Por Jessica Sant’Anna – O imposto de importação de 60% cobrado em remessas de até US$ 50 que deverá ser zerado a partir de 1º de agosto – medida que gerou fortes críticas do varejo nacional por favorecer plataformas estrangeiras e desequilibrar a competição – está sendo visto pelo governo como uma forma de formalizar operações que vinham crescendo no país em ritmo acelerado, sem controle. E o imposto não ficará zerado para sempre, disseram técnicos envolvidos na elaboração dessa iniciativa ao Valor.
Para ter acesso à isenção do imposto de importação, a empresa que está trazendo o produto para vender a uma pessoa física, terá que aderir ao programa Remessa Conforme. O principal ganho será, segundo fontes do governo, o acesso a informações sobre milhões de mercadorias que entram no país, o que possibilitará à Receita Federal fazer gestão de risco. Observaram também que a medida trará vantagens ao consumidor, como previsibilidade sobre a entrega e sobre os impostos pagos.
O programa foi desenhado pela Receita e anunciado na sexta-feira (30), por meio da publicação de portaria e instrução normativa no “Diário Oficial da União”.
Isenção que entra em vigor em agosto “poderá levar a forte desemprego”
A principal novidade foi a isenção do imposto de importação, 60%, para remessas de até US$ 50 a partir de 1º de agosto para as plataformas de comércio eletrônico que aderirem ao Remessa Conforme.
Atualmente, essa isenção existe somente para encomendas de pessoas físicas para pessoas físicas, sem fins comerciais.
A extensão do benefício para compras em “marketplaces” estrangeiros desagradou ao varejo nacional, que afirma que a medida causa desequilíbrio na competição.
Uma reunião foi feita no sábado, em São Paulo, entre o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e membros do Instituto para o Desenvolvimento do Varejo (IDV) para tratar do tema. Os varejistas saíram do encontro com o compromisso do ministro Da Fazenda de que haverá uma isonomia de impostos.
No sábado, após a reunião com Haddad, o presidente do IDV, Jorge Gonçalves Filho, afirmou que a medida anunciada na portaria “poderá levar a forte desemprego e fechamento de lojas, porque o grande varejo até pode se estruturar e ter armazéns fora do país, mas o pequeno industrial, não”.
Nas palavras do conselheiro do Instituto para o Desenvolvimento do Varejo (IDV), Sérgio Zimerman, presidente da varejista Petz, os varejistas saíram “cautelosamente otimistas”.
Além do presidente do IDV e de Zimerman, a agenda oficial do ministro informava que participariam José Aparecido dos Santos, diretor jurídico tributário do Magazine Luiza; Fábio Faccio presidente das Lojas Renner; Daniel Santos, executivo financeiro da Renner; Marciel Costa, consultor em relações governamentais do Grupo Soma; e Fabíola Xavier e Alecsandro Araújo, diretora e gerente do IDV, respectivamente.
Técnicos envolvidos na elaboração do programa afirmaram ao Valor que a intenção do governo não é manter o imposto de importação zerado para sempre. Tanto que a portaria traz que a Receita Federal fará avaliações bimestrais do programa com vistas a propor, entre outros itens, alteração da alíquota.
Eles também defendem que o programa deve ser visto além da discussão da taxa de importação. O maior ganho, comentam, virá do controle que a Receita terá sobre as mercadorias que chegam ao país, principalmente via Correios. Dados do Fisco mostram que 176 milhões pacotes chegaram pelos Correios em 2022, mas apenas 1,9% tinha Declaração de Importação de Remessas (DIR).
Ou seja, os órgãos de controle tinham informações sobre menos de 2% dos pacotes postais vindos do exterior. “Não dá para trabalhar assim, imagina quando chegarmos em 500 milhões de remessas postais”, disse um técnico. Ele salientou que a Receita tem controle dos pacotes enviados via transportadoras, mas que estes representam a minoria das importações.
As plataformas que aderirem ao Remessa Conforme terão de repassar aos Correios ou às transportadoras os dados do produto e do comprador para preenchimento da DIR. Também terão de recolher o ICMS. Preenchida a DIR corretamente e pago o tributo, a mercadoria deve chegar ao país direto pelo canal verde, ou seja, irá direto para o endereço do destinatário, sem passar pela triagem em Curitiba.
Por isso, a leitura do governo é que o programa trará ganhos ao consumidor, pois, hoje, o comprador não sabe quando o pacote vai chegar nem se pagará tributo e multa.
Os técnicos do governo avaliam, ainda, que o programa é um “ensaio” para modernizar a legislação brasileira sobre remessas internacionais, de 1980.
Fonte: Valor Econômico