Após se desfazer do direito de licenciamento da marca de artigos esportivos Mizuno, a companhia anunciou este ano a venda da marca de luxo Osklen
Por Raquel Brandão
Depois de uma série de desinvestimentos, a Alpargatas deve se preparar para uma nova fase de aquisições. “Nossa visão não é de ser uma empresa monomarca. Esse é um mercado que tem segmentos atrativos e, com portfólio certo de marcas, tem onde ganhar muito valor”, disse o presidente do grupo, Roberto Funari, em apresentação a investidores.
Após se desfazer do direito de licenciamento da marca de artigos esportivos Mizuno, a companhia anunciou este ano a venda da marca de luxo Osklen.
“O primeiro passo foi desinvestimento e foco em Havaianas”, disse Funari, destacando a entrada da marca em categorias que vão além dos chinelos.
O executivo, no entanto, dizem que não há uma pressão para que a empresa vá às compras. “Nossa missão é ser uma ‘power house’ de marcas desejadas, mas não tenho pressão”, disse.
O executivo também não detalha quais devem ser os alvos dessa estratégia.
“Vamos fazer M&A [sigla em inglês para fusão e aquisição] sempre com disciplina financeira muito grande, com olhar muito forte em pessoas e talentos e, na terceira vertical, olhando para sistemas”, afirmou, acrescentando que as estratégias digitais da companhia a colocam com vantagem para incorporar novas marcas.
No evento, a companhia anunciou o lançamento de um aplicativo para criação de Havaianas personalizadas, que deve acontecer até o fim do primeiro semestre de 2022, além de, no primeiro trimestre, uma nova plataforma on-line de vendas para o varejista e distribuidor [B2B, business to business], com dados para melhorar as escolhas de compra do parceiro.
Além disso, a Alpargatas buscou reforçar a mensagem de que quer ser cada vez mais global. Com participação de 3% do mercado global de chinelos (flip-flops), a companhia quer chegar a uma fatia de dígito duplo, disse o presidente do grupo.
“Temos ambição de ganhar participação no mercado de calçados globais”, disse Funari, indicando que a companhia também quer ir além dos chinelos de dedo.
No Brasil, a marca Havaianas vem ampliando seu portfólio com lançamento de sandálias, tênis, acessórios e mesmo algumas peças de vestuário. O plano é que esse catálogo além dos chinelos também ganhe mercado no exterior, começando pelas sandálias.
“Nossa participação de mercado internacional é de 3%, demos um salto de 1 ponto percentual [de 2018 para 2021]. Temos oportunidade de crescimento gigantesca e já somos a marca líder. A meta é ser double digit [dígito duplo]. Nada mais justo do que almejar nos próximos cinco a dez anos termos em sandálias a mesma participação que já temos em flip flop”, disse Funari.
Hoje a empresa tem 0,4% de participação de mercado em sandálias.
Nos últimos 12 meses, a companhia vendeu 30 milhões de pares de Havaianas no mercado externo, 30% mais do que em 2020 e 9% acima de 2019. O aumento de receita foi de 39% na base anual e de 56% ante 2019, somando R$ 1,2 bilhão. De acordo com Funari, hoje a operação internacional responde por 32% da receita, e a meta é chegar a 50%, mesmo com crescimento do mercado interno.
Frédéric Lévy, presidente da operação internacional de Havaianas, destacou que grande parte da estratégia de expansão da companhia passa pela ampliação do canal digital.
No mercado Europeu, com destaque para França, Itália, Reino Unido e Espanha, a companhia espera ampliar não só as vendas de chinelos, na qual é líder de mercado, mas também das outras categorias, cuja meta é que sejam 20% das vendas totais em volumes. Testes com esses produtos começaram a ser feitos na Itália, explicou Lévy.
“Nos Estados Unidos, o foco é no flip-flops, não vamos lançar beyond core [categorias além dos chinelos] no curto prazo, mas considerando a possibilidade a partir de 2024 ou 2025. Objetivo é ser líder em flip-flops. Já a China é o mercado mais fragmentado em que operamos, então vemos oportunidade de crescer”, acrescentou Lévy, adicionando que, no país asiático, a companhia trabalha para fortalecer a marca.
Preços
A direção da Alpargatas vê espaço para abocanhar mais participação no mercado nacional e até aumentar preços, devido à força da marca. “Ainda tem espaço para aumentar preço, porque temos uma marca muito elástica, como são as de tabaco e bebida premium”, disse Ana Bogus, vice-presidente da Havaianas Brasil.
A marca é dona de 13% do mercado total de calçados no país, que movimenta mais de R$ 40 bilhões. A meta, diz a executiva, é chegar a 20%. Em chinelos, a marca é dona de 59% do mercado.
Para isso, a companhia tem alguns planos estratégicos, que passam pela consolidação na liderança do varejo alimentar — a companhia têm venda expressiva em supermercados —, ritmo mais intenso de abertura de lojas próprias e fortalecimento da operação digital.
“Vamos ter ‘dark stores’ [lojas só para entrega de produtos] espalhadas no Brasil para ter mais agilidade nas entregas de vendas digitais”, disse.
O cenário macroeconômico, porém, vai exigir ainda mais trabalho da companhia na gestão de volumes e reajustes. De acordo com a vice-presidente de supply chain, Simone Franco, um alívio nos custos só deve ficar mais evidente a partir do segundo semestre de 2022.
“Para frente, vemos um segundo semestre de 2022 mais leve do que vamos ter nesse primeiro trimestre, que ainda tem a inércia e um impacto de custo mais alto do petróleo nesse fim de ano”, explicou.
Ela acrescentou que a companhia, apesar dos problemas nas cadeias de fornecimento, conseguiu adaptar sua rede de fornecedores e não sentiu falta de insumos em suas fábricas desde o início da pandemia.
O vice-presidente de finanças, Julian Garrido, afirmou, no entanto, que mesmo com o ambiente inflacionário a companhia vai “passar bem”, sem ter grandes impactos na demanda.
“Temos ‘price points’ muito democráticos para nos ajudar nesse impacto de demanda. Turbulência vai vir, mas com a força da marca vamos passar bem.”
Fonte: Valor Econômico