Plataforma chinesa passa a aceitar vendedores brasileiros no marketplace. Executivo rebate críticas sobre falta de transparência, mas não abre investimentos
Por Sérgio Vieira
Sempre à chinesa. Em silêncio. A plataforma AliExpress abriu dia 16 seu marketplace para os sellers do Brasil, de olho em um mercado que movimenta pouco mais de R$ 100 bilhões ao ano e que tem grande potencial de crescimento. Antes da entrada oficial, foram duas semanas de testes, já dando acesso de vendedores à loja on-line. “É um momento histórico para todo o grupo Alibaba. Para nós, globalização e localização estão de mãos dadas”, disse o turco Yaman Alpata, diretor de marketplace da AliExpress na América Latina, que precisou de tradutor para compreender a língua do país que pretende desbravar. Provavelmente por confiar na única língua universal: o comércio.
O principal benefício para convencer os vendedores brasileiros a migrar para a plataforma digital da empresa asiática está no valor da comissão que será paga pelos sellers, considerado mais atrativo do que as lojas on-line nacionais. Os porcentuais variam entre 5% e 8%, de acordo com a categoria do produto. Há 11 anos, a AliExpress vende para clientes brasileiros, mas até aqui eram só produtos comprados do exterior. O Brasil é o primeiro país das Américas a ter a modalidade de venda local.
A constatação de que a companhia pretende entrar de vez no ringue com os grandes players no Brasil foi a resposta dada por Yaman Alpata à entrevista do CEO do Magazine Luiza, Frederico Trajano, à DINHEIRO, na semana passada, sobre possíveis vendas de produtos sem nota fiscal. O dirigente da AliExpress reagiu na mesma língua, ainda que no sentido figurado: “Somos pioneiros no combate a produtos falsificados e defendemos os direitos de propriedade intelectual. Ele (Trajano) precisa enxergar sua própria plataforma e não a dos outros”, disse. “Provavelmente não está nos mencionado. Deve estar falando de qualquer outra empresa chinesa.” Mas estava mencionando sim.
Ainda que Alpata critique o tom duro usado pelo CEO do Magalu, que cobrou mais rigor das autoridades brasileiras na fiscalização dos marketplaces estrangeiros , o fato é que ainda falta transparência para o AliExpress, que desembarca no Brasil sem abrir os números. O executivo disse que está nos planos construir um centro de distribuição no Brasil, mas não disse como, quando e nem qual o custo. “O centro é o núcleo da operação logística e já começamos a trabalhar nisso. Não posso dar data específica, mas posso dizer que será em breve”, afirmou o diretor de marketplace.
O caminho adotado pela empresa para realizar as entregas em território nacional será pelos Correios. Para Viviane Almeida, gerente comercial do AliExpress no Brasil, o processo de privatização da estatal é visto hoje como um “ponto de atenção” pela plataforma chinesa. “Essa é uma ameaça que a gente tem há algum tempo. Eles são um parceiro estratégico nesse primeiro momento, mas em curto prazo vamos incluir outros”, disse. Isso inclui novas transportadoras. A executiva também afirmou que não sabe se há interesse, por parte do grupo Alibaba, na participação do processo de compra da estatal brasileira de logística.
HORIZONTE Segundo Viviane, o Brasil hoje ocupa a quinta posição no ranking do marketplace internacional da AliExpress, o que faz do país um grande mercado para a empresa também em vendas locais. “Já existia essa visibilidade da entrada, principalmente pelo tamanho do e-commerce brasileiro. É como se fosse um capim alto que precisa ser cuidado. É uma grande oportunidade.” Somente no ano passado, pelo menos 18 milhões de pessoas fizeram compras na internet pela primeira vez desde o início da pandemia, segundo a Associação Brasileira de Comércio Eletrônico (Abcomm).
Outra questão sem resposta pela empresa chinesa está no horizonte de sellers e vendedores que já estão na plataforma. “Há uma enorme demanda nas primeiras semanas e já ultrapassamos expectativas que tínhamos em mente”, afirmou Alpata. “De acordo com minha impressão, vamos ter muitos vendedores”, disse o executivo turco, sem detalhar o número. Outro ponto sobre o qual ainda não há resposta assertiva é a chegada no Brasil do sistema de pagamento Alipay, no mesmo molde do adotado pelo Magazine Luiza, que anunciou na semana passada a maquininha Magalupay. A plataforma chinesa irá adotar a forma de pagamento por meio da fintech Stone e também pelo Pix.
Segundo Alberto Serrentino, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC) e fundador da Varese Retail, o aumento significativo nas vendas tipo cross border, que é a comercialização de outros países, alcançou a marca de R$ 23 bilhões no ano passado, o que vem beneficiando a plataforma chinesa. “Eles vêm crescendo de forma robusta no Brasil, principalmente ao assumir a entrega dos produtos que vêm da China com voos semanais para o País”, disse. “A perspectiva é de que continuem aumentando, a partir do momento que isso se transformar em uma infraestrutura mais completa no Brasil.”
Na troca de farpas entre diferentes idiomas, a questão que fica é qual a língua que o cliente brasileiro vai querer falar. Pelo visto, será a do menor preço e da entrega rápida. A competição direta do comércio eletrônico está apenas começando. E vem pesada.
Fonte: IstoÉ Dinheiro