Por Mauro Zafalon | O avanço do número de sites de apostas já afeta a venda de arroz e de feijão no varejo. Há uma queda nesses produtos, e ela ocorre principalmente nas compras das famílias de baixa renda, as que recebem os benefícios do Bolsa Família.
Os varejistas ficaram intrigados com a desaceleração das vendas de produtos básicos em setembro, fenômeno que se repetiu em outubro e que persiste em novembro.
Essa movimentação menor afeta toda a cadeia do setor. O consumidor, reduzindo as compras de arroz e de feijão, força o varejo a exigir preços menores da indústria, e esta paga menos para o produtor. Em plena entressafra, os preços da saca de arroz caem no campo.
Vlamir Brandalizze, analista no setor de grãos, entre eles arroz e feijão, diz que é difícil uma pesquisa concreta mostrando essa queda, mas que a tendência é apontada por análises do perfil de gastos feito pelos varejistas.
Algumas cadeias de vendas apontam fortes retrações no ticket médio de compra, com retrações de até 40% no volume em alguns produtos, afirma ele. Estudo do Banco Central mostrou que um quarto dos 20 milhões de beneficiários do programa Bolsa Família fizeram apostas em agosto.
“A questão é cultural, e há a noção de que você deve ganhar alguma coisa de forma rápida e fácil. Além disso, por trás desses jogos há um pessoal muito esperto em marketing e especialistas em provocar o interesse nos jogadores”, afirma o analista.
Há uma preocupação no setor porque novembro é sempre um período forte de comercialização desses produtos. As indústrias antecipam as vendas, uma vez que a partir da segunda quinzena de dezembro encerram as atividades para limpeza das máquinas e férias dos funcionários. Nesta primeira semana do mês, no entanto, os negócios não se concretizaram, segundo Brandalizze.
Se as vendas não seguem dentro do padrão esperado pelo setor, o mesmo não ocorre com o plantio da nova safra 2024/25, que avança dentro das melhores condições climáticas dos últimos quatro anos.
Incentivados pelos preços, os produtores aumentam a área de plantio em todas as regiões do Brasil, e o potencial de produção sobe para 12,5 milhões de toneladas nesta safra, acima dos 10,5 milhões deste ano.
O clima não está favorável apenas para os brasileiros, mas também para os agricultores de todo o Mercosul, segundo Brandalizze. Pelas contas dele, se o clima realmente continuar ajudando, o potencial de produção da região sobe para 16,4 milhões de toneladas, acima dos 13,7 milhões deste ano.
Essa provável melhora na oferta dos países produtores do Mercosul faz com que os países do Mercosul procurem importadores, principalmente na América Central e na África. México também é um bom mercado, e os países conseguem, quanto o produto é de qualidade, colocar arroz também na Europa.
No Brasil, o crescimento de área de plantio ocorre em todas as regiões, do Sul ao Norte e Nordeste, o que deve garantir esse aumento da produção brasileira, segundo o analista.
A demanda e os preços por arroz continuam bons no mercado externo. A tonelada está cotada a US$ 400, um valor que remunera o produtor nacional. A cotação média internacional deve continuar atrativa, uma vez que proteína animal está cara e a oferta de trigo é menor.
Mesmo com a queda de produção interna na safra 2023/24, as exportações brasileiras chegam a 1,1 milhão de toneladas neste ano, mas um volume inferior ao de 2023, quando o país tinha uma oferta maior do cereal.
As importações crescem. Até outubro, somaram 925 mil toneladas, acima dos 885 mil de janeiro a outubro de 2023, segundo a Secex (Secretaria de Comércio Exterior).
A oferta de feijão também será boa, conforme avaliação atual das lavouras da região Sul. São Paulo, no entanto, gera um pouco de temor, uma vez que as chuvas atuais ocorrem em um período de colheita.
A leguminosa, que esteve a R$ 400 por saca há quatro meses, é negociada entre R$ 230 a R$ 290 agora, dependendo da qualidade do produto. Se cair abaixo de R$ 200, não deve atrair o produtor na segunda safra, a principal do país, o que afetaria a oferta para o ano, afirma Brandalizze.
Fonte: Folha de S.Paulo