Freada nas vendas e aumento de lojas vazias fazem centros comerciais buscarem novas marcas
Imagine entrar num shopping paulistano e encontrar o Cruzeiro’s Bar, a Maisvaldir como revenda de eletrodomésticos e o Cineflix operando as salas de cinema. A freada nas vendas do comércio e aumento de lojas vazias por causa da crise abriram as portas dos shoppings novos para varejistas que até pouco tempo atrás não imaginavam que poderiam estar num centro comercial na cidade de São Paulo, o principal mercado consumidor do País.
O Cruzeiro’s Bar, a Maisvaldir e o Cineflix, por exemplo, estreiam esta semana no Cantareira Norte Shopping. É um centro de compras que fica na zona noroeste da capital paulista, no bairro de Parada de Taipas, com inauguração marcada para quarta-feira, 27.
“A principal sequela da crise é que ficou mais difícil trabalhar”, afirma Claudio Sallum, sócio da Lumine, administradora do shopping e sócia minoritária do empreendimento, projetado na época em que o comércio varejista crescia a uma taxa de 7,5% ao ano, na chamada “década de ouro” do varejo. Ele revela que teve de ir atrás de novas lojas, compatíveis com o consumidor de classe C, que é o cliente predominante no centro de compras, para preencher o mix do shopping.
Embora o empreendimento tenha lojas âncoras de peso, como Renner, Riachuelo, C&A, Kalunga, por exemplo, o novo shopping não conta com nenhuma revenda de eletrodomésticos conhecida dos paulistanos. Foi exatamente nesse segmento que os negócios despencaram no ano passado. A queda foi de 18% no volume sobre 2014, segundo o IBGE. “Dos grandes de eletrodomésticos, nenhum veio. Isso é reflexo da crise”, diz Sallum.
Fundada em 1990 no ABC paulista, a rede regional Maisvaldir foi a alternativa encontrada pelo shopping para preencher essa lacuna. Flavio Mattioli, diretor da varejista de artigos para casa, com nove pontos de venda fora da cidade de São Paulo e uma loja virtual, diz que era um projeto antigo da empresa estar presente na cidade de São Paulo. Mas o sonho foi adiado por uma questão de custos.
Em 2012, por exemplo, a varejista iniciou tratativas com o shopping Mooca Plaza, mas a negociação não foi para frente porque o valor do aluguel era elevado. No caso do shopping Cantareira, o executivo conta, sem revelar cifras, que o aluguel inicial foi “vantajoso”. “A negociação ocorreu em bases interessantes e com flexibilidade.” Na loja com 855 metros quadrados do novo shopping foram gastos R$ 2 milhões. A expectativa é que esse investimento se pague em quatro anos.
Vilso Dargas, dono do Cruzeiro’s Bar, é outro empresário que desembolsou R$ 1,5 milhão, entre equipamentos, instalações e pessoal, num restaurante de 300 m² no Cantareira. Fundado em 2005 no bairro paulistano da Barra Funda, o Cruzeiro’s Bar é um restaurante que tem como mote porções fartas a preços acessíveis. Foi pela primeira vez para um shopping em 2012, no Gran Plaza, em Santo André, no ABC Paulista.
“Antes do Gran Plaza, quando eu chegava para negociar com o shopping, eles me perguntavam: qual é sua marca”, conta Dargas. Segundo ele, a crise tem um lado positivo porque levou à reestruturação das operações e novos conceitos de restaurantes começaram a ser valorizados.
O empresário conta que tanto nos shopping novos, como o Cantareira e o Plaza Carapicuíba, onde abre um restaurante em setembro, ele conseguiu boas negociações. “Não teve luva (um valor cobrado pelo ponto) e as exigências no aluguel foram menores.” Segundo Sallum, sócio do Cantareira, o valor do aluguel neste momento é 20% menor em relação ao planos de negócios traçados para o empreendimento no passado, antes da crise.
Promoções. Até o operador de cinema das seis salas do Cantareira é uma marca desconhecida dos paulistanos. Originária da cidade de Maringá, norte do Paraná, a Cineflix chega pela primeira vez à capital paulista. Juliano Tortelli, gerente de marketing da exibidora, conta que a empresa é relativamente nova, tem quatro anos, 12 cinemas espalhados entre Paraná, Goiás, Mato Grosso, Distrito Federal e interior do Estado de São Paulo.
Tortelli diz que desconhece detalhes da negociação fechada com o novo shopping. De acordo com Sallum, o fato de a exibidora ser agressiva em promoções foi um dos motivos que o levaram a buscar a empresa a operar as seis salas de cinema do empreendimento. “Sempre tivemos o objetivo de entrar na capital. É um mercado bem concorrido”, diz o gerente.
Ajustes. Além buscar varejistas pouco conhecidos nacionalmente e de ser mais flexível nas negociações do aluguel, Sallum diz que, por causa da situação econômica desfavorável decidiu fatiar a área de vendas. O projeto inicial era no terreno de 75 mil m², onde funcionava antiga fábrica do grupo francês Saint-Globain, erguer um shopping com 27 mil m² de Área Bruta Locável (ABL) e 195 lojas.
Agora a decisão da companhia foi dividir a área. Nesta primeira fase, 20 mil m² vão abrigar 135 lojas. Dentro uma ano, será aberta uma segunda área com 7 mil m² e 60 lojas. “Sentimos que a comercialização não seria fácil e achamos boa a decisão de adiar 60 lojas”, diz Sallum.
Das 135 lojas previstas após a redução da área, 117 foram alugadas. No entanto, apenas 80 lojas devem abrir as portas quando o shopping for inaugurado este mês. Sallum explica que mais de 30 lojistas adiaram o início das obras nos pontos comerciais por causa da crise. A expectativa é que o shopping, que absorveu investimentos de R$ 300 milhões, fature 440 milhões no primeiro ano de funcionamento.