Por Maria Luiza Filgueiras | Era de se esperar que o acordo assinado entre a SPX e a Mobly, na madrugada de sexta-feira, caísse como uma bomba na casa da família Dubrule, fundadora da Tok&Stok, mesmo após anos de negociações. E assim foi. Nesta segunda-feira, Regis Dubrule, seu irmão Paul, e sua esposa Ghislaine Dubrule, acionistas minoritários da Tok&Stok, correram à Justiça para questionar o acordo envolvendo as varejistas, a reestruturação extrajudicial e o que definem como uma série de vícios e ilegalidades na transação – acusação que a SPX contesta, vendo um esforço final para tirar a Mobly da mesa.
Nos documentos e petições de hoje, os Dubrule chamam a venda de “golpe engendrado pela SPX” e apontam “clandestinidade da manobra societária”. A base do questionamento é que houve uma reunião de conselho, em 31 de julho, em que o então conselheiro independente Roberto Szachnowicz e Regis, também membro do board, formado por três pessoas, aprovaram a capitalização proposta pela família – que era uma alternativa à potencial transação com a Mobly. Nesta capitalização de R$ 210 milhões, R$ 100 milhões seriam aportados no caixa da Tok&Stok e R$ 110 milhões em dívida detida pelos Dubrule contra a varejista seriam convertidas em dívida – de forma que os fundadores, se não houvesse adesão da SPX, voltariam a controlar a empresa.
Essa reunião foi contestada pelo presidente do conselho, o sócio da SPX, Fernando Borges. Em resposta a Dubrule, ele apontou que uma reunião não poderia ser convocada sem anuência do chairman, e marcou outra data para que o assunto da capitalização fosse avaliado: essa nova reunião ficou marcada para a última sexta-feira e já aconteceu com o anúncio de acordo com a Mobly na rua. Antes disso, no entanto, o conselheiro independente foi destituído e o controlador elegeu um novo membro que passou a votar em linha com a SPX. Nesse meio tempo, a ata da reunião de aprovação da capitalização foi registrada na junta comercial.
A SPX entendeu o movimento como uma “reunião teatral”. A proposta de capitalização dos Dubrule estaria condicionada ao apoio dos credores. Os fundadores vinham contatando os bancos em busca desse suporte, mas não tinham ainda obtido essa garantia em volume suficiente. Um dos credores, a Domus, chegou a se manifestar contra a capitalização e agora compõe o grupo de credores que deu apoio prévio ao plano traçado no acordo com a Mobly.
Assessorada por Tannuri Advogados e Moelis, a família Dubrule questiona também o pedido de reestruturação extrajudicial. Pelo estatuto da companhia, isso teria que acontecer após a convocação de uma assembleia, que não houve, ou em caráter de urgência – a SPX aponta essa urgência para preservar a companhia, enquanto os Dubrule ressaltam que não havia juros ou principal de dívida vencendo agora para tamanha correria, mas somente a partir de 2025. A recuperação extrajudicial é uma das condições da Mobly para a efetivação da aquisição. “A operação com a Mobly não existe para viabilizar o plano de recuperação extrajudicial, mas sim o inverso”, observa a família na documentação.
A controladora alega, a terceiros, que teria recebido uma carta da própria família há cerca de dois meses, avisando que se as tratativas com a Mobly fossem adiante, os Dubrule fariam a declaração de vencimento antecipado. Depois disso, aumentaram sua posição como credores, comprando a dívida das mãos do Itaú. A urgência viria da ameaça dos Dubrule.
A família pede à Justiça que faça valer a capitalização, conforme a ata registrada, E notificou a Mobly, para que não possa alegar desconhecimento do tema mais adiante. Outro ponto que levanta nas acusações de ilegalidade diz respeito À tratativa com credores que apoiam o plano de reestruturação. Bradesco e Santander, que são credores de aproximadamente R$ 200 milhões, estão entre os bancos que apoiam a renegociação. Já por meio de seus bancos de investimento, foram assessores da transação e, por isso, receberão uma remuneração de R$ 20 milhões.
Os Dubrule e seus assessores avaliam que isso de trataria de fraude a credores, já que duas instituições terão remuneração superior às demais. O fee corresponde a 10% da dívida que elas detêm e a 30% o valor de mercado da participação da SPX na Mobly, nos termos divulgados. Questionam, ainda, quem está pagando esse fee, uma vez que o conselheiro ligado à SPX teria informado apenas que não é a Tok&Stok.
“A empresa até deveria pagar algo aos bancos, já que eles estavam buscando comprador ou sócio há anos. No entanto, o desfecho foi uma transação privada entre a SPX e a Mobly, e pela melhor governança não é a Tok&Stok quem está pagando a conta. Isso até poderia ser questionado pelos minoritários, caso não aderissem ao acordo desenhado, mas nem é o caso”, rebate uma fonte próxima ao controlador. “Assessores financeiros recebem fees por transações que acham boas ou que acham ruins. Mas banco credor faz acordo quando acha o melhor cenário.”
Para os minoritários, a SPX (que administra agora o investimento feito pelo fundo americana Carlyle) quer evitar uma recuperação judicial, falência, ou mudança de controle que mantenha a Tok&Stok tal como é hoje – o que manteria um risco potencial tributário, trabalhista ou de qualquer ordem de responsabilização posterior que pudesse, inclusive, chegar aos sócios ou cotistas, como aconteceu da loteadora Urbplan. Na transação com a Mobly ou outro player que absorva a Tok&Stok, haveria outra composição patrimonial.
Um pedido de liminar de urgência, por parte dos minoritários, para impedir a assembleia e reunião do conselho na sexta-feira não foi apreciado ainda pelo juiz, e Regis acabou participando do encontro do board.
Para a controladora, as manifestações judiciais são a última tentativa dos Dubrule de melar uma transação, movida pelo desejo dos fundadores de voltarem ao comando do negócio sem pagar pela aquisição. “É uma operação privada, com apoio dos bancos. Os franceses estão sozinhos e por isso tentam assustar a Mobly”, resume a fonte ligada ao grupo.
Procurados, os Dubrule e a SPX não deram entrevista.
Fonte: Pipeline Valor