Por Ivan Ryngelblum
A palavra racionalidade entrou definitivamente no vocabulário das principais companhias de e-commerce do País. Após uma competição desenfreada nos últimos anos para crescer participação, muitas vezes às custas de rentabilidade, as empresas buscam agora crescer sem queimar caixa, de olho na lucratividade.
O mais recente nome a mostrar que esse será o seu lema em 2023 é o Magazine Luiza. Assim como seus competidores, a varejista buscou apresentar uma postura mais responsável para este ano, marcado por juros em alta e perspectiva de desaceleração do consumo.
“Nunca presenciei um mercado tão racional, com todo mundo querendo dar lucro, repassando custos”, disse Frederico Trajano, CEO da companhia, nesta sexta-feira, dia 10 de março, durante a teleconferência de resultados do quarto trimestre e do ano de 2022. “É um cenário que gostamos de trabalhar, porque nunca tivemos licença para queimar caixa.”
Com a Americanas enfrentando dificuldades após a revelação do escândalo contábil e a baixa penetração do e-commerce no Brasil, o Magazine Luiza vê oportunidade de continuar expandindo seu marketshare. No entanto, segundo Trajano, sem realizar qualquer sacrifício de margem.
Nesse sentido, ele destacou que a companhia conseguiu repassar de forma integral no começo do ano o Difal, tributação que visa equilibrar a arrecadação do ICMS entre os Estados. De acordo com o CEO, o cenário competitivo mais racional permitiu o ajuste, sem grandes prejuízos para a empresa.
Ele citou ainda medidas para melhorar a monetização do marketplace, que incluem ajustes nas taxas cobradas sobre os vendedores cadastrados, o chamado take rate. Trajano disse que esses iniciativas estão fazendo com que o marketplace aumente sua contribuição para o crescimento da margem bruta.
No quarto trimestre, a margem bruta da operação foi de 27,8%, um aumento de 2,5 pontos percentuais em comparação com o quarto trimestre de 2021. A companhia atribuiu a alta ao avanço de 44,4% da receita de serviços, impulsionada pelas comissões do marketplace.
O Magazine Luiza também está apostando em produtos com tickets mais elevados no 1P, com valores acima de R$ 300, além de ter uma posição ainda maior em categorias acima de R$ 1 mil. “Esses produtos apresentam uma perspectiva economicamente melhor por unidade, contribuindo para a rentabilidade”, afirmou Trajano.
Outro movimento envolve os investimentos. “Nosso futuro é ser uma plataforma e os maiores investimentos serão voltados para tecnologia”, afirmou. “Não temos tanta necessidade de fazer investimentos, vamos priorizar o que dá retorno mais no curto prazo.”
O Magazine Luiza também quer avançar no segmento de fulfilment, iniciativa colocada de pé no ano passado e na qual conta com cerca de 1 mil clientes.
A companhia integrou o fulfillment à sua operação com estoque próprio, visando completar a cesta de serviços logísticos aos sellers. A ideia é ampliar a oferta para vendedores de porte médio, vendo neste movimento uma oportunidade de aumentar a conversão e a oferta de produtos no marketplace.
Trajano afirmou que, no momento, não está cobrando pelo fulfillment, e destacou que o custo é marginal, pelo fato de utilizar os centros de distribuição e a malha logística da empresa, além de os estoques estarem em níveis baixos, permitindo armazenar produtos de terceiros.
“Mesmo quando começarmos a cobrar, vai ser em níveis abaixo do mercado, porque temos uma operação logística robusta”, afirmou.
As perspectivas para 2023 foram o foco da fala de Trajano e dos executivos do Magazine Luiza na teleconferência, apesar do fluxo de notícias negativas envolvendo a companhia.
A mais recente foi a revelação, pela própria empresa, de supostas práticas comerciais irregulares envolvendo três distribuidores. Em fato relevante divulgado na madrugada de hoje, a companhia informou que as alegadas práticas envolveriam operações de bonificação relativas a compras de fornecedores e distribuidores.
O trio de distribuidores foi responsável por aproximadamente 3,5% do valor total de compra de mercadorias da varejista em 2022, segundo a companhia.
Trajano não quis entrar em detalhes sobre o caso, afirmando que a denúncia anônima com as alegações chegou poucos dias antes da divulgação dos resultados. “Ainda é muito cedo para falar qualquer coisa”, disse. “Quando não se tem detalhes, é irresponsável falar qualquer coisa.”
O caso Kabum, em que os fundadores da varejista de jogos eletrônicos processam o Itaú BBA, alegando que o banco os orientou mal durante o processo de venda ao Magazine Luiza, em 2021, não foi alvo de qualquer comentário na teleconferência.
O Magazine Luiza fechou o quarto trimestre com prejuízo de R$ 35,9 milhões, revertendo o lucro de R$ 93 milhões registrado no mesmo período de 2021. Na mesma base de comparação, a receita líquida subiu 18,8%, a R$ 11,1 bilhões, e o Ebitda somou R$ 642,3 milhões, revertendo o montante negativo de R$ 7,9 milhões do mesmo intervalo de 2021.
A varejista encerrou o ano com uma posição de caixa total no valor de R$ 10,6 bilhões, diminuição des 14%, em relação a dezembro de 2021. O endividamento bruto subiu 4,6%, na mesma base de comparação, para R$ 7,1 bilhões. A empresa destacou que 98% da dívida está no longo prazo, distribuídos entre 2024 e 2026.
Por volta das 14h48, as ações do Magazine Luiza caíam 2,66%, a R$ 3,30. Em 12 meses, os papéis acumulam queda de 43,9%, levando a um valor de mercado de R$ 22,5 bilhões.
Fonte: Neofeed