O Groupe SEB — multinacional que comprou a Arno em 1997 — prepara a transferência de sua fábrica de eletroportáteis de São Paulo para o Rio. Em novembro, a unidade deixa o bairro paulistano da Mooca, onde está há 70 anos, e se instala em Itatiaia, no Sul Fluminense. Vem atrás de melhores condições em instalações, logística e, com isso, ganhos em produtividade e redução de custos. A mesma motivação levou o Grupo Pão de Açúcar a inaugurar um centro de distribuição integrado em Santa Cruz, na Zona Oeste do Rio, em junho.
O vaivém nos chamados galpões logísticos — como são chamados os espaços construídos para receber operações como fábricas, centros de distribuição (CD) e armazenagem — está acendendo um farol no segmento no Estado do Rio. Empresas especializadas no setor já registram aumento em consultas para locação. O movimento está em linha com a melhora nas expectativas dos empresários do comércio e da indústria, dois segmentos que já registram tímidas taxas de crescimento.
O desempenho da economia no segundo trimestre do ano já mostrou reação do investimento, que teve a primeira taxa positiva após dez trimestres de queda, com variação de 0,4%. No primeiro semestre, a taxa de vacância na área de galpões logísticos no estado se manteve em 19%, apesar do aumento da oferta total desses espaços ter crescido em 45 mil metros quadrados do primeiro para o segundo trimestre, para 1.518 milhões de metros quadrados, segundo a consultoria Colliers International Brasil.
A taxa de vacância em galpões logísticos no Rio é histórica. Em 2012, era de 9%. Ano passado, chegou a 15%. Houve grande aumento da oferta e freio na demanda devido à crise. Mas a manutenção dessa taxa de 19% já é uma ótima notícia, ainda mais considerando que o inventário total cresceu — destaca Paula Casarini, vice-presidente da consultoria.
De abril a junho, a vacância média do segmento no país foi de 25%; em São Paulo, de 28%. Em valor do metro quadrado para locação, as instalações fluminenses têm preço médio de R$ 23, empatado com estado do Amazonas e atrás apenas do Distrito Federal, de R$ 25.
No Rio, o saldo entre os novos espaços contratados e os devolvidos foi de 35.748 metros quadrados de abril a junho. No Brasil, esse resultado ficou negativo em 6.492. Em São Paulo, ficou em negativo em 71.660 metros quadrados.
Paula explica que a recessão atingiu o segmento de logística, sobretudo devido à queda no consumo:
Com a retração no consumo, as grandes redes de varejo precisam se desfazer de estoques e frear a produção. Isso levou muitas empresas a devolverem áreas logísticas. De outro lado, a alta vacância garante aos ocupantes mais opções de espaços e mais força na hora de negociar valores e contratos, permitindo reduzir custos.
No Rio, apesar de o preço médio ser de R$ 23, chega a R$ 35 na Avenida Brasil e desce a R$ 18,60 o metro quadrado em Queimados, onde a taxa de vacância é de 40%.
Investidores são cautelosos, mas mantêm o apetite. O Pátria Investimentos, de gestão de ativos, lançou há um ano o Complexo Logístico Multimodal de Itatiaia, projeto de R$ 300 milhões, entre Rio e São Paulo, que terá 230 mil metros quadrados para locação no total. Já abriga três empresas. A fábrica do Groupe SEB vai ocupar uma parte do complexo.
Na área de logística, grande parte do estoque de espaços é ruim, pouco atualizado e está no lugar errado porque a cidade cresceu. A localização é fundamental — diz Fauze Barreto Antun, sócio da área imobiliária do Pátria Investimentos.
“Não é mais viável manter uma fábrica na região central de São Paulo, com perfil urbano e com dificuldades operacionais e logísticas”, explicou o Groupe SEB por meio de nota.
O Grupo TRX vai construir em Santa Cruz um condomínio. Em fase final de licenciamento, receberá aporte de R$ 140 milhões. E terá 95 mil metros quadrados de área para locação.
Fizemos um estudo de demanda da região e buscamos terreno com as melhores condições para construir. O condomínio tem tamanhos flexíveis de espaço, permite rateio de custos entre os ocupantes — conta Roni Katalan, à frente da TRX Incorporadora.
MELHORA NAS EXPECTATIVAS
Foi no bairro da Zona Oeste do Rio que as empresas do GPA, a varejista Via Varejo — Casas Bahia e Ponto Frio — e a Cnova, que cuida do comércio eletrônico do grupo, abriram novo centro de distribuição (CD), em junho. O projeto de R$ 5 milhões é o segundo CD da Via Varejo no estado. O outro fica em Duque de Caxias. O projeto integrado permite gerar mais produtividade por metro quadrado e reduzir custos fixos.
No primeiro semestre, tivemos quatro consultas e duas delas estão em andamento. A demanda é principalmente do setor de varejo — diz Octavio Pires Vaz Filho, sócio-diretor da gestora Áquilla, focada em condomínios logísticos no entorno do Arco Metropolitano.
A Mercatto, carioca de moda feminina, mantém fábrica e centro de distribuição em Duque de Caxias.
Investimos em automatização dos processos de armazenagem e distribuição, o que trouxe ganhos em produtividade. Renegociamos valores de aluguel para fazer ajustes no curto prazo, sem reduzir o espaço de operação — conta o diretor da marca Renato Cohen.
Leonardo Coelho, diretor especialista em varejo da consultoria Alvarez&Marsal, acredita que a recuperação da demanda no varejo depende de um incentivo ao consumo que só virá com garantia e maior oferta de emprego:
Ainda que a economia comece a dar sinais positivos, o consumo demora mais a se movimentar. As empresas só devem rever capacidade logística no fim de 2017.
Carlos Thadeu de Freitas, economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC), explica que o setor de espaços logísticos reflete uma melhora nas expectativas dos empresários.
A partir de abril houve um momento de virada, pela expectativa de mudança de governo e de retomada da governabilidade do país, melhorando a confiança. Quando consultados sobre em que planejam investir, os empresários já falam em logística e estoque. Mas tudo depende de melhora nos ambientes de negócios e de trabalho.
Em junho, as vendas do comércio ficaram estáveis, com variação de 0,1% sobre o mês anterior. Em maio, houve queda de 0,9%, segundo o IBGE. Na indústria, o panorama não é muito diferente. Em julho, a produção industrial avançou 0,1%, o quinto resultado positivo seguido na comparação com o mês anterior. Nesses cinco meses, o crescimento acumulado é de 3,7%, mas ainda não compensa a perda de 2015, que foi de 8,2%.
O setor equilibrou os estoques, avançou a partir das exportações ou pela substituição de importações, beneficiadas pela desvalorização cambial, mas agora está numa encruzilhada, dependendo de melhores condições na economia para que a demanda volte a crescer. Sem isso, a indústria vai andar de lado — avalia Aloisio Campelo Junior, superintendente de Estatísticas Públicas do Ibre/FGV.