Ariel Grunkraut, VP de Marketing e Vendas do Burger King Brasil, fala sobre as mudanças nos negócios que vieram com a pandemia
A pandemia provocada pelo novo coronavírus fechou restaurantes, derrubou as vendas e obrigou todo mundo a se reinventar, do comércio de bairro a um gigante multinacional como o Burger King. Em geral, o tombo foi grande. No segundo trimestre deste ano, a receita operacional líquida do BK Brasil (que inclui Burger King e a rede Popeye’s) caiu 56,7% em relação ao mesmo período de 2019. A queda só não foi maior por causa dos canais digitais, como delivery e vendas por app, que registraram aumento de 216,8% e atingiram 36,9% da receita total da empresa no segundo trimestre de 2020.
Como a pandemia influenciou no seu processo de transformação digital?
A transformação digital foi extremamente representativa para o negócio, uma vez que lidamos – e continuamos lidando – com uma migração extremamente veloz nos canais de vendas. Vislumbramos, no início da pandemia, que nosso dine in cairia e, por isso, as pessoas parariam de consumir dentro dos restaurantes. Consequentemente, os canais de drive-thru, take out e delivery seriam alavancados. A partir dessa visão antecipada, que é proveniente de uma operação global, pudemos entender como se daria o desenvolvimento do mercado, já que a pandemia estava em estágios diferentes nos países em que atuamos. Nesse contexto, tivemos tempo de nos estruturar com os parceiros de logística de delivery e aumentar ainda mais as ofertas que tínhamos disponíveis. Como resultado, obtivemos um crescimento importante das vendas via universo digital e aceleramos a parceria com novos agregadores. Além disso, investimos em nossos próprios canais de vendas (aplicativo próprio).
Outro ponto que podemos destacar como uma oportunidade de negócio advinda do cenário pandêmico é a seguinte: sabemos que o hábito de compras via aplicativo no Brasil ainda está em desenvolvimento e estamos todos fazendo parte desse processo. Tivemos um aumento importante de cadastros e downloads do nosso app – mas sabemos que a maior parte é para acessar os cupons de desconto. Por isso, contemplamos como estratégia no curto prazo aumentar, ainda mais, a funcionalidade de pagamento e estimular vendas neste canal. Outro processo acelerado foi nosso projeto de CRM, que possibilita entendermos cada vez mais nossos consumidores, fazendo com que possamos enviar pushes específicos para cada hábito de consumo.
Outro ponto de transformação digital é relacionado ao atendimento ao público e diminuição do contato entre colaborador e consumidor. Neste momento, temos totens de autoatendimento em 168 lojas Burger King, divididos entre totem regular e totem de balcão. Estamos aprimorando ainda mais os nossos sistemas para garantir um atendimento cada vez mais rápido e funcional para os consumidores. Antes, os totens eram um ativo para oferecer um atendimento mais rápido, principalmente quando os restaurantes estavam cheios. Hoje, compreendemos que é um canal essencial para contemplarmos os novos hábitos de consumo em nossa operação. Quase todas as nossas maquininhas de cartão já funcionam via contactless e sabemos que essa é uma solução viável para garantir uma experiência ainda mais segura. Estamos implementando em todo o Brasil, também, uma modalidade chamada drive contactless, em que o consumidor faz a compra via aplicativo e retira via drive-thru.
Quais mudanças feitas ou pensadas agora permanecerão no pós-pandemia?
Acreditamos que a transformação digital – como um todo – veio para ficar. As empresas puderam oferecer ainda mais opções para os consumidores, com possibilidades que fizessem sentido para os diferentes perfis de pessoas. Pelo menos no Burger King, em relação a todos os processos criados e aprimorados para garantir experiências positivas e seguras para o público, não haverá retrocesso. Nós sabemos que os consumidores voltarão a frequentar lugares públicos e a conviver em sociedade, mas haverá um atendimento de ponta caso ele opte por fazer um pedido via delivery, e isso é essencial para que ele esteja próximo de nossa marca. Nós estaremos ali para ele, entregando o nosso melhor, independentemente da opção feita naquele momento.
Como investir em transformação digital enquanto, para muitas empresas, os recursos evaporaram de um dia para o outro?
Uma realidade do mercado, infelizmente, é de que as empresas menores realmente não tiveram tempo de se adaptar ao processo de transformação para atender o seu público. Nós compreendemos que, neste momento, para a saudabilidade dos negócios em geral, é essencial oferecer possibilidades de atendimento a distância – quando possível – e fazer com que os clientes se sintam acolhidos e abraçados, principalmente em um momento tão desafiador. As redes sociais, por exemplo, são uma importante ferramenta para se estar próximo dos consumidores. A abertura de uma conta no Instagram ou Facebook são uma possibilidade para as empresas que não têm verba para uma completa transformação digital. É necessário ter um plano de partida! Fidelizar os clientes por meio desses ativos e pontos de contato, com um bom atendimento, é uma opção latente e importante. Sabemos sobre a transformação nos hábitos de consumo que se tornou uma tendência antes mesmo da pandemia: as pessoas se conectam com marcas que estejam em linha com seus propósitos de vida. Portanto, as contas digitais são um caminho para criar identificação e elos fortes com o público-alvo.
É o momento para testar novas ideias?
Esse é um momento delicado para arriscar, mas, ao mesmo tempo, sabemos que quem não se atentou e/ou adaptou às transformações que aconteceram nos últimos meses ficou para trás. Em contrapartida, as novas ideias são o combustível do mercado e, por isso, temos consciência de sua importância para o mundo. É essencial ponderar os prós e os contras, o fluxo de caixa, a solidez do negócio, a fidelidade do seu público e, depois disso, se jogar rumo às novas possibilidades. Funciona como uma equação e é preciso equilíbrio, mas não é impossível colocar as ideias inovadoras em prática neste momento.
Qual conselho o senhor dá para quem está passando pelo dilema de ter de fazer a transformação digital no meio da pandemia?
A transformação digital é a única certeza que temos neste momento desafiador. Sabemos que a pandemia nos movimentou para o estado de distanciamento social e que, se não conseguirmos atender os nossos consumidores nesse novo formato, não teremos um negócio. Portanto, se eu posso dar um conselho às pessoas que estão fazendo a gestão de uma empresa é: esteja atento aos movimentos do mercado, se inteire sobre a economia, compreenda seu público e olhe para o futuro. Se, ao olhar para frente, você enxergar que a transformação digital faz parte do que vem por aí e se você tem condições de implementar soluções tecnológicas em seu negócio, não deixe de ponderar essa possibilidade. É necessário ser inquieto e, se preciso, se reinventar.
Fonte: Estadão