12/02/2015 05:00
Por Felipe Marques
Nos Estados de São Paulo, Mato Grosso e Paraíba ficou mais difícil e mais caro deixar “sujo” o nome de um devedor que deixou de honrar suas obrigações. Desde janeiro, diferentes leis estaduais mudaram o procedimento a ser seguido antes que se possa incluir um mau pagador em cadastros como o da Serasa e o do Serviço Central de Proteção ao Crédito (SCPC). Em São Paulo e Mato Grosso, desde janeiro, só pode ser adicionado à base de dados o mau pagador que tiver antes recebido um tipo específico de correspondência, a carta com confirmação de recebimento (AR). Essa carta precisa estar assinada por quem recebeu o documento para valer. Antes, bastava uma correspondência simples, sem confirmação.
Já na Paraíba, outra lei estadual recente estabeleceu que só se pode “negativar” um devedor que não esteja discutindo judicialmente a dívida. As mudanças podem até parecer simples, mas têm dado dor de cabeça ao sistema financeiro. Além de encarecer o registro, as alterações deixaram o processo mais lento. Isso acabou por comprometer a eficiência, tanto para instituições financeiras como para o comércio, de consultar essas bases de dados na tentativa de identificar os maus pagadores. O que pode acabar tendo reflexo no preço do empréstimo nessas regiões. Nos três casos, a justificativa das mudanças foi aumentar a proteção ao consumidor que tem seu nome incluído nos cadastros de restrições financeiras indevidamente.
O deputado Rui Falcão (PT-SP), autor da lei de São Paulo, afirma, em nota, que a exigência da carta registrada antes da “negativação” do consumidor “evita que ele seja privado de benefícios como créditos condicionados ao “nome limpo”, tais como limites bancários e serviços afins, além da prática de cobranças coercitivas e abusivas por parte dos credores”. Para a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), a lei paulista “é um retrocesso em termos de ganho de produtividade e de eficiência no mercado de crédito e na economia”, afirma o diretor Jurídico da entidade, Antonio Carlos de Toledo Negrão, em nota. “Além de estabelecer um processo menos fluido, mais custoso, a nova lei compromete a boa gestão da concessão de crédito ao reduzir a previsibilidade do processo de cobrança”, defende a entidade.
Um dos problemas é que enviar uma carta com confirmação é significativamente mais caro do que a correspondência normal. Segundo tabela disponível no site dos Correios, uma carta comercial simples sai por R$ 1,30. Já a correspondência registrada com a confirmação de recebimento custa R$ 7,70. Vale lembrar que a carta vai para o endereço que o devedor informou na hora de tomar o financiamento. Segundo o Valor apurou, os três principais birôs de crédito do país mandam, em média, oito milhões de cartas por mês para devedores, o que dá uma ideia da magnitude do aumento de custos que a medida representou para essas empresas. Esse aumento foi repassado aos bancos. Os maiores birôs de crédito do país são Serasa Experian, SCPC que é administrado pela Boa Vista Serviços e SPC Brasil administrado pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL). Nacionalmente, seriam cerca de 12 milhões de cartas enviadas todo mês, segundo estimativa de fontes do sistema financeiro.Além de ser mais dispendiosa, a inclusão do inadimplente nos birôs passou a ser mais morosa. A lei paulista deu ao o devedor um prazo de 15 dias, depois de receber a carta, para tentar quitar a dívida antes que o seu nome figure nos cadastros de restrições financeiras.
Antes, a inclusão era feita em dez dias a partir da postagem da carta Há também uma dúvida entre os bancos, que o texto das leis não esclarece: se há necessidade de a assinatura na correspondência de débito ser do próprio devedor, ou se basta que alguém esteja no endereço para recebê-la. Sem essa questão resolvida, há quem prefira não correr o risco e não registrar o devedor. Ou seja, o cadastro negativo fica desatualizado, o que impacta os modelos de concessão de empréstimos dos bancos. A lei nº 15.659, que começou toda essa comoção, foi publicada no Diário Oficial paulista em 9 de janeiro.
Para que pudesse ser publicada, foi necessário que a assembleia legislativa do Estado derrubasse um veto que o governador fez ao projeto de lei. O entendimento do governador era que a matéria era inconstitucional. A lei de Mato Grosso, de nº 10.260, veio logo em seguida, e foi escrita pelo deputado Sebastião Rezende (PR-MT). Procurado, Rezende não retornou o pedido de entrevista. Na Paraíba, foi a lei nº 10.427 que passou a impedir que sejam “negativados” devedores que estejam discutindo a dívida na Justiça. O deputado Gervásio Maia (PMDB-PB), autor da lei, afirma que ela tem por objetivo “criar mais um mecanismo de proteção ao consumidor”, em especial em casos de cobrança indevida. Para ele, evita que o consumidor seja “penalizado previamente” sem que a discussão sobre a dívida esteja resolvida.
Valor Econômico – SP