“Queremos garantir a entrega mais barata e mais rápida para cada vez mais pessoas”, diz Arthur Debert, um dos fundadores do unicórnio
Por Matheus Goto
Uma lebre saltitante é o símbolo da revolução nas entregas no Brasil. Enviar ou receber pacotes é hoje muito mais simples do que há dez anos – basta solicitar um entregador por aplicativo. Isso é possível em parte graças à Loggi, criada em 2013. Na época, seus fundadores, Fabien Mendez (hoje CEO) e Arthur Debert (CBO – Chief Beyond Officer, o principal responsável por zelar pelo futuro da companhia no longo prazo), notaram que a demora nas entregas era um entrave à produtividade. E viram uma oportunidade.
A startup de tecnologia criou uma rede que atende a entregas locais imediatas, para pessoas físicas, e a operações de e-commerce, no país inteiro. Os entregadores participam em regime autônomo. A Loggi chamou a atenção logo em seus primeiros meses de vida e recebeu um aporte de R$ 2,6 milhões de investidores-anjo.
Em 2019, tornou-se unicórnio após investimento de US$ 150 milhões liderado pelo SoftBank. Na pandemia, com a queda dos serviços para escritórios, apostou no e-commerce e trabalhou para varejistas como Amazon e Mercado Livre.
Mendez e Debert se encontraram às cegas para fundar a empresa – e perceberam que a parceria tinha futuro após uma boa conversa, acompanhada de cachaça. Debert conta mais detalhes na entrevista a seguir.
ÉPOCA NEGÓCIOS Quando você começou a se interessar por programação e logística?
ARTHUR DEBERT Comecei a programar no começo dos anos 2000 [N.R.: Debert tem hoje 43 anos] e nunca tive interesse específico por logística até surgir a ideia da Loggi. Percebi que tinha uma oportunidade de pensar a logística por meio da tecnologia, de um jeito bem diferente. Foi um casamento muito feliz.
NEGÓCIOS Como era o segmento de entregas quando a Loggi foi fundada?
DEBERT A logística avançou muito no Brasil nos últimos oito anos. Sentimos que a Loggi é parte disso, mas vemos que o ecossistema como um todo evoluiu. O consumidor tinha serviço ruim, lento e caro. Quando a Loggi começou, a duração de cinco dias para uma entrega de São Paulo para São Paulo era normal. Hoje, todo mundo espera no dia seguinte.
NEGÓCIOS A Loggi foi seu primeiro negócio?
DEBERT Sim e não. Antes tive negócios pequenos – um laboratório de fotografia, depois uma agência de design. A Loggi foi o primeiro que escalou de verdade.
NEGÓCIOS Antes da Loggi, você se formou em cinema pela Fundação Armando Álvares Penteado (Faap). Sempre se interessou por cinema?
DEBERT Quando pequeno, queria ser jornalista, sempre gostei de ler e escrever. Empreender, eu nem sabia o que significava. Fui ter essa vontade bem mais velho. Não era uma possibilidade na minha infância. Decidi [cursar cinema] quando estudava Economia. Amava cinema, e a parte de contar histórias era o que me interessava mais. Mas descobri a internet no meio do caminho e fiquei fascinado. Ainda acho a internet fascinante. Para mim, estava claro que era onde a maioria das coisas interessantes aconteceria no futuro.
NEGÓCIOS Como você conheceu o Fabien Mendez e qual foi o papel dele nessa trajetória?
DEBERT O Fabien foi apresentado a mim por um amigo comum, em uma troca de e-mails. Ele me falou que tinha um cara muito inteligente procurando uma pessoa como eu e que, apesar de o cara ser de negócios, nós deveríamos conversar. Ele colocou “negócios” como algo pejorativo, o que era bem engraçado. Ele estava certo, o Fabien é muito inteligente. Tínhamos a chance de fazer algo único e interessante. Cinco dias depois de nos conhecermos, decidimos abrir a Loggi. Foi arriscado, mas deu certo.
NEGÓCIOS Que experiências e conhecimentos possibilitaram tudo isso?
DEBERT De certa maneira, qualquer conhecimento serve para nós. A gente é fruto do que a gente viveu. Mas não acho que nem o cinema nem a GoJames [N.R.: empresa de transporte fundada por Fabien que encerrou as operações em um ano] nos ajudam no dia a dia. Os desafios não param de crescer. O que faz a coisa funcionar é a dinâmica, a vontade de aprender, a abertura e a comunicação com as pessoas. Isso é maior do que qualquer conhecimento anterior.
NEGÓCIOS Sua mentalidade mudou, da época em que fazia cinema para hoje? Você se encontrou nos negócios?
DEBERT Não me penso como uma pessoa de negócios. Ainda me penso como uma pessoa de tecnologia. Gosto muito desse mix, de negócios e tecnologia. Para mim, é o lugar ideal, do qual eu consigo falar razoavelmente bem, pelas duas perspectivas. Estudei Economia, então [empreender] sempre foi algo na minha cabeça, mas só agora faz sentido. Hoje, no mundo da tecnologia, os negócios têm uma cara muito diferente de 30 anos atrás. Menos formal, menos processual, mais diverso, mais rápido. Esse lugar faz sentido para mim. Não sei se me encaixaria bem na ideia que as pessoas tradicionalmente tinham de negócios dez anos atrás.
NEGÓCIOS Como a pandemia afetou a Loggi?
DEBERT Mudou tudo. O primeiro esforço foi garantir o bem-estar de todo mundo que trabalha com a gente. Seguimos os protocolos e estamos superconfortáveis com os resultados. Uma vez que estávamos seguros com o bem-estar de todos, ficou óbvio que a entrega, no momento de isolamento, seria essencial, e que a nossa parte na sociedade era fazer isso acontecer. Entramos na pandemia com as pessoas achando que receber pacotes em casa era um luxo, e agora está claro que é uma infraestrutura básica. Entendemos que nosso papel era continuar fazendo entregas e oferecê-las a mais pessoas, e estruturamos a companhia para isso. Tivemos uma expansão violenta. Colocamos mais de 100 milhões de brasileiros na rede durante a pandemia, e os volumes cresceram mais de 300%. Foi um desafio enorme, mas acho que a Loggi conseguiu fazer bem o papel de apoiar a sociedade e os clientes.
NEGÓCIOS O que vocês veem de tendência para o futuro?
DEBERT Há dois temas. Um, sempre muito importante, é o acesso. A entrega mais barata e mais rápida. Queremos cada vez mais brasileiros com acesso à variedade nos preços do e-commerce e precisamos ainda evoluir no preço e no tempo para chegar a todo mundo. Também falamos sempre da escolha do consumidor. É importante que quem compra tenha a entrega perfeita para suas necessidades, a flexibilidade para escolher o horário, o lugar, se quer retirar ou receber em casa. A ideia é acabar com a aflição da entrega para que se torne uma experiência quase invisível, que atende ao que você quer. A gente evoluiu muito aqui, mas tem um tanto para caminhar nos próximos anos.
Fonte: Época Negócios