Por Adriana Mattos e Ana Luiza Carvalho | A varejista de moda Marisa registrou no primeiro trimestre resultados fracos e situação de liquidez ainda preocupante, dizem analistas, mas o comando do grupo entende que a reestruturação em andamento deve trazer melhora operacional entre o segundo e terceiro trimestres. A companhia publicou seu balanço de janeiro a março na noite de segunda-feira.
“Os fechamentos de 91 lojas vão ganhar força maior neste trimestre [abril a junho] e um impacto de 100% mesmo no Ebitda [lucro antes de juros, impostos, amortização e depreciação] virá no terceiro trimestre, porque isso se soma a redução de cerca de R$ 50 milhões em despesas, por conta da reestruturação”, disse João Pinheiro Nogueira Batista, CEO da varejista.
A cadeia projeta redução de R$ 51,8 milhões em despesas gerais e administrativas, e desse valor, cerca de 62% serão referentes à revisão de estrutura (como pessoal e lojas). Entre março e abril, foram fechadas 25 unidades das 91 previstas, de um total de 334 unidades existentes ao fim de 2022.
Ao se considerar um prazo mais longo de análise, de dezembro a maio (inclui unidades antes do anúncio da reestruturação), foram 61 fechamentos.
Com os encerramentos deste ano, há ganho de Ebitda potencial estimado em R$ 13,5 milhões ao ano. A segunda fase é prevista para terminar no fim deste mês, com Ebitda potencial anual de R$ 26,7 milhões. O projeto será finalizado na terceira fase, com outros 33 fechamentos, e impacto positivo de R$ 21,5 milhões no Ebitda.
“Após todas essas ações, esperamos terminar o ano com uns R$ 30 milhões de Ebitda ajustado, pelo menos”, afirma o CEO. No primeiro trimestre, o Ebtida ajustado foi negativo em quase R$ 51 milhões.
Se concluir esse plano como espera, e manter contas ajustadas no longo prazo, a Marisa conseguiria avançar num problema antigo. Apesar de ter boas margens em certos momentos, a empresa dava prejuízo ou o lucro encolhia frequentemente nos últimos anos. Em parte, a questão está nos custos que pressionam o negócio — é isso que Nogueira busca resolver desde fevereiro, quando foi contratado.
Esse movimento acontece em paralelo à renegociação de dívidas passadas e busca de recursos no mercado, num momento em que a Marisa ainda não gera caixa e logo, não consegue se autofinanciar.
Não há liberação de linhas novas pelos bancos para a empresa neste momento, por conta do aumento de risco do setor, após a crise na Americanas e o maior número de recuperações judiciais no comércio. Outras redes enfrentam o mesmo cenário.
No começo do ano, a Marisa informou que abriu renegociações com bancos, para ampliação de prazo de vencimentos, por conta da dívida de curto prazo. Segundo nota explicativa do balanço de janeiro a março, nos próximos 12 meses, há R$ 395 milhões a vencer, e eram R$ 470 milhões ao fim de 2022. As renegociações continuam em andamento.
A rede já tem financiamentos com Caixa Econômica Federal, ABC, Bradesco, Banco Alfa, Banco Industrial, Daycoval e com Safra.
Sobre novas linhas no mercado, Nogueira diz que “os bancos não têm dado crédito [novo]”. “Estamos acessando investidores e fundos de crédito mais sofisticados, em operações reestruturadas, na busca de alternativas. Ainda estamos nesses contatos”, diz.
Nesse cenário de capital limitado, a companhia vem operando com forte controle de caixa.
O primeiro trimestre “foi dedicado à contenção e proteção” de capital, diz o balanço, com desembolsos de R$ 40,8 milhões, versus R$ 140,1 milhões um ano antes.
A receita líquida de varejo subiu 1,3% de janeiro a março, mas a do MBank caiu 12%, como parte da reestruturação anunciada. No total, a receita da Marisa diminuiu 2,1%.
Como os custos dos produtos vendidos no varejo caíram 3%, o lucro bruto e a margem bruta desse braço subiram. Este foi um dos destaques positivos dos analistas no período. A taxa passou de 47,4% para 49,5%.
“Passamos a ser mais cirúrgicos nos descontos promocionais, e eliminamos campanhas que não geravam lucro incremental. Melhoria de nível do estoque também ajudou nisso, porque reduz remarcações”, disse o executivo.
Aumento de despesas de reorganização (consultorias, indenizações), os números do MBank, o banco da rede, e efeito da alta da taxa de juros no resultado financeiro afetaram a última linha.
A Marisa registrou prejuízo de quase R$ 149 milhões no primeiro trimestre, alta de 64,2% em relação ao mesmo período de 2022. No critério ajustado, o prejuízo avançou 19,1%, para R$ 106,8 milhões.
Foram três meses difíceis para o varejo, especialmente para as redes de moda. A Renner teve queda no lucro líquido de 75%, para R$ 46,8 milhões. Na Guararapes, dona da Riachuelo, a perda cresceu 119%, para R$ 175,7 milhões. A C&A apurou recuo de 17% no prejuízo, para R$ 126,3 milhões.
Para Nogueira, o primeiro trimestre da Marisa foi positivo apesar dos juros altos e do consumidor mais endividado. Ele destaca, por exemplo, os primeiros sinais do plano em andamento, como a melhora do Ebitda (ao se descontar todos os efeitos não recorrentes).
O CEO ainda mencionou que informações no mercado sobre ações de despejo em lojas da rede referem-se a unidades que podem ser fechadas, dentro do plano de encerramento dos 91 pontos de venda. As lojas consideradas estratégicas já tiveram a locação renegociada, segundo ele.
A empresa enfrenta também três pedidos de falência solicitados na Justiça por fornecedores (um em 31 de março e dois neste mês), somando dívidas em aberto de R$ 882,7 mil. A companhia afirma que se tratam de valores “muito pequenos” e que vai se defender nos autos. De acordo com Nogueira, são montantes que restaram no processo de negociação com fornecedores, “nada representativos” perto das tratativas já realizadas com mais de 90% dos parceiros.
Fonte: Valor Econômico