Por Pedro Diniz
Um dos cinco países mais rentáveis da divisão de perfumaria da italiana Dolce & Gabbana, o Brasil pode avançar algumas casas e tomar os três primeiros lugares das vendas globais dos perfumes da grife.
Pelo menos é o que espera o presidente da marca, Alfonso Dolce. Em entrevista exclusiva ao Valor, na sede da nova empresa Dolce & Gabbana Beauty, em Milão, ele disse ter expectativas “altas demais, mas com os pés no chão”, de que os brasileiros devem aderir às novas fragrâncias e às futuras linhas de maquiagem e cuidados para a pele que serão lançadas pela grife em 2024 e 2025, respectivamente.
“A Dolce & Gabbana é sobre cores e um senso de alegria que é natural, por isso temos um apelo grande com os países latinos, especialmente Brasil e México”, diz o executivo, que é irmão do estilista Domenico Dolce, dupla de Stefano Gabbana na marca.
Ao todo, estão previstos investimentos da ordem de US$ 400 milhões nessa nova companhia de beleza, criada no ano passado após a Shiseido e a Dolce & Gabbana decidirem não renovar o contrato de licença. A japonesa detinha, até janeiro de 2022, os direitos de criação e distribuição de ícones da etiqueta, como Light Blue e The One, e reportou perdas milionárias após o início da pandemia.
O motivo alegado para o voo solo, porém, foi a vontade da Dolce & Gabbana de aderir ao movimento de casas francesas, como Chanel, Dior e, em 2022, Hermès, de criar, gerir a distribuição e dar identidade aos produtos sem intermediários, fazendo deles extensões das roupas e acessórios nas vitrines.
“Quando se licencia a marca dentro de um sistema de distribuição unificado como o dessas grandes empresas de beleza, você perde em emoção, acaba ficando igual aos outros e é sempre o mesmo em todo lugar. E, bem, as pessoas não são as mesmas todo o tempo e em todos os lugares”, afirma Dolce.
Nesse sentido, um plano, já posto em prática na Itália e que será paulatinamente reproduzido pelo mundo, é que as gôndolas com os perfumes da grife serão exclusivas e personalizadas para cada região. No Brasil, a distribuição fica a cargo da carioca Prestigie, que fechou contrato quatro meses antes da saída da Shiseido e integra a nova carteira de distribuidores, que foi 70% renovada pelo novo CEO da Dolce & Gabbana Beauty, Giancarlo Toniolo.
De partida, a divisão de beleza tem valor de mercado estimado pela marca em € 1,2 bilhão e, Dolce acredita, vai representar 30% da receita global do grupo nos próximos três anos. Hoje, esse percentual gira em torno de 20% das vendas da empresa, que tem capital fechado e o mercado estima ter alcançado receita de € 1,4 bilhão em 2021.
Segundo a plataforma de dados alemã Statista, os dias de penúria das vendas pandêmicas ficaram para trás e o segmento de perfumaria alcançará o tamanho de US$ 52,4 bilhões até 2025.
Há, no entanto, um plano ainda mais ousado por trás dos investimentos milionários. Ao se tornar a primeira marca italiana com a beleza feita inteiramente em casa, a Dolce & Gabbana conseguirá imprimir o selo “made in Italy” em todos os lançamentos. Além da matéria-prima focada em insumos produzidos na Itália, como o limão siciliano e a bergamota da Calábria, as embalagens são produzidas por artesãos de vidro na região de Parma.
O perfume feminino Q, lançado em janeiro, já carrega todos os elementos dessa nova fase italianíssima da grife. Pesado, o frasco tem tampa suntuosa em forma de coroa, com o típico desenho barroco e monástico, que identificam as criações da etiqueta.
Pesquisas internas da grife dão conta de que o Q alcançou 1,5% de participação de mercado na Itália, um sucesso se olhado pelo prisma da pulverização do setor de fragrâncias. A distinção dos produtos em relação à concorrência ocorreria por meio dessa valorização do aspecto artesanal, que, obviamente, custa mais caro.
A Dolce & Gabbana estima um incremento de até 20% nos preços dos perfumes nos próximos meses. Além do upgrade na composição das fórmulas, o aumento cobre despesas extras com energia, mais cara devido à guerra na Ucrânia, e a escalada de inflação na Europa.
O toque mais luxuoso será, porém, o chamariz. Giancarlo Toniolo, que trabalhou na divisão de fragrâncias do grupo francês LVMH, afirma que nos próximos 20 meses 80% das fórmulas serão alteradas, sem prejuízo aos cheiros, para privilegiar as matérias-primas locais.
Em setembro, ele adianta, a marca deve lançar uma nova fragrância focada na geração Z, cujo resultado deve “construir uma nova tendência no mercado”. A base será um tipo de baunilha usado nas fragrâncias gourmand – a família com notas gastronômicas -, mas que será aplicada de um jeito “nunca feito antes”, segundo o executivo.
O perfumista que assina a criação é Olivier Cresp, nome por trás do perfume cítrico mais famoso da Dolce & Gabbana, o Light Blue, de 2001, e, não por coincidência, o criador do blockbuster Angel, de Thierry Mugler, que fundou o pilar “gourmand” na perfumaria. “É uma forma de homenagear nosso sucesso e voltar às origens”, diz Toniolo.
Ele não dá detalhes sobre a linha de cuidados para a pele que será desenvolvida, mas garante que não terá produtos anti-idade, porque “nenhuma marca de moda teve sucesso [nessa seara]”. Entusiasma-se, porém, com o lançamento da linha de maquiagem, em abril do próximo ano. A atual e enxuta linha de produtos será inteiramente reformulada para reverter um cenário que, Toniolo admite, decepciona.
“Não estamos bem em maquiagem, principalmente porque não havia um esforço para criá-la. A Dolce & Gabbana é colorida, então, não há motivos para não termos uma linha robusta de tons. Nas marcas francesas é tudo muito neutro ou preto e branco. Imagine o que podemos fazer com tantas estampas”, afirma.
E acrescenta: “o segredo para uma marca capturar as mulheres é a maquiagem. Esse é o segredo dos franceses, porque os perfumes você cheira um, cheira outro, mas muda bastante. Maquiagem constrói lealdade”.
Fonte: Valor Econômico