Na esteira do novo momento vivido pelo segmento supermercadista, surge também um novo perfil de shopper, muito mais exigente e que demanda uma entrega rápida e eficiente. Além disso, as lojas que passaram a atender pedidos virtuais se depararam com grandes desafios de gestão de estoque.
Um dos pontos mais complexos é garantir a coleta de um produto na gôndola, para atender a uma venda digital, sem que isso resulte em ruptura desse mesmo item nas compras realizadas em loja física.
Foi para resolver essas e outras necessidades que nasceram as dark stores – solução que de obscura não tem nada. “Trata-se de estruturas físicas situadas em perímetros com alta densidade populacional, adequadas para a armazenagem, a preparação e o despacho de pedidos, em diversas categorias”, explica o co-founder da Flexsas, Franz Bories, que oferece serviços de logística sob demanda. Em outras palavras, as dark stores são uma espécie de loja sem fachada e fechada ao público, com um estoque exclusivo para as vendas digitais.
“O termo dark store ainda não é tão conhecido no Brasil. Contudo, percebe-se que diversas empresas estão configurando operações que refletem algo muito próximo ao conceito, como centros de distribuição urbanos, micro-hubs ou centros de fulfillment”, diz, trazendo como exemplo os clubes de assinatura de vinhos e cervejas, além de varejistas que trabalham com o conceito de entrega expressa e, por isso, exigem hubs de apoio, como o Magazine Luiza.
Especificidades do varejo alimentar
Acontece que, quando se pensa em produtos perecíveis, a questão complica bastante. “Assim como as operações logísticas tradicionais dos centros de distribuição, quando se trata de alimentos de baixo shelf life, o mesmo se aplica às estruturas urbanas das dark stores”, orienta Bories. “Atendendo às especificações legais e sanitárias, pode-se ter uma operação fluida na distribuição de alimentos também.”
Por viabilizarem que o varejista atue com mais um canal de distribuição, as dark stores reduzem o tempo de entrega ao público final. “Atualmente, há uma forte demanda por entregas mais acuradas, ágeis e a preços mais atrativos, fatores diretamente associados às dark stores, visto que elas permitem maior eficiência, com entregas no mesmo dia ou no dia seguinte, atendendo às novas exigências do consumidor pós-pandemia.”
Bories ainda pontua que a logística 4.0 só tem a agregar nesse conceito. “Hoje observamos modelos de automação nos processos de picking e packing de produtos, barateando os custos na manutenção de estruturas como essas, além de sistemas que permitem maior eficiência no processo de gestão de estoque, preparação e entrega de pedidos. Além disso, dependendo da configuração da dark store, o modelo permite que algumas empresas complementem a frente de negócio, oferecendo aos clientes a possibilidade de retirada no local.”
Precisa ser grande para ter uma dark store?
Não necessariamente. “Quando utilizada para atender a demanda de aplicativos e plataformas, como iFood, Uber Eats e Rappi, se torna algo factível para o pequeno varejo”, responde Bories.
As perguntas que você precisa se fazer para entender se deve adotar o formato ou não, segundo o especialista, é se o seu público-alvo realmente necessita de entregas expressas e se o volume de compras online justifica o investimento.
Natural da Terra: formato ajuda a testar presença em novas localizações
“Diante do cenário da disseminação da covid-19, o Hortifruti Natural da Terra passou por um processo significativo de expansão digital. Durante os primeiros meses de isolamento, o aumento de pedidos para delivery aumentou cerca de 1000%”, revela o CEO da rede, Thiago Picolo, explicando o motivo pelo qual começaram a desenhar o projeto de dark stores na empresa.
As duas primeiras unidades foram inauguradas em junho deste ano, uma no bairro de Santana, em São Paulo; a segunda na região do Méier, no Rio de Janeiro. E ainda há outros espaços dentro do mesmo formato em processo de finalização nas duas capitais. As já existentes atendem com exclusividade pedidos feitos por WhatsApp ou pelos parceiros Rappi e Supermercado Now.
“No espaço de São Paulo, outra alternativa que oferecemos é a modalidade do ‘clique e retire’”, diz, lembrando que a utilização de uma dark store pode ir além quando se trata de otimizar as operações.
“As dark stores funcionam como uma loja com gôndolas, bancas e refrigeradores. Elas possuem um sortimento mais adequado ao modelo de delivery, englobando todas as categorias de uma loja física.”
O executivo conta que, além de ter baixo custo e entregar mais eficiência no atendimento ao cliente, a iniciativa ajuda a testar a operação em novas localizações. “As dark stores ajudam a avaliar a possibilidade de abertura de futuras lojas em regiões onde, em um primeiro momento, a companhia não planejava ter unidades físicas.”
Carrefour: evolução do formato
Logo no início da quarentena, o Carrefour experimentou uma explosão de acessos online. “Nas últimas semanas de março, tivemos volumes de vendas próximos a uma Black Friday. Contudo, era uma Black Friday não esperada. O crescimento no trimestre para o e-commerce representou um salto de três anos no período”, conta o diretor de food e-commerce do Grupo Carrefour Brasil, Bruno Machado.
Para ampliar a capacidade de entrega, a operação de uma dark store, inaugurada em 2017 no espaço de uma loja desativada no bairro do Brooklin, em São Paulo, quando foi lançado o e-commerce do Carrefour, precisou evoluir ainda mais.
“Aprimoramos esse modelo para atender ao e-commerce com dez side stores – minicentros de distribuição acoplados à loja física para pedidos digitais – estrategicamente localizadas. Assim, conseguimos ter um centro de distribuição próximo aos centros urbanos e facilitar o envio de mercadorias para as compras feitas por aplicativo ou site.”
Machado ainda revela que, para acompanhar os milhares de pedidos, foi preciso contratar mais de cinco mil colaboradores com turnos ampliados.
No segundo trimestre do ano, o resultado do e-commerce se destacou em termos de receita comercial. “Tivemos um impressionante crescimento de 377% no GMV de alimentos e 65% em não alimentos, com um total de R$ 918 milhões de GMV. A participação dos canais online segue crescendo, representando 7,7% das vendas de alimentos do varejo.”
Para o executivo, a excelente localização, a disponibilidade de produtos frescos e a equipe de shoppers treinada para atender às demandas dos apps parceiros fazem toda a diferença. “Estamos constantemente aperfeiçoando nossa infraestrutura para entregar ao cliente soluções diferentes, de acordo com o estilo de vida de cada um, facilitando a entrega.”
Acopladas aos hipermercados e utilizadas apenas para a retirada de itens comprados pelas plataformas do Carrefour ou via Rappi e Cornershop, as side stores do grupo estão presentes nas cidades de São Paulo, Curitiba, Brasília, Belo Horizonte, Porto Alegre, Valinhos e Rio de Janeiro. Elas têm cerca de mil metros quadrados e capacidade para armazenar diversos itens, incluindo frutas e legumes, açougue, peixaria, perfumaria, cereais e alimentos perecíveis.
Fonte: SuperVarejo