Na apresentação institucional mais recente do Burger King para investidores, do fim de 2020, “marca forte” aparece como um dos pilares estratégicos da companhia. A mesma apresentação aponta uma pesquisa que mostra que a preferência de marca subiu 14% entre o último trimestre de 2017 e o mesmo período de 2018, chegando a 33% do público.
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Em 2011, logo depois de adquirir o Burger King junto com seus sócios Marcel Telles e Jorge Paulo Lehman, Beto Sucupira falou sobre a marca em um evento da Endeavor:
“Eu cheguei à conclusão de que a marca [Burger King] é muito mais forte do que a gente achava. O Burger King não é uma companhia grande. É um negócio que, em todos os sentidos, é menos da metade das Lojas Americanas… Mas a repercussão que teve! Eu tenho amigos em vários lugares do mundo e a notícia saiu em todos esses países. Ora, se você tem um conhecimento muito grande [da marca] e você tem um faturamento que não é do tamanho desse conhecimento, significa que você tem uma oportunidade muito grande aí…”. Li a citação no livro “Sonho Grande”.
No início de 2021, o Burger King anunciou que estava atualizando o design da marca. A primeira atualização em 20 anos. Mas a estratégia de marca que levou a hamburgueria ao topo continua valendo: uma estratégia ousada, que podia ter dado bastante errado se não fosse tão bem construída.
O Burger King enfrenta uma das marcas mais valiosas do mundo, o McDonald’s, com sua uma comunicação inocente e romântica que remete à nostalgia da infância e ao mundo sem problemas. Para o combate, o BK escolheu o extremo oposto: tirar sarro e fazer palhaçada. Sua comunicação segue, segundo a teoria de marketing, o arquétipo do Bobo da Corte (ou Joker) e tem o objetivo de nos entreter e fazer rir, mas também falar as verdades que precisam ser ditas.
O grande perigo deste arquétipo, que pouquíssimas empresas têm a coragem de adotar, é fazer da marca um grande valentão praticando bullying contra os outros, já que é permitido tirar sarro e zoar. E o Burger King é bastante famoso pelas suas tiradas de sarro com o Méqui, você sabe. Uma das ações mais agressivas talvez tenha sido incentivar os consumidores a queimar anúncios do McDonald’s virtualmente em troca de sanduíches. Como alguém consegue se safar e aumentar a preferência de marca depois de uma agressão dessas?
A genialidade é que, ao mesmo tempo em que assume o risco e faz algumas maldades com a concorrência, a marca faz hedge com ações que a protegem da percepção de alguém mau.
No ano passado, o Burger King começou a apoiar o futebol feminino e, inclusive, mudou sua marca para “Burger Queen” no uniforme. Para quem não acompanha o futebol feminino, em 2020 a discussão no esporte era de como é absurdo os times femininos terem bem menos patrocínios e apoio da mídia do que os masculinos.
Em 2014, a rede de restaurantes lançou o Proud Whopper em apoio à parada gay. A sacada é que o Proud Whopper é exatamente igual ao Whopper original, com um ponto bastante inteligente e sagaz aqui: mostrar que não há nada de diferente em ser gay. Desde então, eles apoiam o movimento LBGTQIA+ e ousaram outra vez com um poster do seu mascote dando um beijo no Ronald (mascote de quem?), com a frase “o amor conquista tudo”.
O mais interessante é que, apesar de bater constantemente no McDonald’s, no McDia Feliz o Burger King faz questão de apoiar a causa e incentivar seus clientes a comerem na concorrência. Abusados e ousados contra si mesmos, não?
É assim, enfrentando a concorrência com humor e sarcasmo, mas defendendo as minorias, que o Burger King vai aumentando sua preferência de marca trimestre a trimestre, ao mesmo tempo em que acompanha as mudanças culturais e de atitudes em seus produtos, com opções veganas e mais saudáveis.
Aliar-se a quem a sociedade considera mais frágil, ou seja, as minorias, faz com que a marca não seja percebida como malvada, como anti-herói, e sim como uma marca que promove o bem, com atitudes consideradas meras brincadeiras, mas que dizem muito.
A ousadia, nesse caso, se paga. Afinal, bom produto e marca forte são ingredientes poderosos capazes de levar empresas ao topo.
Guta Tolmasquim é estrategista de marcas e CEO da Brand Gym, empresa especializada em branding para empreendedores.
Fonte: Exame