Os sneakers não são mais uma febre restrita aos skatistas. Esse modelo de tênis com design casual, inspirado no streetwear, está superando suas fronteiras e atingindo o grande público consumidor. O resultado é a multiplicação de comércios e fábricas dedicadas tanto ao produto quanto a seus derivados, como camisetas, calças e acessórios.
Enquanto as grandes multinacionais dominam os tênis esportivos tradicionais, a explosão dos sneakers ganha força por aqui na esteira de marcas de pequeno porte e em lojas dedicadas ao segmento. É o caso do Kings Sneakers, rede que faturou R$ 40 milhões em 2017 e projeta ultrapassar R$ 50 milhões este ano.
O namoro entre o fundador Igor Moraes, 37, e a Galeria do Rock, 55, já se aproxima de duas décadas. Foi nesse centro de compras e de cultura alternativa, no centro de São Paulo (SP), que o empreendedor paulistano assumiu a loja de vinis e CDs do pai, em 2002. Em 2007, com o avanço da música em arquivos digitais, Morais precisou inovar. “Comecei a visitar outlets para comprar tênis e revender na loja. Sempre fui apaixonado por sneakers”, diz. O que começou como uma tentativa de manter a loja de pé chamou a atenção de grandes marcas, como a Nike, e o negócio começou a decolar.
“Não existiam canais de venda de sneakers no Brasil e os grandes fabricantes começaram a me procurar”, afirma. A pequena loja, ainda em funcionamento, foi o piloto do que viria a ser, uma década depois uma rede varejista com 50 pontos de venda, sendo cinco próprios e 45 franquias – o ingresso no franchising ocorreu em 2013. A Kings Sneakers vende tênis de 15 marcas, nacionais e estrangeiras, em quatro Estados. Desde 2013, também aposta na venda de vários tipos de produtos com marca própria. “Demos uma pausa na produção de calçados próprios para focar na venda de peças de street fashion e acessórios”, diz Moraes.
No caso da Hocks foi a paixão pelo skate que levou o empreendedor Ronaldo Figueiredo, 45, ao lado de três amigos de adolescência, a fundar a empresa, em 2002. Com sede em Porto Alegre (RS), a marca apostou inicialmente em vestuário e acessórios streetwear e, desde 2012, ingressou no mercado de sneakers. “A ideia era oferecer uma linha completa de produtos, e os tênis são parte importante da cultura do skate”, diz. Com modelos unissex, a marca lança novas cores a cada quatro meses e novos modelos duas vezes ao ano, tanto na linha lifestyle quanto na linha pro-model, assinada por skatistas profissionais – a Hocks patrocina 10 atletas, entre profissionais e amadores.
A produção, em modelo de licenciamento, ocorre em Estância Velha (RS) e tem capacidade de 20 mil pares/mês. As vendas são feitas por e-commerce próprio e em 600 pontos de venda. “Os sneakers já representam 60% do faturamento”, afirma Ronaldo.
A Bang Footwear também é resultado de paixão. Felipe Eloy, 27, tem uma coleção pessoal que supera 70 pares de sneakers. “Ela já foi maior, mas vendi alguns modelos para financiar meu negócio”, diz. O empreendedor investiu R$ 35 mil em 2015 para fundar a empresa. Com uma produção quase artesanal de sneakers, a marca não decolou de imediato. “Foi um estágio importante. Aprendi sobre processos de produção de calçados, modelagem e solados”, diz ele.
Em 2017, Eloy reposicionou o negócio: mudou o nome da marca para PACE e focou no segmento de luxo. Com produção terceirizada em uma fábrica em Franca (SP) e produção mensal de 350 pares, a empresa tem 11 modelos à venda, com materiais como couro, neoprene e cordura (nylon). As vendas ocorrem no e-commerce e em duas lojas em São Paulo. A escolha dos parceiros é estratégica. “Não quero focar em grandes lojas multimarcas. É um produto de nicho”, diz. Em janeiro de 2019, a PACE inicia o projeto de internacionalização com a participação em um showroom no Canadá. A expectativa é faturar R$ 100 mil ao final de 2018.
Ex-skatista profissional, Rafael Narciso, 38, fundou em 2008 a ÖUS, com o irmão Bruno, 33. “A ideia era quebrar o paradigma de que os tênis nacionais eram ruins”, diz. Com 70 modelos em produção, a marca curitibana aposta em materiais sustentáveis (como garrafas pet) e lança, em média, um modelo por semana. A fábrica, em Brejo Santo (CE), produz 10 mil pares, vendidos em 500 lojas multimarcas – além de um e-commerce na Noruega, no ar desde agosto. “Registramos 10 patentes industriais, entre tecnologia de palmilhas e embalagens”, diz. Em 2013, a ÖUS ingressou no ramo de vestuário. A expectativa é faturar R$ 13 milhões em 2018. Os sneakers representam 93% da receita bruta.
A inauguração da sexta loja da Kings Sneakers na Galeria do Rock, em setembro, fortaleceu um movimento que vem transformando o espaço de compras, inaugurado em 1963, em um templo do varejo de calçados. Atualmente, 12% das lojas são focadas em sneakers, como Asics Tiger, Y our Id Store e Street Combatt. Assim como as diversas tribos que frequentam o centro de compras, a galeria mantém o perfil heterogêneo entre seus 200 empreendedores. Cerca de 30% das lojas são ligadas à prestação de serviços (alfaiataria, serigrafia, tatuagens), 15% ao vestuário roqueiro e 10% à moda em geral. O rock, que deu o apelido à galeria no fim da década de 70, responde pelos demais, com lojas de discos como London Calling (reaberta este ano).
Fonte: Valor Econômico