter este ano. É verdade que os bens duráveis seguem como os favoritos da data – afinal, quem precisa comprar uma televisão ou um computador já está contando com a BF para fazê-lo.
Mas outros segmentos devem abraçar o evento elegendo as categorias certas de produto para ofertar.. Supermercados, por exemplo, dificilmente farão ofertas com produtos do dia a dia, como arroz e feijão, mas devem privilegiar os produtos de bazar, bebida e mercearia especializada.
O mesmo vale para drogarias: não cabe fazer promoções com remédios, mas por que não promocionar produtos de higiene pessoal e cosméticos? “Essas categorias podem servir como alavanca para os setores que não participavam da BF se lançarem e aumentarem vendas”, diz.
Black Friday 2020: novos recordes?
A edição de 2020 do evento será atípica por uma série de motivos. Entre eles o fato de ela ocorrer em um contexto de pandemia, período em que o varejo viu as vendas caírem, e durante uma crise econômica global.
No Brasil, as medidas de auxílio à população e a empresas ajudaram a amortecer o impacto sentido pelo varejo até agora, mas não devem durar até novembro. “Teremos que esperar para ver para descobrir o tamanho do estrago macroeconômico no segundo semestre”, diz.
Por outro lado, ressalta Eduardo, em novembro teremos consumidores com uma demanda reprimida, que estão evitando gastar e sair de casa agora e que provavelmente usarão a data para antecipar as compras de Natal, aproveitando os descontos.
“Olhando para o segundo semestre, não vejo com muito otimismo os resultados do varejo como um todo, mas acredito sim que a Black Friday será um sucesso ainda maior do que o do ano passado”, diz.
Se os recordes serão no ecommerce ou na venda de loja, só as circunstâncias dirão. “Vamos ter uma ideia a partir de julho, quando os horários das lojas serão estendidos e mais setores do varejo físico poderão retomar atividades. Mas já vemos os primeiros sinais de uma certa ansiedade do consumidor, principalmente em categorias que o digital não abraça tão bem”, diz.
Para Eduardo, se até novembro tivermos um varejo físico pronto e seguro, provavelmente as lojas voltam a ter um protagonismo – talvez não tanto predominante quanto antes. Mas se por algum motivo houver uma extensão da quarentena, com limite de horário ao varejo físico, a expectativa é que o volume vá quase todo para o online, e aí cabe ao varejista dimensionar o tamanho da demanda para garantir a estabilidade da plataforma no dia.
A hora de se planejar é agora
Para quem acha que ainda é cedo para começar a pensar em Black Friday, Eduardo é categórico: “não só não é cedo, como já está tarde.”
Duvida? Ele cita o que aconteceu no Dia dos Namorados, quando alguns apps de delivery de comida ficaram fora do ar por horas devido à alta demanda em uma data muito menos crítica. “Está na hora de olhar para novembro e começar a se planejar, levando em conta diferentes cenários do mercado. Não dá para perder vendas porque o sistema saiu do ar”, diz.
Mas lembre-se: a BF é uma data que exige não só tecnologia, mas uma estratégia global. “O planejamento comercial tem que ser feito agora. É hora de pensar em quantidades, produtos e em toda a cadeia que está por trás.”
É verdade que fazer planejamentos a longo prazo agora não é tarefa fácil. “Um mês virou longo prazo, uma semana virou médio prazo. São cinco meses até a Black Friday, é muito cedo pra dizer como a gente vai estar lá”, admite Eduardo.
Mas o que é certo é que dentro das empresas a data deve ganhar ainda mais importância “Lá por novembro tudo o que o varejista vai querer é uma data forte e promocional, para alavancar vendas, porque não devemos ter cinco meses fáceis até lá.”
A dica é se planejar para usar a data como forma de desovar estoque e estimular as compras.
Para ir para o digital, pense digital
Eduardo diz que a pandemia fez com que nós adiantássemos cinco anos de transformação digital em cinco meses.
Essa aceleração ocorreu principalmente graças ao consumidor, que passou a ter hábitos mais digitais. Frente a isso as empresas reagiram, passando a direcionar mais investimento a iniciativas online, tirando projetos de ecommerce saíram da gaveta e perdendo o medo de testar coisas novas.
Afinal, quem nunca tinha comprado online antes, passou a comprar. Quem já comprava, passou a usar ecommerces para tudo. Foram 5 milhões de novos consumidores digitais só na América Latina.
O problema é que muitos varejistas pensam erroneamente que o cliente da loja se convertirá certamente em cliente do ecommerce. Mas isso é mito.
Eduardo explica que, ao migrar para o online, o cliente muitas vezes entende que outra marca tem uma proposta de valor mais interessante no mundo digital. Até porque outros fatores entram em jogo em compras online, como tempo de entrega, facilidade de troca, catálogo completo com fotos de alta qualidade, facilidade de pagamento, entre outros.
Por isso, é importante que varejistas tenham uma estratégia digital para:
Garantir que não perderão clientes do mundo físico.
Ganhar novos clientes com uma proposta de valor relevante no digital.
“É claro que empresas podem criar uma operação online mais imediata para se defender e tentar não perder clientes, mas a melhor opção é ir além e criar uma estratégia pensada para o digital para ganhar novos clientes. É claro que depois existe o desafio de fidelizá-los, mas isso é outra história.”
Transformação digital é para todos
Antes que você diga “essas dicas são para empresas grandes, meu negócio é pequeno demais”, Eduardo avisa: “transformação digital não é só uma agenda para grandes empresas, nem para ecommerces. É para todos.”
Ele ressalta que, por menor que seja o varejista, sempre é possível planejar e iniciar sua jornada de digitalização, mesmo que seja a passos mais lentos.
“Você pode começar fotografando seus 50 produtos mais vendidos e entregando o material para o vendedor acionar clientes pelos canais digitais, por exemplo”, diz. “Isso é digitalizar? Não. Mas é o primeiro passo. Depois, quando os clientes quiserem pagar, você precisará dar o segundo passo. O importante é começar.”
E lembre-se: ainda faltam cinco meses para a Black Friday, tempo suficiente para tirar muita coisa do papel. Por isso, Eduardo aconselha empresários a colocar o evento como uma “linha de chegada” para iniciativas digitais
“Dê a você mesmo a meta de realizar todas as iniciativas que possam potencializar vendas e resultados até a BF. O deadline vai te ajudar a acelerar as coisas e, depois do evento, você terá um negócio muito mais versátil.”
Vale lembrar que o potencial do mercado online é enorme. No Brasil, há 230 milhões de smartphones, 150 milhões de usuários de WhatsApp e 80% de casas com acesso à internet.
E apesar de a adoção aos canais digitais ter sido inflada pelo fechamento das lojas, muita gente deve manter os hábitos de compra online mesmo depois do fim de pandemia.
De janeiro para maio, o ecommerce cresceu 60%, representando hoje 5,8% do varejo brasileiro. Até o fim do ano, a taxa deve bater os 8%. Essa penetração já é muito maior em países como a China (30%), Inglaterra (20%) e Estados Unidos (15%).
“Muita empresa acordou para o mundo digital, mas pandemia não fez surgir nenhuma tendência nova, ela só serviu como catalisador para o que já estava acontecendo. Ainda há muito espaço para crescer”, diz.
E as lojas, como ficam?
Mas depois de tanto tempo em isolamento social, e com tantas marcas investindo em presença digital, como ficam as lojas físicas?
Para Eduardo, a pandemia deixa claro que o varejo como conhecíamos morreu. Podemos esquecer as lojas que abriam às 8h, onde vendedores esperavam os clientes chegar.
Os vendedores nunca mais serão passivos: eles chegarão ao trabalho já ativando clientes nos diversos pontos de contato que existem, como WhatsApp e redes sociais.
Os estabelecimentos físicos também continuarão sendo importantes para a capilaridade, permitindo ao comerciante estar presente em diversos locais, com ponto físico que gera experimentação para o consumidor e traz a conveniência de centro de troca e retirada.
O que deve mudar são as redes que têm muitas lojas próximas, super concentradas, como acontece com algumas cadeias de farmácia. “Não dá para negar que as lojas cumprem um papel importante no que chamamos de omnicanalidade, mas vamos começar a questionar a quantidade de lojas por região, talvez o metro quadrado de loja física”, diz Eduardo.
Ele ainda considera que, com um modelo de trabalho mais amigável ao home office, e com algumas empresas anunciando que adotarão o trabalho remoto definitivamente, muitas pessoas podem deixar os centros urbanos para morar em cidades periféricas – um pouco do que já se vê nos Estados Unidos.
“E o que a gente vai fazer com esse monte de metro quadrado de varejo que está em centros urbanos onde as pessoas costumavam estar? Vamos ter que reavaliar o tamanho e o papel que terão as lojas físicas no pós pandemia.
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Fonte: Adyen