A redução do valor do auxílio emergencial e o aumento da inflação, que reduziu o poder de compra, foram alguns dos fatores que impulsionaram esse movimento.
Já em dezembro, há sinais de um movimento positivo também para os supermercados. Com o novo avanço no contágio da covid-19, as pessoas tendem a evitar aglomerações no Natal e réveillon, aumentando a demanda por alimentos para consumir em casa, de forma geral.
Mas em 2021, sem auxílio emergencial, com índices de desemprego ainda altos e pressão inflacionária, a expectativa de analistas do setor é que, cada vez mais, consumidores migrarão as suas compras para o atacarejo.
“O diferencial terá a ver com a relação de custo-benefício da compra. Não é só ser barato. E um canal que tem vantagem competitiva é o atacarejo. Nas últimas semanas estamos vendo um crescimento muito expressivo, de novo, nessa categoria e, no ano que vem, ela vai ser beneficiada por isso”, afirma Roberto Butragueño, diretor de atendimento ao varejo da empresa de pesquisas Nielsen.
Segundo números da Cielo, em novembro houve alta de 7,9% nas vendas nominais de supermercados e hipermercados sobre igual período de 2019, a menor taxa de crescimento dos últimos 12 meses. Ao se deflacionar o índice, há recuo de quase 11%, também o pior desempenho em um ano.
Em relatório sobre a recuperação do varejo publicado neste mês, a agência da classificação de risco Fitch Ratings afirma que, para 2021, é esperada “uma normalização do ritmo de consumo do setor alimentar”, com o segmento de atacarejo “sendo o principal foco de expansão das grandes redes”.
Os balanços de grandes grupos como Carrefour e GPA já mostravam diferenças no fôlego dos segmentos na comparação entre os três primeiros trimestres do ano.
Entre julho e setembro, as vendas do Atacadão, controlado pelo Carrefour, cresceram 15% ante o segundo trimestre. No braço de varejo da companhia, houve queda 4,75%. No GPA, a receita bruta da rede de atacarejo Assaí subiu 12%, enquanto nas bandeiras de varejo Pão de Açúcar e Extra houve queda de 10% no terceiro trimestre em relação ao segundo.
Gisele Paolino, diretora da Fitch, diz que esse descompasso reflete a maior presença de pessoas físicas no atacarejo, além da retomada de atividades de pequenos e médios serviços de alimentação, como bares, restaurantes e cafeterias.
O presidente da Associação Paulista de supermercados (Apas), Ronaldo dos Santos, concorda que houve acomodação nas vendas após a reabertura dos serviços. “O crescimento significativo do comércio nos últimos meses demonstra que boa parte da renda familiar foi redirecionada agora para fora dos supermercados”, diz.
Já os relatórios da Abad, a associação de atacadistas, mostram crescimentos nas vendas mensais desde início da pandemia. Em outubro, houve expansão real de 2,76% nas vendas no país.
“Está havendo uma nova migração de clientes ao ‘cash&carry [atacado]’”, diz um executivo do varejo que recebeu a pesquisa da Abad semanas atrás. O movimento de migração anterior a este foi na crise de 2015 a 2017, quando a recessão reduziu renda e fez os atacarejos ganharem milhares de novos clientes. Foi neste movimento que redes como Assaí e Atacadão se tornaram os canais prioritários de expansão de GPA e Carrefour.
Desde então, a diferença de ritmos de expansão entre varejo e atacarejo vem sendo observada. A questão é que o “gap” entre as taxas de crescimento dos dois segmentos tinha diminuído na pandemia durante o auge das medidas de isolamento social, quando os supermercados cresceram de forma acelerada. Agora, essa diferença volta a aumentar, com a normalização das taxas de expansão.
Em dezembro, especialistas ouvidos afirmam que o consumo tem se concentrado especialmente em itens para a ceia caseira, voltada para pequenos grupos familiares, por conta das restrições com a covid-19. Isso pode ter efeitos positivos tanto para supermercados quanto para atacarejos.
“No Natal, mesmo em pequenos grupos, haverá o consumo em casa. E o réveillon também deve ser uma comemoração com grupos menores nas residências, em casas de praia, e isso pode levar a um aumento de demanda por alimentos e bebidas”, diz Antonio Salvador, professor e ex-executivo do varejo alimentar. “Mesmo nas viagens para interior ou para praia, é pouco provável que tenhamos um consumo forte em bares e restaurantes, pelo risco do contágio. Os contatos do setor [alimentar] têm me dito que dezembro tem sido positivo.”
Para a rede que fundou, a Condor Super Center, com sede em Curitiba, Zonta projeta uma expansão de 12% nas vendas em dezembro – a mesma taxa de crescimento prevista para 2020.
O empresário não acredita numa desaceleração mais forte das vendas em 2021, com o fim do auxílio emergencial. “Creio que a recuperação paulatina do PIB vai acabar favorecendo a demanda.”
Fonte: Valor Econômico