Por Adriana Mattos –
A varejista de farmácias Poupafarma analisa entrar com pedido de recuperação judicial, enquanto tenta manter a operação de pé nas últimas semanas, segundo as informações presentes em ação judicial.
A companhia entrou, no dia 21 de fevereiro deste ano, com pedido de tutela antecipada preparatória de processo recuperacional, informou em documento encaminhado à Justiça paulista. O caso transita na 1ª Vara Regional de Competência empresarial e de Conflitos de Arbitragem de São Paulo.
O grupo Investfarma, controlador da empresa, e de outras marcas de redes de drogarias, também é requerente na ação. A crise envolve uma operação com cerca de 80 lojas e R$ 680 milhões em faturamento anual, diz uma fonte.
A companhia também é dona da Farmadelivery, por anos considerada uma das principais operações on-line de farmácias independentes de São Paulo, e da Dissim Distribuidora de Medicamentos.
Em 2019, o fundo gerido pela Stratus, controlador da empresa, disse, em entrevistas, que planejava abrir capital da Poupafarma em 2020, após comprar a rede e crescer por meio de aquisições, dentro da lógica de expansão em setores mais resilientes às instabilidades.
A empresa relata, porém, em documentos enviados ao tribunal, que a cadeia teve prejuízo de R$ 117 milhões em 2022, que houve dificuldades de obter linhas de crédito no mercado, e sentiu ainda o efeito na alavancagem da alta na taxa de juros. Ainda houve efeito da crise atual do varejo, que elevou percepção de risco no setor no mercado financeiro, diz.
Em nota ao Valor, o grupo informa que vem buscando com auxílio de assessores, “ estabelecer um processo colaborativo de recuperação e por isso não acelerou a via judicial antes de criar uma agenda compartilhada de alinhamentos”.
O pedido de tutela antecipada de processo de recuperação foi feito para que sejam obtidos os efeitos do “stay period” pela rede, quando nenhuma cobrança ou constrição pode ser realizada no intervalo de 180 dias — proteção possível no caso de empresas que já estão em recuperação judicial. A solicitação do stay períod foi concedida no fim de fevereiro.
“[O grupo] está a preparar a documentação necessária ao ajuizamento do pedido recuperacional, objetivando superar sua crise econômico-financeira, de modo a manter suas atividades e a função social das sociedades empresárias e os empregos de seus trabalhadores […]”, informa na ação.
Ainda afirma que a operação da varejista vinha sendo afetada por “inúmeros bloqueios judiciais de valores contra si, bem como protestos em cartório, apontamentos junto aos órgãos de proteção ao crédito, notificações extrajudiciais relativos a alugueis atrasados […] além de notificação do Banco Pine e o iminente bloqueios dos serviços pelo Google Ads”.
Com o deferimento da solicitação, o Google teve que retomar os serviços oferecidos, assim como os outros credores.
O grupo informa, na nota ao Valor, que a pandemia afetou a integração de negócios adquiridos, assim como houve impacto da escalada na Selic e de um desequilíbrio na cadeia de fornecimentos do setor.
Sobre a integração, afirma que foi feita a aquisição de quatro negócios entre 2019 e 2020, sendo a unificação prejudicada pelo período da crise sanitária, apesar da expansão positiva das vendas. “Além disso, nesse período das aquisições a taxa de juros estava entre 2% ao ano e 4% ao ano e o mercado funcionava com abastecimento praticamente sem ruptura”.
Após 2021, a pressão dos juros sobre as cadeias de abastecimento e a ruptura de estoques com falta de medicamentos em alguns momentos, “prejudicou de forma desproporcional as operações de pequeno e médio porte”.
Informa que houve um esforço de reorganização em 2022, e uma “emissão bem sucedida de debêntures”, mas a aproximação do calendário eleitoral e aumento da Selic “tornou impossível” um equilíbrio financeiro.
Um reperfilamento das dívidas para 2023 também acabou não evoluindo por causa da crise de crédito do varejo “que praticamente exauriu” as perspectivas de refinanciamento, “exigindo uma ação mais drástica de redução de custos e renegociação”.
A varejista iniciou um “road-show” para fornecedores e instituições financeiras, apresentando o projeto de reativação operacional, com reabertura de lojas já a partir da próxima semana. Houve fechamento de lojas de forma temporária por conta de desabastecimento, segundo sindicatos.
O Fundo SCP Coinvestimento II (gerido pela Stratus) segue com a maioria das ações, e houve uma preparação ao processo de fusão com “uma rede de grande porte”, que não evoluiu em 2022, “mas que ainda pode retornar a pauta em 2023 ou 2024, disse.
O setor de farmácias foi afetado na pandemia basicamente pela mudança de comportamento de consumo, mas de forma temporária, e o mercado vem em ritmo de expansão acima da média do varejo. Para consultores, houve também falhas de gestão em certas varejistas nos últimos anos, e isso, somado ao cenário “macro”, vem pressionando alguns negócios.
Fonte: Valor Econômico