O presidente da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, Floriano Peixoto, desdobrou-se para enfrentar um obstáculo adicional ao desafio de reerguer as finanças da estatal: o súbito aumento da demanda do serviço de entregas em meio à pandemia, provocado pela expansão do comércio eletrônico. Há um ano no cargo, Peixoto traçou como prioridade resolver a baixa liquidez de caixa, reestruturar a empresa e desenvolver ações estruturantes de médio e longo prazo. Ele cita o pacote de novos negócios da empresa e adianta que o projeto de oferta de “lockers” – espécie de “armários inteligentes” para recebimento de encomendas – será testado em breve em Brasília e no Rio de Janeiro.
General da reserva, Peixoto era ministro da Secretaria-Geral da Presidência, quando o presidente Jair Bolsonaro o convidou para assumir a presidência dos Correios em junho do ano passado. Agora a estatal deixa o guarda-chuva da Ciência e Tecnologia para integrar a estrutura do novo Ministérios das Comunicações, que passou ao controle do PSD no âmbito das articulações para consolidar o Centrão na base aliada ao governo.
Ao Valor, Peixoto diz que na prática essa mudança não altera os planos que traçou para sua gestão, porque está mantida a missão específica que o presidente Jair Bolsonaro lhe confiou: “recuperar a sustentabilidade financeira da empresa”. O balanço publicado na última quarta-feira no Diário Oficial mostra que o saldo do final do caixa da empresa em 2019 foi de R$ 537 milhões. Quando Peixoto assumiu o cargo, o número projetado era negativo, de R$ 9 milhões.
Peixoto reorganizou a estrutura da diretoria, reduzindo os níveis funcionais, e buscou otimizar o processo decisório, “dando mais atenção às 28 superintendências estaduais” – são duas superintendências em São Paulo: uma na capital e outra no interior.
Ele cita como uma das marcas de seu primeiro ano à frente da empresa a dissolução da CorreiosPAR, subsidiária deficitária criada em 2014 para constituir e gerir parcerias societárias estratégicas. A medida concretizada no início do ano gerou um retorno de receita estimado em R$ 25 milhões à estatal. “Foi a primeira empresa a ser completamente encerrada na gestão Bolsonaro, significa um CNPJ a menor dependurado na administração pública”.
Os Correios estão na mira do programa de desestatização do Ministério da Economia. Segundo Peixoto, os estudos mais complexos, patrocinados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), começam no mês que vem com previsão de se estenderem até 2021. “A conclusão será o que a consultoria contratada indicar como melhor opção, mas a nossa missão é assegurar a sustentabilidade da empresa, o que auxiliará na definição do seu futuro”, disse o presidente.
Ele reconhece que o isolamento social levou as pessoas a se valerem mais do comércio eletrônico, tendência que pressionou o serviço de entregas da empresa em 25% a mais. No mesmo período do ano passado, relativo aos meses da pandemia (de março até agora), foram movimentados ao menos 25 milhões de encomendas.
A empresa teve de contratar mão-de-obra temporária, colocou linhas de transporte adicionais, revisou prazos de entrega de alguns serviços, autorizou a realização de horas extras e jornadas nos fins de semana para tentar evitar a queda na qualidade do atendimento. Peixoto admite que houve reclamações de atraso na entrega de produtos, mas pondera que a empresa está se empenhando em manter a qualidade no atendimento. “Estamos tendo gastos com recomposição de pessoal, mas o momento exige e a empresa está comprometida com tudo isso.”
Em relação a 2019, 40% da receita sobre a venda de serviços (R$ 7,6 bilhões) veio do segmento de mensagens, como cartas e faturas de bancos, enquanto 60% (R$ 11,5 bilhões) foram originários dos serviços concorrenciais, como entrega de encomendas, marketing e logística.
A partir deste ano, a saúde fiscal dos Correios começa a colher os resultados do imbricado processo de saneamento do plano de saúde dos servidores, que levou Peixoto a enfrentar uma greve em seus primeiros meses de gestão. O imbróglio foi julgado pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST), que fixou 3% de reajuste salarial aos servidores, mas determinou a exclusão dos pais e mães como dependentes do plano.
Originalmente, a regra era de coparticipação do servidor de apenas 3% e a empresa arcava com 97%, sendo que pais e mães eram admitidos como dependentes. Após os últimos anos de acalorado debate, paralisações e judicialização, essa coparticipação subiu para 50% e os ascendentes foram excluídos do plano.
A despesa dos Correios com o plano de saúde no ano passado foi de R$ 1,7 bilhão, dos quais, R$ 500 milhões referem-se a gastos com tratamento de pais e mães. A partir deste ano, essa despesa não será mais contabilizada, mas houve decisão judicial para que tratamentos em andamento, especialmente nos casos crônicos, não sejam descontinuados.
A gestão de Peixoto ainda vem arcando com despesas das administrações anteriores. Por exemplo, no ano passado a empresa dispendeu R$ 343 milhões com o distrato com o Banco do Brasil relativo ao Banco Postal. Em paralelo, existem as parcelas relativas ao Plano de Demissão Incentivada (PDI), que exigirá um gasto anual de R$ 209 milhões até 2026.
Mirando o médio e longo prazo, Peixoto tem uma ampla carteira de projetos em andamento, como a elaboração de um novo plano de cargos e salários, que prevê a “ascensão meritória” dos servidores na empresa. Em paralelo, prepara o lançamento de serviços como a “entrega no mesmo dia” e a oferta de “lockers”, serviço comum no exterior. O piloto será testado em Brasília, no Conjunto Nacional, e no Rio, na Central do Brasil. Cada armário terá um CEP, e os usuários poderão receber encomendas e retirá-las com um código de barra.
Peixoto também tem projetos de expandir o transporte de mercadorias utilizando a malha naval e o modal ferroviário. Ele ressalta que os Correios vêm tendo a excelência dos serviços reconhecida mundialmente ao conquistar por dois anos consecutivos prêmios no The World Post & Parcel Awards, considerado o “Oscar dos Correios”. A empresa recebeu em relação a 2019 um Bônus Prime que entrará como receita neste ano e nos exercícios seguintes no valor de R$ 339 milhões.
Peixoto ainda não se reuniu formalmente com o ministro Fábio Faria, mas compareceu à posse do novo ministro na última quarta-feira, e aguarda a primeira reunião para apresentar a fotografia da empresa e afinar o discurso comum sobre a estatal. Ele diz que Faria “chega para somar porque é uma pessoa afável, boa de se relacionar e traz sua enorme capacidade de articulação para o governo”.
Fonte: Valor Econômico